Inflação: ano começa com viés de alta

André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor da FGV 

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de janeiro, divulgado ontem (26/1) pelo IBGE, apontou uma variação menor do que a de dezembro (0,58% contra 0,78%, respectivamente), mas acima da esperada pelo mercado. André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor da FGV, considera que afora efeitos sazonais – a favor e contra a pressão de preços –, o primeiro fator de preocupação que emerge desses resultados é a persistência de um elevado índice de difusão – que mede a quantidade de itens com variação positiva –, acima de 70%, indicando uma alta ainda generalizada. “Esse resultado é fortemente influenciado preço de energia e combustíveis, que pesam no custo das mais diversas atividades, incluindo o setor de serviços”, diz Braz. Apesar de as perspectivas iniciais para 2022 terem sido de acomodação do preço dos energéticos, o economista lembra que esse jogo ainda não está ganho. Boletim do Operador Nacional do Sistema (ONS) referente à semana de 15 a 21 de janeiro aponta que, apesar da melhora dos níveis dos reservatórios observada – com os do Sudeste/Centro Oeste podendo atingir 41,4% de sua capacidade no fim de janeiro –, a situação hídrica ainda requer atenção, “sendo necessário aguardar o fim da estação chuvosa, que se encerra entre março e abril, para avaliar os reflexos na recuperação do volume de água estocada e adequar a operação do setor elétrico brasileiro, diz o ONS. No caso dos derivados de petróleo, Braz lembra que a crise na Ucrânia já fez os preços do petróleo voltarem a subir, gerando preocupação em torno de uma redução de oferta desse insumo.

Braz afirma que um conjunto amplo de fatores aponta a uma inflação mais alta em 2022 do que a estimada na virada do ano, de um IPCA na casa dos 5%. Entre os principais está a contribuição dos alimentos. Em janeiro, observou-se uma pressão sazonal vinda de alimentos in natura – o IPCA-15 apontou como destaques altas da cebola (17,09%) e das frutas (7,1%). Mas o economista do IBRE lembra que o efeito climático sobre lavouras de ciclo mais longo como milho, soja e trigo ainda podem incidir nesse quadro de forma mais intensa, multiplicando-se em outros itens da cadeia. “Tanto entre os derivados – por exemplo, uma maior demanda de importação de trigo para fabricação de pão, macarrão – à influência no preço das rações para suínos e bovinos, desdobrando-se para as proteínas”, enumera.

Outro segmento que preocupa Braz é o transporte público. “Se olharmos as variáveis que são drivers para se estimar o reajuste de ônibus urbano –combustíveis, peças, mão de obra, manutenção – tudo subiu dois dígitos, sugerindo um aumento da passagem em mais de 20%”, diz. “Essa sugestão, se acatada pelas prefeituras, pode trazer uma pressão inflacionária enorme, porque tarifa de ônibus urbano em especial pesa muito principalmente no INPC. Mesmo que optem por subsidiar para reduzir esse impacto, levando o reajuste para metade do indicado, ainda assim será uma pressão nada desprezível”, afirma. 

Para completar, Braz lembra que no campo doméstico a agenda no campo fiscal continua alimentando um ambiente de risco, que somado ao contexto de corrida eleitoral pode afetar câmbio e se refletir nos preços. A Ômicron permanece no radar, podendo atrasar a recuperação das cadeias globais de abastecimento. E, não menos importante, as sinalizações quanto ao ritmo de normalização da política monetária nas economias desenvolvidas também acentuam um viés de alta para a inflação brasileira. Em coletiva no final da reunião do comitê de política monetária do BC americano (Fomc), ontem (26/1), o presidente do FED Jerome Powell indicou a intenção de iniciar uma elevação de juros na próxima reunião do comitê, além da possibilidade de que haja ajustes em todas as demais reuniões do ano. 

No caso do Brasil, Braz considera que o BC deverá estar atento às variáveis que incidirão numa provável alta da inflação acima da estimada. “Será preciso trabalhar com núcleos de preços, observar as variáveis em que o aumento de juros tem poder de desacelerar a inflação, para agir sem penalizar a economia mais do que já será necessário (com uma Selic fechando o ano acima de 12%)”, diz.

IPCA-15 janeiro/22

Fonte: IBGE

 

Previsão de energia armazenável máxima (%) por reservatório em 31 de janeiro

FONTE: ONS

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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