José Julio Senna alerta para os riscos de otimismo excessivo quanto aos rumos da política monetária

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

O clima de otimismo no mercado nesta superquarta, quando há definição dos juros básicos da econômica nos Estados Unidos e no Brasil, não altera a recomendação de prudência que José Julio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do FGV IBRE, vem recomendando em seus textos e apresentações. Hoje, em artigo publicado no jornal Valor Econômico (acesso aqui, restrito a assinantes do jornal), Senna descreve o ajuste nas condições financeiras operado pelo mercado desde o surgimento de sinais de desaquecimento do mercado de trabalho americano e previsões de crescimento do PIB abaixo do potencial. Tal como já apontava no IV Seminário de Análise Conjuntural, em meados de dezembro, os sinais de desinflação ainda não significam que o trabalho esteja concluído.  Naquele momento, Senna defendeu que o melhor que o FED tinha a fazer era manifestar descontentamento com o excesso de otimismo, indicando eu as condições financeiras teriam que “ficar apertadas em caráter minimamente permanente por algum tempo, bem como o crescimento da economia se manter abaixo do potencial por algum período”, o que implica um horizonte mais longo de corte de juros.

Não foi, entretanto, o que aconteceu. Na coletiva de imprensa de reunião do Fomc de dezembro, o chairman do FED “negou diversos princípios por ele mesmo defendidos até poucos dias antes, e deu resposta dovish a todas as perguntas que lhe fizeram”, ressaltou Senna no Valor. Isso implicou valorização  dos títulos do governo e a ampliação da confiança do mercado com mais cortes de juros em 2024, com os juros de dez anos chegando a 3,8%, “acarretando significativo afrouxamento das condições financeiras”.

Em seu artigo, Senna reforça a defesa de que é momento de os bancos centrais comunicarem que é cedo para se pensar em um afrouxamento maior da política monetária. Ele lembra que, combatida a inflação de bens, agora é baixa a margem para quedas e as inflações subjacentes continuam elevadas – inclusive no Brasil.

No Boletim Macro de janeiro (acesso aqui), Senna destaca que, ainda que a convergência da inflação para a meta de 3% em 2024 seja uma possibilidade, esse não é o fim do caminho. Ao BC também cabe garantir que esta se estabilize nesse patamar. “Para isso, o BC não poderá prescindir de manter os juros de política monetária em território contracionista, até que todo o processo se consolide”, escreve. Ele lembra que, do ponto de vista estritamente técnico, as condições para o início de corte da taxa de juros básica, a Selic, no ano passado ainda não estavam dadas. “Isso não deve ser lido, porém, como sugestivo de que o Banco Central se precipitou, tendo agido de maneira inadequada. Em qualquer decisão de política monetária, há sempre espaço para ações calcadas no julgamento que os formuladores de política fazem do quadro vigente”, destaca no Boletim, afirmando que a decisão de início de corte em agosto pareceu acertada. Ele lembra, porém que as perspectivas de mercado registradas na pesquisa Focus são de uma inflação acima da meta entre 2025 e 2027, em 3,5%, o que significa que, no médio prazo, ainda não se pode garantir uma inflação ancorada. E reforça a mensagem: “não basta atingirmos os 3,0%. Será preciso manter os 3,0%. Justamente por isso, será necessário praticar juros contracionistas ainda por um bom tempo. Afinal, não faltam ameaças ao processo inflacionário. Uma vez consolidado o processo de levar a inflação para a meta, a história poderá ser outra. Mas ainda temos chão pela frente”.

 


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