“Medicação, energia e nova alta de alimentos devem fazer com que inflação de abril supere a de março”, diz André Braz

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Apesar de o IPCA de março ter registrado uma alta menor que a esperada pelo mercado – de 0,16%, levando a inflação acumulada em 12 meses para 3,39% –, lida como sinal de alívio quanto à sua trajetória, André Braz, coordenador dos Índices de Preços do FGV IBRE, alerta que a tendência de curto prazo ainda é de altos e baixos, e que serviços continuam como fator de preocupação.

“O resultado de março foi muito influenciado pela desaceleração de alimentos, em especial alimentos in natura”, ressalta Braz. De acordo ao IBGE, em março o grupo de alimentos e bebidas, que respondeu por 70% da inflação total, registrou alta de 0,53%, contra 0,95% em fevereiro. Braz lembra que a variação de preço dos alimentos foi importante na evolução da inflação em todo o trimestre – com elevação em janeiro e desaceleração gradual nos meses seguintes. “Temos um acúmulo de inflação de alimentos que vem desde 2020 pela alta da inflação, se mantendo em 2021 com os reflexos da crise hídrica, e em 2022 pelos efeitos da guerra na Ucrânia sobre o preço de commodities agrícolas. Houve uma trégua no ano passado, por conta da supersafra, mas sequer o aumento de transferências de renda foi capaz de compensar esse acúmulo”, afirma.

Braz diz que a expectativa de que essa gradual desaceleração da inflação produz de que em breve se alcance uma estabilidade de preços, ou mesmo retração, deverá desaparecer já em abril. O Monitor da Inflação da FGV, que gera estimativas diárias do IPCA, antecipando seus movimentos, mostra nova aceleração dos alimentos in natura. “Nossas coletas de preço em abril já mostram essa reversão”, diz. “Considerávamos que a entrada do outono e de um clima mais ameno proporcionasse uma normalização da oferta – lembrando que os alimentos in natura são de lavoura curta, com isso não demanda muitos meses para a oferta melhorar. Mas os resultados não apontam para isso,”, afirma. Na primeira semana de abril, o preço do tomate registrou alta de 36%, a cebola, 13%, cenoura e batata também subiram. O lado positivo, destaca Braz, é que essa reaceleração esperada não se aplica a outros produtos como carnes, pães e açúcar.

Por outro lado, fora do campo dos alimentos, outros produtos também colaborarão para uma alta da inflação. “Entre eles, os medicamentos, com alta autorizada de até 4,5% a partir deste mês, além de um possível reajuste de gasolina e diesel, em função da recente alta do barril de petróleo”, cita, lembrando que os preços desses combustíveis já se encontram defasados em relação ao mercado internacional. “Com medicamentos, energia e essa nova pressão que se forma em alimentos, a inflação de abril tende a superar a de março”, afirma.

Mas o ponto que de fato levanta preocupação é o comportamento da inflação de serviços. Enquanto a inflação pelo IPCA em 12 meses encerrados em março é de 3,9%, a de serviços chega a 5,9%, aponta Braz. “Temos muitas fontes de pressão que diminuem o poder da política monetária sobre a inflação de serviços”, diz. Um deles, cita Braz, é a armadilha que o juro alto impõe sobre alguns mercados, como o de compra e venda de imóveis. “Se o juro está alto, desestimula a compra de imóveis, porque encarece o crédito. Isso faz com que a busca por aluguel se aqueça, e esse preço, que é um serviço livre, sobe”, descreve. Outra fonte de pressão é a indexação de preços, que tendem a aumentar quanto maior é a expectativa de inflação. “Condomínio, mensalidade escolar são exemplos de serviços que nunca sobem menos que a inflação do ano anterior”, exemplifica, lembrando ainda que o mercado de trabalho aquecido também fortalece essa tendência, dando fôlego ao consumo de serviços. “Somente à medida que a inflação vai convergindo para a meta é que essa tendência à indexação se reduz”, afirma. Entre os fatores que também podem colaborar para essa desindexação, Braz cita o aumento da concorrência onde hoje há concentração, como o elétrico, com a ampliação do mercado livre de energia.

Sobre os resultados de inflação ao consumidor dos Estados Unidos, que na contramão do brasileiro vieram piores que o esperado, refletindo-se em projeções menos otimistas para o horizonte de corte de juros, Braz comenta que o reflexo mais significativo poderá ser sentido nos investimentos. “Com um risco país maior do que o americano, uma questão fiscal ainda delicada e longe de ser de curto prazo, a manutenção de juros altos no EUA podem desestimular a permanência de investimentos no Brasil”, diz. Isso, por sua vez, pode ter repercussão no câmbio, que pode beneficiar as exportações de commodities, mas não o preço dos alimentos para o consumidor doméstico.

 


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