Governo estuda compartilhar risco de crédito a pequenas empresas dentro da cadeia produtiva a qual pertencem, afirma Ministério da Economia

Marco Aurélio Loureiro, coordenador-geral de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Ministério da Economia

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

O governo lançou uma nova rodada de linhas de crédito emergenciais , chamada Crédito Brasil Empreendedor, que foca em destravar o acesso de pequenas empresas e busca movimentar R$ 87 bilhões. Como foi a reestruturação dessas linhas?

Quando houve a pandemia, em 2020, vivemos um momento atípico em que os bancos tinham liquidez para emprestar recursos, mas os modelos de análise de crédito não estavam preparados para dar uma resposta, posto que o faturamento de muitas empresas foi simplesmente interrompido. E isso se somou a um problema histórico de acesso a crédito vivido pelas pequenas e médias empresas, motivado pela assimetria informacional, o que leva a um aumento da taxa cobrada a esses negócios, que chega a ser três a quatro vezes maior que a taxa de risco paga por grandes empresas.

Nesse momento, o Ministerio da Economia percebeu que a solução não era ofertar funding barato, pois os bancos tinham recursos, e a Selic e o custo de captação dos bancos também estavam baixos. Por outro lado, havia o problema do risco de crédito, que se ataca com garantias. E foi aí que o governo entrou, com uma solução inovadora no país, em ofertar garantias. E foi tão efetivo que o crédito para pequenas empresas cresceu esse ano (28,8%, de acordo ao Banco Central), especialmente com as linhas do Peac e Pronampe

A situação de 2020 se arrefeceu. Veio a vacina, as empresas passaram a recuperar seu nível de faturamento, e é razoável pensar que a pandemia não volte com força. Com isso, os bancos já conseguem ter mais perspectivas de como os negócios das empresas vão se comportar, e podem assumir mais riscos. Então, a cobertura de risco de crédito, que no Pronampe chegava a 85%, caiu para 20%. Com isso, o potencial de alavancagem de crédito, que antes era de 1,17, passa agora a 5 vezes, podendo então gerar muito mais crédito que em 2020.

Outra questão importante é que a taxa do Pronampe praticada em 2020 era Selic + 1,25%. Com uma Selic à época de 2% (entre março e julho de 2020, caiu de 3,8% para 2,3%, ficando em 2% de agosto até o fim do ano), era um custo muito baixo se comparado à média do operado à época, de 35% para pequenos negócios. Os bancos aceitaram perder margem na época, pois dado o nível de indefinição sua prioridade também foi garantir a sobrevivência de seus clientes. Agora o Pronampe passa a operar com Selic mais 6% ao ano e o Peac com 1,75% ao mês. Quanto ao potencial de crédito a ser operado, dependerá da quantidade de recursos que hoje já estão aplicados em operações de crédito voltarão, o que é determinado pelo grau de inadimplência. Por ora, esse percentual segue a média de mercado. A expectativa é que consigamos atingir uma boa marca nos próximos dois anos, levando em conta o amento da capacidade de alavancagem nas atuais condições do Pronampe. 

Representantes setoriais defendem que, além de abrir mais crédito seria preciso ajudar os empresários a pagar as operações do Pronampe já realizadas – dado que o faturamento de parte deles ainda não voltou ao nível pré-pandemia e o custo desse crédito aumentou, por estar atrelado à Selic –, para evitar um aumento da inadimplência. Como avalia esse quadro?

O programa já permite renegociar extensão de prazo: são 48 meses, com adicional de até mais 12 meses, que pode inclusive ser colocado como extensão de carência. Quando se trata de crédito, é preciso tomar cuidado, pois ele tem que ser bem dosado. Pois tanto ele pode servir de remédio, ampliando a capacidade de crescimento de um negócio, coo pode virar veneno. Tanto o Pronampe quanto o Peac são linhas de capital de giro, em que dificilmente se vê prazos tão estendidos, de 48 a 60 meses. Mas nesse caso foi feito assim pois se estimava um retorno lento da atividade. Se uma empresa toma um crédito que represente 30% do seu faturamento, com carência e até cinco anos para pagar, e ainda apresenta dificuldades, é preciso analisar com cuidado, pois talvez a solução não esteja em baixar taxa ou estender prazos, mas em outro tipo de assessoria. Com isso, evitamos dar sobrevida a empresas que têm problemas para se sustentar.

Os recursos destinados ao fundo que alimenta o Pronampe (Peac) estão garantidos até 2025. Depois, serão devolvidos ao Tesouro, e definidos ano a ano. Não seria mais adequado dar uma definição mais permanente para esses fundos garantidores?

Existem programas que estão sendo avaliados no Ministério da Economia para dar essa permanência. Qual é o ponto negativo que temos hoje, nesses programas emergenciais? É que todo o risco de credito, especialmente no Pronampe, e de forma mais amortecida no Peac, recai sobre a União. E é isso que o Ministério busca rever. A ideia que está sendo trabalhada é a de compartilhar esse risco. Por exemplo: imagine uma grande rede de frigoríficos que têm em sua cadeia várias pequenas empresas, cujo alto custo de financiamento acaba sendo incorporado nessa cadeia de produção. Será que essa grande companhia não teria interesse em participar de um programa normatizado e regulado que reduzisse o risco e barateasse o crédito desses pequenos empresários? Esse é o questionamento que estamos nos fazendo agora. O desafio de baratear o crédito de pequenas empresas é global, e soluções como essa estão sendo discutidas mundo afora. E são alternativas que também colaboram para alimentar a demanda por qualificação dessas pequenas empresas, pois pode envolver como condição metas de aprimoramento desses negócios. Tudo isso está sendo concebido como segundo passo na estruturação de um sistema de garantias para o Brasil que seja mais compartilhado e envolva menos ônus para o Estado.

 


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