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Política monetária: trajetórias paralelas Brasil e EUA

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

Apesar do anúncio do novo arcabouço fiscal, que ainda deve ser avaliado pelo Congresso, o que deve ocorrer somente a partir do dia 15 deste mês, conforme as previsões, e do aumento da pressão de membros do governo para que o Banco Central reduza a taxa de juros, ontem (4/5), em sua reunião de diretoria, o BC manteve a taxa básica de juros em 13,75% ao ano. Isso não agradou o presidente Lula, que voltou a criticar a política de juros que vem sendo adotada.

Durante a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, o presidente Lula disse que juros são assunto proibido. “Esse Conselho pode até discutir taxa de juros se quiser. É engraçado, todo mundo aqui pode falar de tudo, só não pode falar de juros.” E alfinetou o presidente do BC, Roberto Campos Neto. “Ninguém fala de juros. Como se um homem sozinho pudesse saber mais do que a cabeça de 215 milhões de pessoas.”

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Em sua coluna Ponto de Vista, que vai circular na próxima edição da revista Conjuntura Econômica, Samuel Pessôa, pesquisador associado do FGV IBRE, traça interessante análise sobre a trajetória da inflação brasileira e a similaridade entre as economias brasileira e americana, ao afirmar que “é mais comum do que se imagina que a trajetória das economias brasileira e americana apresentem dinâmicas sincrônicas... estando em um momento muito próximo do ciclo econômico”. Com a inflação, o quadro é semelhante, com os indicadores apontando forte resistência nos preços e, consequentemente, no núcleo da inflação, que teima em não ceder. Tanto aqui como lá.

Vasculhando dados sobre as duas economias, Samuel destaca alguns pontos em comum:

• O mercado de trabalho encontra-se apertado, com a taxa de desemprego, tanto lá quanto cá, abaixo das estimativas da taxa natural (que é aquela que não acelera a inflação). A taxa de desemprego no primeiro trimestre no Brasil, com ajuste sazonal, foi de 8,1%, e, para a economia americana, de 3,5%.

• As duas apresentam sinais de crescimento com surpresas positivas. A economia americana cresceu no primeiro trimestre 1,1%, considerando a taxa anualizada, o que pode ser interpretado como o início de uma desaceleração mais saliente, pois o crescimento do produto potencial é de 1,8%. Para a economia brasileira, há sinais de que, no primeiro trimestre, a economia cresceu na casa de 1% (ou pouco mais de 4% para a taxa anualizada).

• Há sinais de desaceleração no Brasil – por exemplo, a taxa de crescimento da população ocupada tem caído e tem sido negativa desde janeiro. No entanto, tudo sugere que tanto nos Estados Unidos como no Brasil a desaceleração tem sido lenta, fato evidenciado pela inércia na inflação americana e brasileira.

Com a inflação, as coisas são similares. Nos Estados Unidos, o FED, o Banco Central de lá, aumentou esta semana em 0,25 ponto a taxa de juros, já que os dados mostram uma resiliência inflacionária, com sinais de persistência inflacionária americana em torno de 5%. Com isso, a taxa de juros norte-americana oscila entre 5% a 5,25%. É a décima alta seguida dos juros. Como já mencionado, em sua última reunião, o Banco Central brasileiro manteve a taxa básica de juros, a Selic, em 13,75% ao ano.

Em sua coluna, Samuel transcreve trecho da ata do COPOM que decidiu manter a taxa de juros: “o ciclo monetário deve ser longo e, segundo o COPOM, ainda não estão dadas as condições para o início do ciclo de queda da taxa de juros. Para amenizar um pouco o clima político junto ao governo e aos políticos em geral – a percepção dos políticos em geral (sem nenhuma base) é de que os juros praticados pelo Banco Central estão errados –, o COPOM enfraqueceu a possibilidade de iniciar um ciclo de elevação de taxa de juros”. Escreveu: “O Copom enfatiza que, apesar de ser um cenário menos provável, não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”.

A inflação que se espalhou pelo mundo, ainda em função dos resquícios da pandemia e da guerra entre a Rússia e Ucrânia, levou o Banco Central Europeu a aumentar, em sua reunião de ontem, a taxa de juros em 0,25 pontos, seguindo a mesma trajetória do FED. Alguns diretores do Banco defendiam uma alta maior, de 0,50 pontos, o que sinaliza que um arrefecimento da política monetária na Zona do Euro ainda está longe de acontecer. Embora a alta tenha sido menor que as anteriores, é a sétima vez que o Banco eleva a taxa de juros.

Por aqui, só resta esperar a próxima reunião do BC, que ocorrerá daqui 45 dias, e como irá se comportar a economia, para sabermos se terá início o processo de redução da inflação. Pressão para isso é que não falta.

Taxa de Juros (%): Brasil e EUA

Fonte: Bacen e FRED (Federal Reserve Bank of St. Louis).

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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