“Aumento do desalento entre jovens é preocupante”

Maria Andreia Parente Lameiras, pesquisadora do Ipea

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Há quase uma década, quando economia e mercado de trabalho estavam aquecidos, os jovens brasileiros protagonizaram um particular movimento. Saíram das estatísticas de desemprego – que são historicamente altas na faixa entre os 18 e 24 anos – não apenas por terem mais oferta de trabalho, mas pela decisão de dedicar-se exclusivamente aos estudos.  Levantamento do FGV IBRE de 2012, que cruzou dados de emprego com o de matrículas, mostrava que 30% da queda do desemprego no início daquele ano comparado a 2011 eram atribuídos a essa saída da força de trabalho, em uma conjuntura na qual a renda das famílias permitia manter parte desses jovens só estudando, para que completassem o ensino médio ou superior.

No ano passado, essa movimentação para fora do mercado também foi notada, mas por motivos indesejados. Levantamento feito pela pesquisadora Maria Andreia Parente Lameiras, do Ipea, aponta uma retração de 10,6% na força de trabalho de pessoas entre 18 a 24 anos de idade no quarto trimestre de 2020, e uma taxa de desocupação que chegou a 29,8%, cerca de 4,1 milhões de pessoas. “Quando olhamos quem saiu mercado de trabalho direto para a inatividade, vemos que o jovem é o segundo maior grupo. Só perde para pessoas acima de 60 anos, entre as quais essa escolha é mais compreensível, pois muitas vezes está relacionada à aposentadoria”, diz. “O aumento desalento entre jovens é preocupante”, reforça.

Maria Andreia, que fez sua análise com base nos micro dados de transição da PNAD Contínua, afirma que o impacto da pandemia no mercado de trabalho, embora tenha abarcado todos os perfis etários, acabou intensificando diferenças já existentes. “É como se o jovem, que normalmente já largava atrás na corrida pelo emprego, agora observasse uma distância ainda maior dos demais concorrentes”, compara. Para ela, um dos agravantes desse desalento é a possibilidade de que, em função do desemprego, esse grupo também tenha abandonado os estudos, por falta de capacidade de pagamento. “Interromper a qualificação também é um ponto negativo, posto que trabalhadores mais preparados tendem a se manter mais empregados do que pessoas com menos anos de estudo. Em geral, a população ocupada com ensino superior sempre cresce”, diz. Essa tendência foi comprovada em 2020, afirma, com uma expansão maior do desemprego e inatividade entre pessoas de mais baixa escolaridade.  “Com a redução do valor e cobertura do auxílio emergencial, é possível que mais pessoas que estavam na inatividade voltem a buscar emprego. E, entre os jovens menos qualificados, a tendência é de que o desemprego suba ainda mais, pois quem estiver mais bem preparado conseguirá se recolocar primeiro”, diz. Diante de tal cenário, a tendência é de que o grupo menos favorecido em escolaridade busque sua fonte de renda na informalidade.

Maria Andreia defende a priorização de duas frentes de apoio aos jovens: medidas de estímulo à contratação – como o programa Jovem Aprendiz e o projeto da Carteira Verde Amarela, modelo de contratação com menos encargos e benefícios, que vinha sendo discutido no âmbito do governo federal – e políticas de financiamento estudantil. “Quando tivermos a retomada da economia de forma mais consistente, será importante ter instrumentos de estímulo à inserção do jovem no mundo do trabalho”, diz. A literatura acadêmica sobre mercado de trabalho estrutural aponta que jovens que se deparam com conjunturas ruins em seu início de carreira em geral leva essa experiência em toda a sua vida laboral, lembra a pesquisadora, com prejuízos a sua capacidade de aperfeiçoamento e de produtividade. “Um jovem que busca melhorar sua formação, mas não encontra uma oferta de trabalho compatível, pode se frustrar, e todo seu potencial morre ali”, diz, apontando que essa é uma das heranças desse período de pandemia que se deve evitar.

Transição da ocupação para a inatividade - Por idade (em %)


Fonte: PNAD Contínua/IBGE.

 

Transição da ocupação para a inatividade - Por escolaridade (em %)


Fonte: PNAD Contínua/IBGE.

 


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