Em Foco

Para onde caminhamos?

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

Os economistas com quem tenho conversado, e alguns cientistas políticos, têm demonstrado grande preocupação com o que tem saído na imprensa sobre uma série de propostas de política econômica. Fora dessa seara, como me disse recentemente uma cientista política, está se recuperando alguns instrumentos que foram perdidos. Ela me disse: “na economia, as coisas estão caminhando muito mal, pelo que sabemos. Mas esse novo governo está focado na vida das pessoas, o que vai desde a remontagem das vacinações, o acolhimento aos mais desamparados, a uma nova estratégia de amparo às mulheres, entre outras ações. Ou seja: é a recuperação do item mais valioso, a vida das pessoas”.

Mas a questão econômica está muito embaralhada. A expetativa era de que o governo Lula, com base nos seus discursos de campanha, adotasse uma política mais liberal, semelhante à de seu primeiro mandato. Nos dois primeiros mandatos de Lula, o PIB teve um crescimento médio da ordem de 4%, entre 2003 e 2020, superando o crescimento registrado na gestão de Fernando Henrique Cardoso que de 1995 a 2002 avançou, em média, 2,3%.

Ou seja: está muito mais complicado fazer a economia crescer. O mundo está muito diferente dos áureos tempos do primeiro mandato de Lula. Os juros estão em alta, a inflação disseminada pelo mundo, menor crescimento mundial, tensões geopolíticas – guerra na Ucrânia e aumento de tensão entre China e Estados Unidos – embora haja alguns fatores que podem ajudar o Brasil. Samuel Pessôa, pesquisador associado do FGV IBRE cita, pelo menos, dois:

• A melhora nas projeções para a economia chinesa este ano, após o abandono da política de Covid zero no final de 2022, que sinaliza perspectivas mais positivas para as exportações brasileiras de commodities, seja em preços ou volumes.

• Haverá uma colaboração que a desinflação do mundo poderá trazer ao nosso processo de recondução da inflação à meta, dado que a formação de preços dos bens transacionáveis é fruto da dinâmica do mercado internacional.

Se isso vai acontecer ou não, só o tempo dirá, já que houve nova rodada de alta de juros nos Estados Unidos esta semana, com o FED, o Banco Central norte-americano, aumentando a taxa de juros em 0,25 ponto, que subiu para o intervalo de 4,75% a 5%, o maior desde 2007.

Mas, voltando a preocupação dos economistas, e de nós, jornalistas econômicos, sobre a condução da política econômica, os sinais emitidos até agora não são os mais saudáveis. Só para lembrar alguns:

• Há uma forte pressão para que o Banco Central baixe os juros. Na reunião de ontem, 23, o BC ignorou essas pressões e manteve a taxa Selic em 13,75% ao ano. Isso fez aumentar a temperatura. O governo pretende pressionar o Congresso para tirar do cargo Roberto Campos Neto, presidente do Banco, cujo mandato vai até o final de 2024.

• Há pronunciamentos contra a independência do Banco Central, que garante uma política monetária isenta de pressões de governo.

• O presidente declarou que os livros de economia estão ultrapassados e uma nova forma de governar deve ser instaurada. Não se sabe qual seria.

• Informações veiculadas na imprensa dão conta do desejo do governo de reverter a privatização da Eletrobras, bem como não dar sequência a qualquer processo de privatização de estatais.

• Há sinalizações para a mudança das Lei das Estatais e a volta da utilização dos bancos públicos, em especial o BNDES, para políticas voltadas ao crescimento. É bom lembrar do projeto das “campeãs nacionais” que, como se sabe, consumiu dinheiro público e não atingiu seus objetivos.

• Já foram emitidos sinais da volta de uma política de construção de navios no Brasil. O que foi um desastre quando se tentou nos governos do PT.

• Um aumento excessivo de gastos foi aprovado na PEC da Transição, o que não caracterizou uma preocupação com a sustentabilidade fiscal, embora o governo tenha defendido que está empenhado nessa questão. O novo arcabouço fiscal que pode ser anunciado em abril deve sinalizar para que lado vamos caminhar.

• O presidente Lula declarou, esta semana, que a Operação Lava Jato teve o apoio da CIA para desestabilizar as empresas brasileiras. Uma declaração desnecessária que só coloca mais lenha na fogueira, às vésperas de sua viagem à China.

• No meio da divulgação de um plano do PCC para eliminar o ex-juiz, e hoje senador, Sérgio Moro e outras autoridades, que tomou conta dos noticiários das televisões e dos jornais, Lula declarou que “a operação da Polícia Federal foi uma armação de Moro”, colocando em dúvida as próprias declarações de seu ministro da Justiça, Flávio Dino. E causando mais confusão no já conturbado no cenário político.

Deixando de lado essas questões que, sem dúvida, atrapalham uma condução com previsibilidade para o futuro do país, o presidente sabe que só se houver crescimento econômico poderá atender às inúmeras demandas que, diariamente, chegam à sua sala, e não correr o risco de ver sua popularidade cair. Foi assim no segundo mandato do governo Dilma, quando ele insistia para o governo tomar medidas para alavancar o PIB. Nos quatro primeiros anos do governo Dilma, a atividade econômica cresceu 2,3%. No segundo, de 2015 a 2016, interrompido pelo impeachment, recou 3,4%, em média.

O novo arcabouço fiscal e a reforma tributária, que estão no radar do novo governo, podem desarmar os mais pessimistas e colocar o Brasil em uma rota de crescimento. Mas o caminho é longo e tortuoso.

Marcos Mendes, pesquisador do Insper, organizou um livro “Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil”, disponível gratuitamente na versão Kindle, onde são enumeradas as principais ações desenvolvidas que acabaram consumindo recursos e não trazendo benefícios ao país. Recomendo a leitura.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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