Estudo aponta que redução do ICMS dos alimentos tende a não ser repassada integralmente ao consumidor

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A demanda do governo federal para que os governadores zerem o ICMS incidente sobre itens da cesta básica pode não ser tão eficiente para mitigar a alta do preço dos alimentos. Ainda que a expectativa dos consumidores seja de um repasse integral, estudo publicado há dois anos por Leonel Cesarino Pessoa (FGV Direito SP), Mauricio Canêdo (Uerj, articulista da Conjuntura Econômica) e coautores indica que, no Brasil, não só essa redução não chega completa ao preço cobrado do consumidor final, como tampouco costuma ser imediata (link para o estudo).

“Do ponto de vista teórico, os impostos de fato podem ser usados para suavizar variações de preços, para cima ou para baixo. A Cide dos combustíveis, por exemplo, embora não tenha sido criada com esse objetivo, durante algum tempo foi pensada para atuar como um colchão. Mas nosso estudo, focado no ICMS, indicou que, no Brasil, essa estratégia pode não funcionar”, diz Canêdo, recordando o estudo em conversa para o Blog.

Para chegar a essa conclusão, os autores construíram uma base de dados das alterações do ICMS para uma cesta básica de 79 produtos alimentícios no período de 1994 a 2021, estimando a taxa de repasse desse tributo os preços finais em quatro estados: Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Nesse período, identificaram um total de 98 aumentos e 122 reduções na alíquota do ICMS. Os resultados apontaram que, em média, cada ponto percentual de variação do ICMS representou um repasse de em média 13% para o preço ao consumidor. Além disso, tal repasse tendeu a acontecer em até quatro meses após a alteração da alíquota, sendo de fato mais significativo no terceiro e quarto mês. Do total das categorias analisadas, dez apresentaram variação de preços próxima de zero. Entre elas, os alimentos do grupo de cereais, carnes frescas, panificados e leite e derivados. Entre os que apresentaram alguma variação estão produtos na categoria das hortaliças e verduras, frutas, e frangos e ovos. Uma das características observadas no estudo, diz Canêdo, é a de que segmentos de produtos industrializados em que a concentração de mercado tende a ser maior são os que apresentam repasses menores.

“Ainda que não tenha sido nosso tema de estudo, há evidências em outros trabalhos que indicam uma assimetria nesses repasses, sendo maiores no caso de aumento de alíquota e menores quanto se trata de redução”, completa Canêdo. Para o economista, o tema precisa ser bem avaliado não apenas pelo risco de baixa eficiência. “No Brasil, ainda temos outro tema relevante que é a questão fiscal. Trata-se de uma perda de arrecadação para os estados que, a depender das alíquotas aplicadas, pode ser relevante. Em geral, é mais importante no total da arrecadação do que o imposto de importação de alimentos é para a receita no nível federal”, diz, reforçando o alerta de que tal medida poderá fazer mais barulho que ter efeito no bolso do consumidor.

Leonel Pessoa destaca que o referido estudo foi parte de um projeto maior de tributação sobre o consumo, buscando desmistificar a ideia de que tratamentos diferenciados dentro do sistema tributário sempre são efetivos para garantir progressividade, quando o que pode acontecer é uma absorção dessa margem pelo intermediário, na forma de lucro. “A reforma tributária, que unificou os impostos sobre o consumo no IBS e CBS, servirão para melhorar e dar transparência para esse quadro, eliminando resíduos tributários ao longo da cadeia”, afirma.  

 


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