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Uma política econômica insustentável?

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

Samuel Pessoa, pesquisador associado do FGV IBRE que tem acompanhando a fundo a evolução da economia brasileira nos últimos anos, com uma visão que na maioria das vezes foge da caixa – quando introduz no debate enfoques ainda não abordados ou que fogem do consenso da maioria dos analistas –, em seu Ponto de Vista da edição de outubro da revista Conjuntura Econômica defende que a política macroeconômica que o País seguiu entre 2007 e 2014 era insustentável, sem chances de continuar.

Entre 2007 e 2014, o PIB teve altos e baixos, atingindo seu pico em 2010 com um crescimento de 7,5%, na época em que ficou conhecida como “o milagre brasileiro”. Foi o auge do crescimento do governo Lula, que mereceu até capa da The Economist.

PIB – EVOLUÇÃO ANUAL – (EM %)

 Fonte: IBGE.

Mas o que sustenta a opinião de Samuel? Para ele, o fator que mostra que a política econômica daquele período não se sustentaria foi a queda dos preços das commodities, no final de 2014, que vinha dando gás para o crescimento do PIB, embora em taxas cada vez menores a partir de 2010 até o início da derrubada dos preços internacionais.

Além desse fator, ele aponta uma série de desequilíbrios anteriores, escondidos dentro do armário devido aos bons ventos externos que sopravam no período. E que, aparentemente, ninguém prestou atenção.

Samuel enumera quais foram esses desequilíbrios que vinham corroendo lentamente a política macroeconômica implementada.

• Os salários subiram a uma taxa superior ao crescimento da produtividade do trabalho. A partir de 2007, os salários se descolam completamente da produtividade e, em 2014, encontram-se 40 pontos percentuais acima da produtividade, como mostra o Observatório da Produtividade Regis Bonelli do FGV IBRE. 

• Houve queda da rentabilidade das empresas abertas, de 25% em 2004 para 19% em 2014, mesmo com os enormes esforços para elevá-la, por meio da desoneração da folha e da redução do custo da energia elétrica Segundo a avaliação de Samuel, os 19% de 2014 “provavelmente seriam menores com uma política de realismo tarifário e com reoneração dos impostos”.

• O resultado primário estrutural do governo central piorou como proporção do PIB, passando de 2,2% em 2003 para – 0,8% em 2013 e – 2,3% do PIB em 2014.

• A inflação cheia, de preços livres e todos os núcleos de inflação, elevaram-se continuamente ao longo do período. Impossível não caracterizar a política econômica praticada entre 2007 e 2014 como insustentável.

Outros pontos levantados:  uma virada de 8 pontos percentuais do PIB nas exportações líquidas; as menores taxas de desemprego da série histórica disponível; e, segundo a Instituição Fiscal Independente (IFI), a economia operou além do pleno emprego de fatores de produção.

Em seu artigo, Samuel também é contra a tese de que a desaceleração do crescimento após a crise de 2008 foi fruto da queda dos investimentos, especialmente públicos. Pegando dados de 1997 a 2014 do Observatório de Política Fiscal do FGV IBRE, afirma que “não há nenhuma quebra relevante no primeiro mandato de Dilma Rousseff em comparação ao segundo mandato de Lula. Há o ciclo político com elevação do investimento público em 2010 e manutenção, no triênio de 2011 a 2013, do nível anterior. A queda do investimento ocorreu somente após o esgotamento fiscal do Estado. Também não houve redução do investimento privado entre 2011 e 2013, e que a redução de 2013 para 2014 não foi expressiva em termos históricos. Não foi a queda do investimento privado que produziu a crise. Sabemos que a rentabilidade das empresas estava em queda”.

Finaliza afirmando que “a sustentação do investimento ocorreu em função da enorme artificialidade da política econômica da época”.

É um novo olhar sobre o que aconteceu na economia nos anos recentes e que vai contra outras análises que, invariavelmente, lemos na imprensa ou em artigos de economistas. Merece uma reflexão mais profunda.

Acesse gratuitamente a edição de outubro da revista Conjuntura Econômica e veja, na íntegra, o artigo de Samuel Pessoa.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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