Propag: veto presidencial é tecnicamente correto, mas não adesão dos estados mais endividados seria um problema
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Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monte iro, do Rio de Janeiro
Na terça-feira (14/1), o presidente Lula sancionou o projeto que cria o Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). O programa prevê prazo de reestruturação das dívidas estaduais de 30 anos, e três condições de pagamento, de IPCA mais 0%, IPCA mais 1% e IPCA mais 2%, a depender de condições como percentual de antecipação das dívidas, contribuição para o Fundo de Equalização Federativa e ativos repassados pelo Estado ao governo federal.
Os vetos aplicados por Lula a dispositivos classificados como de impacto no resultado primário do Governo Central, entretanto, causaram insatisfação de parte dos governadores, que ameaçam não aderir ao Propag. Entre os artigos vetados estão os que prevêem a possibilidade de abater parte de passivos caso executem despesas com de obras originalmente sob responsabilidade do governo federal, a suspensão de gatilhos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em caso de violação aos limites de despesas de pessoal, e a permissão aos Estados inscritos no Regime de Recuperação Fiscal (RRF) de acumular benefícios com o Propag e de serem dispensados das metas pactuadas no RRF ao aderir ao novo plano.
Entre os vetos que alimentaram as críticas de governadores está o do artigo que permitiria aos Estados usar recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) – criado na reforma tributária com o objetivo de evitar a guerra fiscal entre estados para atrair investimentos e negócios, bem como e compensar os estados mais prejudicados com a mudança da tributação da origem para o destino –, para abater dívida com a União. “Do ponto de vista técnico, o veto é correto, pois a medida claramente não atende ao objetivo constitucional do FNDR”, avalia Manoel Pires, coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento Público (CPFO) do FGV IBRE. A emenda constitucional da reforma tributária prevê que a distribuição dos recursos do FNDR seguirá um escalonamento anual que se estende de 2029 a 2043. “O que os governadores buscavam era antecipar o dinheiro que entraria para abater a dívida agora. Essa solução faria com que os estados tivessem o benefício fiscal sem gastar um centavo de amortização de dívida. Do ponto de vista econômico, também não me parece razoável, posto que o benefício fiscal seria gigante.”
As principais críticas aos vetos vieram de estados aderentes ao RRF, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, e também de Minas Gerais. Ainda que essa reação, como diz Pires, reforce a celeuma em torno da disposição dos Estados em pagar a dívida, o coordenador do CPFO pondera que o abandono desses entes ao programa também seria problemático. “Se os estados mais endividados não aderirem, o Propag só beneficiará aqueles que estão adimplentes hoje”, diz. “Então, na prática, o programa viraria uma renegociação que envolve um grande benefício fiscal para um grande número de estados, mas que não resolve problema nenhum, pois não tem sentido reestruturar a dívida de quem tem condição financeira para pagar”, conclui.
Em entrevista ao Valor Econômico (link aqui, acesso limitado a assinantes do jornal), Pires apontou que o Propag cria subsídio anual em encargos de cerca de R$ 48 bilhões, a ser suportado pela União. A estimativa usa o critério de “competência” e considera o impacto caso todos os Estados estivessem pagando a dívida. Como isso não acontece, explicou ao Valor, o efeito de caixa na União seria em torno de R$ 20 bilhões.
Em Carta do IBRE publicada em 2024, Pires destacou, desde o início da discussão no Congresso do novo programa de renegociação dos estados, o impacto fiscal que este geraria. Junto a Bráulio Borges, pesquisador associado do FGV IBRE e do CPFO, também alertou, na Carta de dezembro para o aumento da descentralização de recursos para estados e municípios e do gasto real desses entes, sendo estes elementos que ampliam a percepção de risco fiscal no país.
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