Pessoas físicas continuam liderando o aumento do crédito em outubro, “mas cenário se torna mais difícil adiante”, afirma Livio Ribeiro

Por Solange Monteiro, do Rio Janeiro

O volume de  crédito do Sistema Financeiro Nacional (SFN) cresceu em outubro, conforme divulgou ontem (28/12) o Banco Central. A alta foi menor do que em setembro - 1%, contra 2,2% no mês anterior -, reduzindo a expansão acumulada em 12 meses de 16,4% para 15,8% em outubro. Ainda que também em movimento de desaceleração, as pessoas físicas lideraram essa evolução positiva, atingindo R$ 1,7 trilhão em outubro, representando uma elevação de 1,8% no mês e de 20,9% em 12 meses.

Qualitativamente, esse aumento não é necessariamente um movimento bem-vindo, já que uma das modalidades que mais cresceu no período foram as operações de cartão de crédito, com alta de 2%, somando um saldo de R$ 474 bilhões. Em 12 meses, essa evolução foi de 35,9%. Instrumentos para pessoa física considerados mais virtuosos por sua destinação - como o crédito rural, o imobiliário e os tomados junto ao BNDES - acumulam alta em 12 meses de, respectivamente,  31,7%, 13,7% e 7,9%. “O levantamento aponta um incentivo claro ao crédito rural que, entre os recursos direcionados, foi o que mais subiu em outubro, com expansão de 3,9%”, indica Livio Ribeiro, pesquisador associado do FGV IBRE.

Concessões por modalidade – pessoas físicas
em R$ milhões


Fonte: BCB.

Nas contratações de crédito com as famílias, o custo médio do crédito alcançou 56,6% ao ano, com alta de 2,6% no mês.Em outubro, as taxas médias de juros para pessoa física subiram 1,9% para crédito não-consignado (para 83,5%) e 2,2% para o consignado (a 27,6%). No caso do consignado para trabalhadores do setor privado, essa média sobe a 45,6%, com uma alta de 8,1% no mês e 13,2% em 12 meses. Nesse segmento consignado, Ribeiro destaca a evolução do crédito a beneficiários Auxílio Brasil, que em outubro pode ter influenciado a significativa alta nos valores concedidos no agregado - que saíram de R$ 1,57 bilhão em setembro para R$ 6,7 bilhões em outubro.O que também pode ter influenciado a significativa alta dos juros médios no mês (8,1%).

Tal como Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do FGV IBRE, tem alertado em suas entrevistas, os números de inadimplência e comprometimento da renda das famílias têm alcançado níveis altos, que serão mais difíceis de serem dissolvidos em um contexto de pressão de juros, pese a melhora geral nas condições de emprego e renda. De acordo com o Banco Central, a média de comprometimento de renda das famílias - ou seja, percentual necessário para honrar o pagamento de prestações - alcançou 28,7% em outubro, registrando uma alta de 1 ponto percentual no mês e 3 pontos percentuais em 12 meses. Ja a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), mostra que em outubro cerca de 33,6% das famílias com renda abaixo de 10 salários-mínimos tinham dívida em atraso, reforçando o diagnóstico de orçamentos apertados.

Crédito direcionado – pessoa física


Fonte: BCB.

O Índice de Confiança do Consumidor do FGV IBRE de novembro também aponta para essa direção, com uma queda de 3,3 pontos em relação a setembro, indicando aumento do pessimismo das famílias com sua situação financeira, tanto em relação ao momento atual quanto às expectativas para os próximos meses.  

“Em 2023, as condições de contorno tendem a ser mais difíceis para a manutenção de um bom ritmo de concessão de créditos, com nível de juros mais elevado e talvez alguma dificuldade dos bancos privados de ampliar suas linhas”, diz Ribeiro. Para o economista, esse poderá ser um sinal de possível aumento da atuação dos bancos públicos. “É preciso lembrar que esse uso já tem acontecido, basta olhar para a questão do crédito consignado a beneficiários do Auxílio Brasil”, diz. “Mas algumas referências já têm sido dadas, como no campo do crédito direcionado, para o crédito imobiliário voltado à baixa renda, para financiamento de habitações populares”, afirma. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, a ex-secretária de Habitação do Ministério das Cidades Inês Magalhães, integrante da equipe de transição, declarou que a intenção do governo é de não apenas retomar as operações do programa Minha Casa Minha Vida (atual Casa Verde Amarela) para as faixas de mais baixa renda como facilitar o acesso de trabalhadores informais ao crédito habitacional.  

Endividamento das famílias
Endividamento1//Total e Endividamento1//Sem financiamento/imobiliário

 

Comprometimento de renda das famílias (%)
dados dessazonalizados


Fonte: BCB.

 


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