Previdência: nova reforma deveria mexer em idade mínima, tempo de contribuição e reduzir exceções, afirma Luís Eduardo Afonso

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A antecipação da necessidade de um novo ajuste no sistema previdenciário brasileiro – tema da Conjuntura Econômica de julho, que será divulgada esta semana – tem ganhado espaço na mídia e na agenda dos especialistas, que voltam a desenhar propostas para reduzir os desequilíbrios entre benefícios e arrecadação. Luis Eduardo Afonso, professor da USP, é um deles. Junto a Fabio Giambiagi (FGV IBRE) e o atuário Rodrigo Souza Silva,  é autor de novo Texto de Discussão do FGV IBRE, (leia aqui) que apresenta uma proposta de mudança para a idade da aposentadoria no regime geral (RGPS).

Em conversa para a Conjuntura Econômica, Afonso destaca que além do envelhecimento mais acelerado da população brasileira e a volta da regra de reajuste do salário mínimo que permite ganhos reais, outro elemento que impactou as projeções sobre a previdência foi a pandemia. “Na verdade, mudou muita coisa na economia logo no início da vigência da reforma, que tornou o quadro mais nebuloso”, diz.  Ele lembra que, com a pandemia, inicialmente houve uma retração drástica na atividade econômica, depois uma recuperação em que entra uma maior participação do home office e trabalho por aplicativo. “A isso se soma os efeitos da reforma trabalhista, que também era recente quando se aprovou a previdenciária, e que aparentemente permitiu um aumento na proteção social. Ao mesmo tempo, entretanto, há um aumento recente no volume de benefícios concedidos anualmente que ainda temos que interpretar”, afirma, reforçando um cenário em que muitos elementos estão misturados, incluindo uma quebra estrutural com a pandemia.

Entre os temas que “escaparam” da reforma de 2019, Afonso destaca o corte, logo no início da tramitação, do dispositivo que permitia o aumento automático da idade mínima de aposentadoria, sempre a expectativa de sobrevida aos 65 anos tivesse um aumento de um ano. “Com isso, deixamos de ter um mecanismo de compatibilização da regra com a estrutura demográfica. E, por ser um mecanismo automático, não precisaria ser renegociado no Congresso, tomando o espaço Legislativo, motivando discussões muitas vezes acaloradas e pouco técnicas, obrigando a um esforço de negociação que significa concessões de lado a lado”, afirma. Outros pontos que Afonso destaca como oportunidades perdidas em 2019 foram a discussão do sistema de proteção social dos militares, “incluindo o conceito de inatividade”; a inclusão dos regimes próprios de estados e municípios para unificação de regras; e a reforma da previdência rural – tema abordado no Blog (leia aqui)  

No caso do RGPS, Afonso considera que as prioridades em uma próxima reforma são aumentar progressivamente a idade mínima, aproximar mais idade de homem e mulher, e principalmente aumentar progressivamente tempo mínimo de contribuição, que também ficou baixo na reforma ficou muito pouco.”Tem que dar incentivo para as pessoas contribuem mais tempo. Tempo mínimo é 20 anos e aí a forma de cálculo é 60% da Média mais 2% por ano adicional além do mínimo. Mas mesmo pré-reforma aqui se aposentava por tempo de contribuição é 35 anos pra homem e 30 pra mulher”, diz, destacando que a reforma em que o tempo mínimo é menor.

A proposta apresentada por Afonso, Giambiagi e Silva resume-se em:

I) aumento da idade de aposentadoria programada dos homens, dos atuais 65 para 67 anos, em um período de 10 anos

II) aumento do período mínimo para a aposentadoria programada, de 15 para 25 anos, ao longo de uma transição de 20 anos, com incremento de 0,5 ano por ano, a partir do momento da aprovação da reforma.

III) elevação da idade de aposentadoria das mulheres, concomitantemente a uma possível redução do diferencial de gênero – proposta não detalhada no artigo;

IV) tratamento diferenciado àqueles que contribuíram desde cedo, sem interrupções. Para eles, valeria o sistema de pontos que soma idade e tempo de contribuição, sendo 105 pontos para os homens e de 104 para as mulheres. Dessa forma, aqueles que começassem a contribuir para a Previdência aos 18 anos poderiam se aposentar aos 61,5 anos de idade no caso dos homens, e as mulheres aos 61 anos.

No texto, os autores apresentam, com base em um modelo atuarial, os impactos redistributivos da proposta (excluindo a redução do diferencial de gênero), bem como sua  progressividade. Quanto a esta última, os autores observam que  dado que indivíduos de renda mais elevada terão um nível de reposição inferior àqueles de renda mais baixa, a progressividade é comprovada.

Na conversa para a Conjuntura, Afonso também ressaltou a necessidade de se reduzir as exceções presentes no sistema – entre as quais o regime para microempreendedores individuais (MEI), e também os militares. “O problema de toda exceção é que ela puxa a próxima. Abre-se uma exceção transitória para um grupo, e o grande risco é que ela se torne permanente para vários grupos que não deveriam ser alvo dessa política”, diz. Para Afonso, essa é uma forma de sensibilizar a sociedade para a urgência da reforma. Se há a percepção de perda de redução do bem-estar, mas todos estão sujeitos à mesma regra, amplia-se a compreensão sobre a necessidade de equilíbrio, afirma.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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