Inflação de alimentos: no curto prazo, a melhor medida é não contribuir para a depreciação cambial, avaliam pesquisadores do FGV IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Pesquisadores do FGV IBRE foram destaque no Valor Econômico ao discutir as causas da inflação de alimentos e formas de mitigar essa alta (link para a matéria, acesso exclusivo a assinantes do jornal). Ao Valor, eles anteciparam algumas das conclusões da Carta do IBRE de março, que trata do tema.

Para os pesquisadores, medidas de cunho intervencionista – como a fixação de cotas de exportação – não são recomendáveis. No curto prazo, recomendam, o mais adequado é proporcionar um ambiente macroeconômico “que não contribua para a depreciação cambial”, fator importante na recente alta de preços, como debatido em matéria da Conjuntura Econômica de fevereiro (confira aqui). Bráulio Borges afirmou que, enquanto uma depreciação cambial de 10% representa de 0,8 a 1 ponto percentual a mais no IPCA um ano à frente, no caso dos produtos da cesta básica esse repasse é de 22%, e é quase instantâneo. “A depreciação cambial de 2024, da ordem de 25%, gerou um impacto muito relevante no preço dos alimentos no período mais recente”, disse Borges ao Valor. Caso o câmbio se estabilizar na casa dos R$ 5,70 a R$ 5,80 por dólar, abaixo dos R$ 6,20 a R$ 6,30, pode haver algum alívio nos preços dos alimentos no domicílio, completou.

No médio e longo prazos, a lista de tarefas é multifacetada e envolve de políticas de fomento ao investimento em pesquisa e avanço da infraestrutura – tanto logística quanto de armazenamento – ao estudo de formas para tornar outras culturas além da soja e do milho mais produtivas e lucrativas. “É preciso tirar da cabeça ideias como a de que, com safra grande, a inflação de alimentos cresce menos”, afirmou Francisco Pessoa Faria, pesquisador associado do IBRE, reforçando que essa questão requer a coordenação uma série de iniciativas, que abarquem diversos problemas hoje identificados, discutidos com os jornalistas do Valor.

Alimentação como protagonista
alimentos pressionam a inflação desde 2020


Fonte: IBGE.

Um deles é o fato de a produção das lavouras no Brasil não estar crescendo o suficiente para atender à demanda de alimentos voltados para consumo humano, em alta tanto no Brasil – com o aumento do PIB per capita e melhora da distribuição e renda observados desde os anos 2000 – quanto no exterior, com destaque para a demanda chinesa por commodities. Farias indica que, de 2010 a 2023, as áreas plantadas de soja e milho cresceram, respectivamente, 90% e 74%, enquanto as demais culturas ficaram estagnadas ou retraíram – caso do arroz, em que Faria aponta a possibilidade de troca de cultura. “Houve perda de área de arroz para a soja no Maranhão e no Piauí, por exemplo”, ilustrou ao Valor, apontando que alguns estados podem ter abandonado essa cultura devido à baixa produtividade.  Com isso, completou Borges, a produção brasileira de arroz ficou concentrada no Rio Grande do Sul (70%), “que apresenta clima volátil e imprevisível”. Borges defendeu que é preciso cuidado com medidas como a de redução de tarifas de importação, “para que não se torne mais margem para produtores que queda de preços ao consumidor”. Também mencionou a possibilidade de reorientação do Plano Safra “para combinar uma política de preços mínimos produtos com alto peso no consumo doméstico”.

André Braz lembrou que os alimentos vêm pressionando o IPCA desde 2020. “De dezembro de 2019 para cá, os preços da alimentação a domicílio subiram 55%, enquanto o IPCA aumentou 33%. Se o IPCA indexa a maior parte dos salários, estes andaram mais devagar do que a inflação”, ilustrou, destacando ainda que esse peso é maior para as famílias de mais baixa renda, para as quais os alimentos têm maior peso no orçamento. A partir de dados do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), Braz indicou que o peso da alimentação no custo de vida de consumidores com renda entre 1 e 1,5 salário mínimo mensal passou de 18% em janeiro de 2018 para 22% em janeiro de 2025.

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