Retrocesso no campo ambiental é um dos pontos mais negativos para o Brasil entre os primeiros atos de Trump, analisa Lia Valls
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Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
Nesta segunda-feira (20), Donald Trump assumiu seu segundo mandato como presidente dos Estados Unidos confirmando o discurso de campanha com duras promessas para “tirar o país do declínio” e a assinatura de atos relacionados, entre outros, a imigração, comércio internacional, energia e expansão de território. Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE, destaca que, nesta primeira rodada de decretos, um dos pontos mais sensíveis para o Brasil é o relacionado ao clima, com a retirada dos EUA do Acordo de Paris – tratado internacional focado em fortalecer a resposta global às mudanças climáticas, lançado em 2015, do qual 195 países foram signatários.
“Para o Brasil, é uma direção ruim, pois enfraquece a tarefa de se avançar na criação de um fundo comum”, cita, destacando ainda que avançar com a agenda de transição energética é positivo para a atração de investimentos ao Brasil, diante de seu diferencial competitivo no campo das energias limpas. Por exemplo, entre o grupo de think tanks da área de comércio que participaram do G20 no ano passado, no Rio de Janeiro, a recomendação foi de se reforçar a necessidade de criação de um fundo de compensação para os países mais pobres, considerando o potencial que a agenda de transição energética tem de ampliar as desigualdades. Ainda que incentivos para ampliar a exploração de petróleo já eram esperados, a freada no caminho da transição para energias renováveis é um fator de preocupação, reforça Valls.
Em entrevista para a coluna da jornalista Miriam Leitão no jornal O Globo (link aqui, restrito a assinantes do jornal), Valls também destacou como negativo o discurso incisivo de Trump quanto ao Canal do Panamá, anunciando a intenção de retomá-lo. A pesquisadora destaca que a intenção de Trump de sugerir domínio chinês no Canal é equivocada, indicando que o que de fato ocorre é a operação de parte da área por uma empresa chinesa. “Do ponto de vista político, se trata de uma ingerência na América Latina, algo que tende a ser refutado pela diplomacia brasileira e de outros países da região”, diz, lembrando que pelo Canal passam navios de diversas nacionalidades. Valls lembra que o Panamá já declarou resistência a essa iniciativa – apesar de sua pouca capacidade de resistência, a depender da estratégia americana. “Não sabemos ainda até que ponto Trump pode levar essa promessa adiante, se a intenção é forçar a uma negociação vantajosa para os EUA no campo tarifário, por exemplo”, diz, lembrando que um conflito envolveria também os interesses chineses, “que também tendem a evitar qualquer conflito aberto”.
Em entrevista para o Estado de S. Paulo (link aqui, restrito a assinantes do jornal) , Valls reforçou a mensagem de que, no momento, a melhor estratégia para o Brasil é de se concentrar na agenda de diversificação de mercados e da pauta exportadora. Em conversa para o Blog quando Trump foi eleito (leia aqui) , a pesquisadora destacou que, da mesma forma que as medidas tarifárias prometidas por Trump – e ainda não definidas – podem gerar impactos negativos, há possibilidade de desvios de comércio que beneficiem o país.
Ao Estadão, Valls destacou que o primeiro governo Trump foi marcado por um aumento de tarifas de importação sobre produtos siderúrgicos e alumínio brasileiro e de outros países, e que uma escolha por selecionar setores para aumento de taxação pode ser uma alternativa, ainda que não a declarada por Trump, que anunciou o desejo de um aumento generalizado de tarifas. A pesquisadora também destacou os 37 acordos assinados entre China e Brasil em 2024, alguns deles envolvendo abertura de mercado para produtos – como é o caso do sorgo – o que pode ser lido como uma estratégia preventiva dos chineses caso a guerra tarifária com os EUA se acirre. Quanto o Brasil poderá ampliar sua integração comercial e cooperação com a China dependerá, porém, dos desdobramentos da disputa China x EUA. Brics e Cop-20, ambas com o protagonismo brasileiro, em ambos temas de desagrado de Trump, também demandarão atenção da diplomacia brasileira, como alertou Valls em outra conversa para o Blog (leia aqui). Em conversa com jornalistas nesta segunda, Trump afirmou que se o Brics mantiver o plano de reduzir o papel do dólar no comércio, os países do bloco sofrerão tarifas de 100% nos produtos que exportarem aos EUA.
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