Queda disseminada da confiança: reflexos da desaceleração econômica e da conjuntura de definições

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A calibragem observada no otimismo dos empresários em outubro, quando os quatro setores monitorados pelas Sondagens do IBRE registraram queda de confiança, veio reforçada nas pesquisas de novembro. A começar pelo setor da construção (leia mais), com uma queda de 5,3 pontos no Índice de Confiança, as demais divulgações que se seguiram nesta semana foram significativamente mais negativas, com exceção da indústria, cuja queda de 3,6 pontos foi em nível com a de outubro, de 3,8 pontos. A variação mais alta foi a do comércio, com uma queda de 10,8 pontos em relação a outubro, saindo de uma área próxima da neutralidade, com 98 pontos, para o terreno do pessimismo, com 87,2 pontos. 

Aloisio Campelo, superintendente de Estatísticas do FGV IBRE, afirma que a reação de ambos os setores parece estar relacionada à desaceleração atual, “com preocupações relacionadas ao nível da demanda, sob impacto da política monetária mais restritiva”. O momento de definições quanto aos rumos da política fiscal a serem definidos pelo novo governo também parecem contaminar as expectativas dos empresários no mês, afirma Rodolpho Tobler, economista do IBRE, ilustrando que tanto na Sondagem de Serviços quanto na de Comércio a questão política se destacou no grupo de “outros fatores” limitativos à atividade.

Uma das características comuns nas sondagens foi o alto grau de disseminação da queda de confiança entre os segmentos de cada setor. Na indústria, que registrou a terceira queda seguida na confiança, 14 dos 19 segmentos observados perderam pontos em confiança. E a tendência de negócios para os próximos seis meses registrou queda de 4,5 pontos. Stéfano Pacini, economista do FGV IBRE, ressalta que esse item da pesquisa se encontra abaixo do nível neutro de 100 pontos desde setembro de 2021. 

Padronização da opção "Outros" do quesito de fatores limitativos
Sondagem do Comércio


Fonte: FGV IBRE.

o setor de serviços, que em novembro registrou queda de 5,4 pontos no Índice de Confiança, acumulando queda de 8 pontos nos últimos dois meses, essa revisão para baixo atingiu até o setor de informação e comunicação, cujo nível de atividade em setembro se encontrava 61,3% acima de fevereiro de 2020, pé-pandemia, de acordo à Pesquisa Mensal de Serviços (PMS) do IBGE. Na maior parte dos segmentos, inclusive, a perda de pontos de confiança na soma entre outubro e novembro supera os ganhos acumulados de janeiro a setembro. Entre as quedas mais significativas estão as observadas no segmento de serviços prestados às famílias, que na mesma comparação entre setembro deste ano e fevereiro de 2020 registrava um nível de atividade 3,9% abaixo. “Atividades que demoraram mais para retomar hoje alimentam um receio maior quanto às perspectivas de recuperação adiante, com o cenário econômico mais adverso”, afirma Tobler.

O resultado mais preocupante, entretanto, continua sendo o do comércio. Com a queda de dois dígitos registrada em novembro, a confiança do setor passa para 87,2 pontos. Tobler ressalta que, apesar de ser um setor com resultados historicamente mais voláteis, o Comércio tem registrado resultados abaixo de 100 pontos desde setembro de 2021 – quando o cenário de inflação e juros em nível global ganhou mais espaço no rol de preocupações do mercado – sendo desde então o sétimo mês com resultado abaixo dos 90 pontos. “É um setor que já tem sentido muito nas vendas”, lembra Tobler. Até setembro, o volume de vendas do comércio varejista acumulava queda de 0,7% no acumulado de 12 meses, conforme aponta a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) do IBGE. “Os primeiros balanços de vendas da Black Friday mostram que essa realidade não se alterou, pese um arrefecimento da inflação e melhora no quadro de emprego e renda”, completa.

Variação da Confiança de Serviços, por principais segmentos, em pontos


Fonte: FGV IBRE.

 

Variação da Confiança do Comércio, por principais segmentos, em pontos


Fonte: FGV IBRE.

Sob um cenário de restrição orçamentária das famílias, inflação e juros altos, os segmentos de bens não duráveis – supermercados, alimentos e bebidas – e semi-duráveis são os que tem registrado melhor desempenho, o que justifica uma perda menor de confiança em relação ao comércio de bens duráveis, mais dependentes do custo do crédito para as famílias. Até setembro, de acordo à PMC, as atividades do varejo ampliado (que inclui veículos, moto, partes e peças e material de construção) se encontrava 1,5% abaixo de fevereiro de 2020. Das dez analisadas pelo IBGE, apenas quatro operava acima do nível pré-pandemia: artigos farmacêuticos (20,8%), combustíveis e lubrificantes (18,7%), hiper e supermercados (3,8%) e material de construção (2%).

Na Sondagem do Comércio de novembro, destacou-se a queda de 12,6 pontos da avaliação da situação atual, para 89,7 pontos. No caso das expectativas, o indicador retraiu 8,6 pontos, para 85,2 pontos. Tanto quanto nos outros setores, Tobler não descarta a possibilidade de haver alguma recuperação de confiança, à medida que a insegurança relacionada ao fator político se arrefeça. Entretanto, lembra que a situação atual do comércio ainda sofre com o efeito de outros fatores, como o alto endividamentos das famílias, que limita sua capacidade de consumo e até a obtenção de mais crédito. Dados do Banco Central apontam que o crédito pessoa física registrou crescimento em outubro, ainda que em ritmo cadente (leia mais), mas que o comprometimento das famílias com o pagamento do serviço de suas dívidas já se aproxima de 30%, que é alto. Mesmo com a manutenção da recuperação do mercado de trabalho – a PNADC aponta que no trimestre móvel de agosto a outubro a taxa de desocupação recuou 0,8 ponto percentual, para 8,3%, e o rendimento real habitual cresceu 2,9% –  ainda é um quadro que demanda cuidados. 

 


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