“Na América Latina, percepção de falta de clareza sobre a política econômica para a retomada afeta as expectativas”

Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Depois de cinco trimestres de alta consecutiva, o clima econômico na América Latina registrou forte piora no quarto trimestre, conforme aponta a Sondagem Econômica da América Latina do FGV IBRE divulgada esta manhã (23/11). Os resultados demonstram a quebra de uma trajetória de recuperação iniciada no segundo trimestre de 2020, e que no terceiro trimestre deste ano havia posicionado o indicador no terreno neutro, com 101,4 pontos. Com a queda de 20,8 pontos registrada nesta última pesquisa, o clima econômico da região volta ao nível registrado entre o fim de 2020 e o início deste ano.

Os principais responsáveis por essa piora de humor são Brasil, Argentina e Chile com uma queda, respectivamente, de 55,1, 25 e 24,3 pontos em relação ao trimestre anterior. O componente mais comprometido foi o das expectativas quanto à situação econômica nos próximos seis meses – e cujo comportamento, na série histórica, costuma ser o de maior resiliência se comparado ao indicador de situação atual, que também faz parte do cálculo do Indicador de Clima Econômico. O indicador de expectativas registrou queda de 45,5 pontos no agregado. No Brasil, país com maior peso na ponderação para o cálculo do índice, essa queda foi de 104,2 pontos, a pior do continente, seguida pelo Chile, com retração de 60,7 pontos.

Indicador de Clima Econômico – países selecionados


Fonte: FGV IBRE.

Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE, afirma que esse resultado se deve especialmente à  falta de confiança na política econômica, principal problema apontado pelos 151 especialistas, de 15 países, consultados para a pesquisa. “Pelas respostas, a percepção é de eles consideram que os governos não têm apontado diretrizes claras para a retomada das economias com o controle da pandemia. No Brasil, por exemplo, houve concordância na necessidade de aumento de gastos em 2020, mas a condução da política fiscal desde então, somada ao processo inflacionário, trazem insegurança sobre o futuro”, diz. Lia também lembra que momentos de sucessão presidencial - como o complicado processo peruano, o chileno que está em curso, e o brasileiro em 2022, além das recentes eleições legislativas argentinas que acabaram com a dominância peronista no Senado -, também tendem a ampliar a incerteza sobre a condução da economia nos países. Não à toa, no agregado da amostra, instabilidade política foi o segundo fator de risco mais importante registrado pela Sondagem.

Principais problemas citados por especialistas


Fonte: FGV IBRE.

A pesquisadora lembra que todos os países, à exceção de Uruguai e Equador, projetam um crescimento do PIB em 2022 bem inferior ao estimado para este ano, e também passam, em maior ou menor grau, por processos inflacionários. “Alguns elementos sensíveis para esse resultado são a evolução do preço das commodities - cujos preços, na avaliação dos participantes da Sondagem, tendem a permanecer em níveis altos, mas não em aceleração, como verificado este ano - e o comportamento da economia chinesa”, afirma. Outros elementos presentes nas respostas desta última edição têm a ver com a competitividade desses países, refletida em menções como a preocupação com a falta de inovação e o clima desfavorável para investidores estrangeiros. “São elementos diretamente relacionados com a capacidade de um país dinamizar sua economia”, lembra Lia. Outro fator de alerta que cresce em menções dos especialistas entrevistados é o aumento da desigualdade de renda, que também afeta o bom desempenho econômico na região. “São problemas estruturais que nunca abandonam a lista de problemas da América Latina, e que ganham peso frente à necessidade de se impulsionar a atividade desses países”, conclui.

Previsão de crescimento do PIB dos especialistas consultados, países selecionados


Fonte: FGV IBRE; para o Brasil, Boletim Macro IBRE de novembro.

 


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