Banco Mundial reforça alerta sobre desequilíbrio previdenciário brasileiro

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Estudo do Banco Mundial destacado recentemente no jornal Valor Econômico reforça o alerta de pesquisadores brasileiros ouvidos pela Conjuntura Econômica na edição de julho (leia aqui), sobre o avanço do desequilíbrio previdenciário brasileiro e a necessidade de uma nova rodadas de reforma adiante.

Os autores do estudo O Sistema Previdenciário Brasileiro sob a Ótica da Equidade destacam especialmente o ritmo de envelhecimento da população, indicando que se nos países de alta renda a razão de dependência (proporção da população de 65 anos de idade ou mais em relação à de 20-64 anos) levou 62 anos para dobrar, no Brasil isso acontecerá em bem menos tempo: 23 anos. Fabio Giambiagi, pesquisador associado do FGV IBRE, soma a essa variável e a volta da regra de reajuste do salário mínimo que prevê ganhos reais, combinando a inflação do ano anterior com o crescimento da economia de dois anos antes, impactando a curva de crescimento dos benefícios previdenciários e assistenciais atrelados a ele.

Outro elemento convergente no diagnóstico do Banco Mundial é o de que o aumento da idade mínima sozinho não é suficiente para frear esse desequilíbrio. No estudo, esse diagnóstico é apresentado com um cálculo ilustrativo: para manter a razão de dependência dos idosos no mesmo nível de 2020, seria necessário aumentar a idade mínima de aposentadoria para 72 anos em 2040 e 78 em 2060.

Tal como o nome indica, o documento destaca que algumas mudanças avaliadas como necessárias no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) não respondem apenas a uma questão fiscal, mas também de aportar maior progressividade ao sistema, como seria o caso da aposentadoria rural, com baixa parcela contributiva, e a diferença de idade para aposentadoria por gênero. Os pesquisadores afirmam que “é sempre tentador para os formuladores de políticas de previdência oferecerem benefícios como critérios de elegibilidade menos rigorosos para aqueles que sofrem injustiças devido a desigualdades históricas e estruturais”, como é o caso das mulheres no mercado de trabalho. Em texto de discussão que trata da equidade de gênero para a idade mínima publicado este ano, de coautoria de Otavio Sidone, Fabio Giambiagi e Guilherme Tinoco, os especialistas questionam se a opção por antecipar a aposentadoria de mulheres é a política mais adequada para compensá-las da dupla ou tripla jornada que levam em sua idade ativa, por serem mães e culturalmente responsáveis pelos cuidados da família, o que pode comprometer suas chances de progresso no mercado formal. O texto defende elevar gradualmente a idade mínima para os que já estão no mercado de trabalho até reduzir esse diferencial para um ano – com aumento da idade mínima de homens para 67 anos, e transferir essa compensação para outra política. “Identificamos que a licença-maternidade seria o instrumento previdenciário mais próximo de cumprir a função de compensar a mulher pela perda de laboral durante a fase de gestação e amamentação, gerando risco social de perder seu emprego no fim desse período”, diz Sidone. Dessa forma, os pesquisadores elaboraram uma proposta que inclui uma extensão do salário-maternidade, dado o reconhecimento de suas implicações sobre o trabalho feminino, de quatro para oito meses, além da transformação da licença e salário-maternidade em parentais, ou seja, com a titularidade podendo ser passada para o pai em determinado período. Essa proposta, afirma, também pode auxiliar – e não reforçar – a convenção de gênero que atribui as tarefas de cuidado às mulheres. Nos primeiros 10 anos, o custo dessa extensão seria superior à economia com a equiparação de idades, apontam, mas essa relação tende a se inverter com o tempo. Em 30 anos, de acordo aos cálculos de Sidone, Giambiagi e Tinoco, o investimento com a expansão do salário-maternidade passa a representar um terço da economia com a unificação das idades.

Entre outros desequilíbrios apontados pelo Banco Mundial que devem ser considerados em uma reforma, e que inclui o braço assistencial, estão:

- Apenas 56,4% da população economicamente ativa no Brasil contribui para o RGPS

- RGPS e BPC têm 32 milhões de aposentados e pensionistas, enquanto o Brasil tem apenas 20,7 milhões de idosos acima de 65 anos

- 11% dos beneficiários recebem mais de um benefício do governo

- Os cônjuges com mais de 55 anos recebem 72% de todas as pensões por morte, sendo 92% do sexo feminino

- O nível da aposentadoria mínima coloca os seus beneficiários entre os decis de 5º e 6º da distribuição de renda no país.

- Apenas 9% dos aposentados urbanos com aposentadoria mínima contribuíram por mais de 25 anos

- Entre os aposentados urbanos com aposentadoria mínima, os aposentados com menor contribuição vitalícia atingem 12% de taxa interna real de retorno das contribuições, enquanto os que contribuíram por mais de 25 anos recebem 0%.

- 15,7% dos benefícios do INSS são concedidos judicialmente 

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