A fragilidade do mercado de trabalho

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

O dinamismo do mercado de trabalho no Brasil antes da pandemia foi fruto de um crescimento acelerado em um punhado de ocupações ligadas ao setor de serviços, caracterizadas pela baixa produtividade. Apenas seis ocupações, entre 2012 e 2019, que correspondem hoje a 18,1% da população ocupada (PO), foram responsáveis pela criação de 5,25 milhões de postos de trabalho. Se for levado em conta que o crescimento da população ocupada total entre 2012 e 2019 foi de 4,4 milhões, significa dizer que todas as outras ocupações, que hoje representam 81,9% da população ocupada, tiveram perda de vagas no período. Em suma, o grupo de seis ocupações de serviços foi responsável por mais do que todo o crescimento da PO no período que vai de 2012 até pouco antes da pandemia.

Esses postos de trabalho foram de comerciantes e vendedores de lojas; outros vendedores; condutores de automóveis, caminhonetes e motocicletas; cabelereiros, especialistas e tratamento de beleza e afins; cozinheiros; vendedores de rua. Se expandiram 42,6% entre 2012 e 2019, enquanto a PO como um todo só cresceu 4,9%.

População ocupada


Fonte: PNADC.

Como mostra a Carta do IBRE a ser publicada na revista Conjuntura Econômica deste mês, com base em trabalho dos pesquisadores Janaína Feijó, Laísa Rachter, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Fernando Veloso, do FGV IBRE, “esses postos de trabalho são bastante vulneráveis. No trabalho, os pesquisadores mapearam as ocupações em ascensão e declínio no mercado de trabalho nacional. São postos de trabalho que, comparados à média brasileira, pagam menos, têm trabalhadores menos instruídos, operam mais na informalidade – e, na crise da pandemia, tiveram evolução de rendimentos pior e foram perdidos em proporção maior do que o restante das ocupações”.

Segundo a Carta, “apesar de ter sido – como se mostrou acima – responsável por mais do que toda a criação de postos de trabalho no Brasil entre 2012 e 2019, o grupo teve queda do rendimento real médio de 5,6% no período, comparado a aumento de 4,4% para a PO como um todo.

Rendimento Habitual Médio (R$)


Fonte: PNADC. Nota: em reais do 3º trimestre de 2021.

E isso ocorreu mesmo diante do fato de que, em termos proporcionais, a parcela com ensino superior completo no grupo de seis ocupações de serviços tenha crescido mais do que na PO total de 2012 a 2019 (sempre se tomando o terceiro trimestre). No primeiro caso, quase dobrou, de 4,9% para 9,4%. Na PO, a alta foi de 42%, de uma fatia de 14,3% para 20,3%. Houve, portanto, um relativo salto educacional nas seis ocupações de serviços, mas que não se traduziu, comparativamente, em maior renda. Em termos reais, a distância entre o salário médio daquele grupo de atividades e o da PO total se elevou de R$ 507 no terceiro trimestre de 2012 para R$ 724 no mesmo período de 2019”.

“O fato de que esse tipo de posto de trabalho – tipicamente no setor de serviços, e de baixa produtividade, pequeno salário e pouca segurança para o trabalhador – seja o que mais tenha aumentado de 2012 até 2019 -, caracteriza a baixa qualidade do crescimento brasileiro nesse período”, diz Fernando Veloso, um dos autores do trabalho.

Janaina Feijó, também autora do trabalho, observa, segundo a Carta, que “enquanto nos países desenvolvidos têm ocorrido uma revolução nos tipos de emprego demandados, com destaque para os da área de TI, a geração de emprego no Brasil tem sido pautada pelo crescimento de postos de trabalhos de baixo valor agregado, o que, por sua vez, compromete o potencial de crescimento da economia.”

“Todos esses dados mostram que as seis ocupações de serviços que foram o dínamo da criação de empregos no Brasil nos últimos anos pré-pandemia se caracterizam, na comparação com a média dos postos de trabalho no País, por menos renda, menos instrução, mais informalidade e, na crise econômica trazida pela Covid-19, maior queda de rendimentos e mais probabilidade de desemprego”.

Outro autor do trabalho, Fernando de Holanda Barbosa Filho ”aponta que a taxa de crescimento do produto potencial brasileiro tem declinado ao longo do tempo, situando-se hoje em nível bastante baixo, em torno de 2% ao ano. Não se enxerga no horizonte, infelizmente, um cenário em que a dinâmica do mercado de trabalho nacional passe a criar empregos de qualidade, bem pagos e seguros. Infelizmente, a vulnerabilidade deve perdurar”.

Agradeço a Janaina Feijó e Paulo Peruchetti as informações para a elaboração dos gráficos.

Ver a íntegra da Carta do IBRE

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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