Construção: confiança e produtividade em alta. Até quando?

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Índice de Confiança da Construção do FGV IBRE marcou em setembro a terceira alta consecutiva, alcançando os 98,1 pontos, maior nível desde outubro de 2022 (100,9 pontos). Esse desempenho, entretanto, não foi disseminado entre todos os segmentos. Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do FGV IBRE, diz que a reação do segmento de infraestrutura em relação ao anúncio do novo PAC, que não aconteceu no mês de anúncio do programa (leia mais aqui), refletiu-se nos resultados de setembro. “Em agosto não tivemos a resposta que esperávamos, mas ela de fato chegou na sondagem deste mês”, afirma, com alta da de 4,7 no Índice de Confiança. “Quando observamos os indicadores que formam parte do índice, vemos que hoje a infraestrutura apresenta inclusive um nível mais elevado do que a média do setor. Quando se olha especificamente para o segmento de obras viárias, por exemplo, este apresenta um nível bem acima da neutralidade, de 100 pontos”, afirma.

Por outro lado, o segmento de edificações registrou queda de 2,2 pontos na confiança em relação ao mês anterior. Ana explica que as sinalizações da Sondagem são de que as preocupações dos empresários não estão depositadas na demanda prevista, mas sim no ambiente de negócios – leia-se condições financeiras para avançar em projetos e mão de obra qualificada. Indicador da Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) em parceria com a Fipe divulgado ontem converge com essa fotografia.  De acordo à Abrainc, no primeiro semestre deste ano a venda de imóveis no Brasil cresceu 9,8% em relação ao mesmo período de 2022, com alta de 12,2% no valor de venda. Essa evolução de vendas foi verificada tanto no segmento econômico (4,2% na mesma comparação) quanto de médio e alto padrão (22,8%). Já os lançamentos recuaram 13,8% em volume. “Na Sondagem de setembro, o segmento avançou em termo de expectativas, mas com essa percepção negativa sobre a situação dos negócios. Assim, tudo indica que esse ciclo de desaceleração seja curto, especialmente com a perspectiva de que a habitação social volte a ganhar protagonismo”, diz Ana, destacando que nos indicadores de demanda prevista e mão de obra prevista, houve alta de respectivamente 1,4 e 0,4 ponto em relação a agosto. 

Confiança da construção


Fonte: FGV IBRE.

Outro dado do FGV IBRE divulgado esta semana lança mais sinais positivos para o setor. As medidas de produtividade setorial do segundo trimestre calculadas pelo Observatório da Produtividade Regis Bonelli mostram que, seja na medida por horas habituais, horas trabalhadas ou por pessoal ocupado, a produtividade do trabalho no setor da construção está entre as que mais evoluiu este ano - ainda que vista pelo retrovisor pelo agronegócio, que disparou na frente. “Isso pode refletir que, em projetos de grandes empresas, já pode haver modernização de processos”, diz Silvia matos, coordenadora do Boletim Macro FGV IBRE, também pesquisadora do Observatório. Ana Castelo ressalta que no setor observa-se uma queda de população ocupada sem carteira assinada e por conta própria, com aumento das vagas com carteira assinada, que tendem a ser empregos inseridos em estruturas de trabalho mais produtivas. “Também observamos que o saldo líquido gerado pelo segmento de infraestrutura é o que mais está crescendo em relação ao ano passado, enquanto o de edificação apresenta queda, embora continue contratando, refletindo o ciclo de desaceleração, mas também reforçando a melhora das expectativas”, diz. 

Taxa de crescimento (%) da produtividade por horas efetivas, em relação ao mesmo trimestre do ano anterior 
Segmentos selecinados


Fonte: Observatório da Produtividade Regis Bonelli.

Tal como apontado em postagem de agosto (leia aqui), Ana ressalta que o aumento recente da produtividade do setor também deve estar relacionado a um efeito composição, já que na época da pandemia prevaleceram pequenas obras realizadas por famílias – segmento conhecido como “formiguinha”. “Como esse ciclo de reformas também se esgota, e as condições financeiras das famílias também estão menos favoráveis, essas atividades em geral menos eficientes perdem participação, ganhando peso o setor formal”, descreve.

A reforma tributária pode colaborar para o aumento da eficiência produtiva do setor, já que o atual sistema incentiva a alvenaria tradicional e penaliza processos industrializados, e com o IVA haverá isonomia no tratamento. “Por outro lado, a reforma também tem gerado preocupação para o setor, de que a carga tributária final tenda a crescer, posto que hoje essa atividade é favorecida com desonerações. O Regime Especial de Tributação (RET) para incorporações imobiliárias, por exemplo, estabelece um pagamento único mensal de 4% da receita que cobre IRPJ, CSLL, PIS/Pasep e Cofins.

Evolução (%) das assinalações de escassez de mão de obra qualificada na Sondagem da Construção


Fonte: FGV IBRE.

Mas esse não é o único ponto de atenção quanto à produtividade do setor. “Hoje, mesmo sem esse incentivo à modernização, já observamos um aumento importante de assinalações de falta de mão de obra qualificada entre os quesitos que limitam os negócios das empresas”, afirma Ana, indicando que para melhorar os processos construtivos também será preciso cuidar da agenda de capacitação, para que a mão de obra não se torne um entrave a esses ganhos esperados.

Ana lembra que as expectativas de crescimento do setor para este ano estão abaixo do agregado do PIB (1,4% conta 2,5% nas projeções do Boletim Macro). “O menor dinamismo da parcela da produção que vem da autoconstrução e pequenos gestores é o principal fator desse desempenho, posto que a produção formal está crescendo, como os dados de emprego apontam”, afirma. “Para 2024, considerando a expectativa de um novo protagonismo da habitação interesse social com o Minha Casa Minha Vida e, na infraestrutura, os efeitos da esperada aceleração dos investimentos relacionados aos leilões de concessão dos últimos anos, e a aceleração de obras públicas municipais no primeiro semestre por ser ano de eleição, deveremos ter um bom resultado para a construção.”

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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