Estudo do FGV IBRE sobre o MEI ganha destaque na mídia. Recomendação é reformular, e não ampliar esse regime
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Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
A Carta do IBRE da revista Conjuntura Econômica de fevereiro foi destaque do jornal Valor Econômico nesta terça (7/2). Artigo do diretor do FGV IBRE Luiz Schymura e matéria com os pesquisadores do IBRE Fernando Veloso, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Janaína Feijó (ambos os links podem estar restritos a assinantes do jornal), repercutiram o detalhado levantamento realizado por Veloso e Barbosa sobre o regime de microempreendedor individual (MEI), apontando a falta de focalização desse regime e o importante impacto fiscal que este tem contratado quando os trabalhadores MEIS começarem a se aposentar, posto que os benefícios podem ultrapassar as contribuições acumuladas em mais de 80%, conforme cálculo dos pesquisadores. O alerta dos economistas do FGV IBRE direciona-se especialmente à tramitação do Projeto de Lei Complementar (PLP 108/2021), que amplia o limite de faturamento anual do MEI de R$ 81 mil para R$ 144,9 mil, com a possibilidade de se ter dois funcionários, com o que tais distorções do sistema só tenderiam a se ampliar. A recomendação dos especialistas do FGV IBRE é a de que não é momento de ampliação do regime, e sim de reformulação, para mitigar os desequilíbrios identificados.
Novos Registros no MEI e Total por Ano
Fonte: FGV IBRE.
Em seu texto, Schymura recorda que o regime entrou, que em vigor em 2009, prevê contribuição previdenciária de 5% do salário mínimo. Somada aos impostos cobrados (ICMS e outros), o custo mensal chega a R$ 71. Com isso, os participantes ganham direito a se aposentar com 1 salário mínimo e têm acesso aos demais benefícios da Previdência como auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário maternidade. Esse desenho, de fácil adesão e contribuição, tinha como objetivo inicial estimular a inclusão previdenciária de trabalhadores autônomos de baixa renda e a formalização de pequenos empreendimentos.
Com a evolução da adesão ao regime, entretanto – de 44,18 mil no primeiro ano a 14,8 milhões em 2022, com uma média anual de novos registros que ultrapassa 1,7 milhão nos últimos quatro anos –, emergiram características que fogem desse princípio balizador do sistema. O levantamento feito pelos pesquisadores do FGV IBRE reforça a ideia de que, ao invés de incentivar a formalização e a proteção de informais com mais dificuldade de inserção no mercado, o regime passou a servir também como canal de migração do trabalhador com carteira para um sistema cuja carga tributária é mais baixa – beneficiando inclusive o empregador.
Escolaridade dos empregados formais e informais (3º tri 2022)
Fonte: FGV IBRE.
Para esse levantamento, os pesquisadores consideraram os trabalhadores da Pnad que trabalham por conta própria, têm CNPJ e contribuem para a Previdência – que somavam cerca de 5 milhões no terceiro trimestre de 2022. A partir dessa base, eles identificaram, por exemplo, que a proporção de pessoas com ensino superior completo aderentes ao MEI é maior (31,5%) do que a dos conta-própria em geral (15,7%) e mesmo dos trabalhadores com carteira assinada (22,4%). O estudo também apontou que, no terceiro trimestre de 2022, a maior parte dos MEI (56,4%) recebia mais que 2 salários mínimos – a renda média mensal desse grupo era de R$ 3.873 –, também acima do rendimento médio do trabalho dos empregados com carteira assinada (32,1%, com renda média de R$ 2.650), bem como dos trabalhadores por conta própria (27,6%) e os sem carteira (15,6%).
Composição por Rendimento do Trabalho (3º tri 2022)
Fonte: FGV IBRE.
Outra evidência da perda de foco do sistema é observada quando se analisa a distribuição regional dos MEI. A maioria se encontra no Sudeste (51,6%) e Sul (24,6%), enquanto as regiões mais pobres em que o sistema mais poderia colaborar para uma melhora das condições dos trabalhadores, eles são minoria. No terceiro trimestre de 2022, o Nordeste, por exemplo, registra apenas 11,6% dos MEI – ainda prevalecendo, na região, o trabalhador informal, com 32% do total de informais do país.
Os pesquisadores também identificaram que a proporção de homens aderentes ao MEI é de 60%, acompanhando a tendência das outras categorias; e que a maioria (29,8%) se encontra na faixa entre 30-39 anos, seguida pelos trabalhadores acima de 50 anos, com 28,3% do total, e entre 40-49, com 26,8%.
Composição Etária (3º tri 2022)
Composição regional
Fonte: FGV IBRE.
Com essa fotografia exposta, os pesquisadores esperam esclarecer que o rombo previdenciário que o sistema contrata para adiante – com benefícios que poderão ultrapassar em 79,1% a 85,5% o valor das contribuições, dependendo da taxa de juro real considerada –, representa um custo muito alto para garantir a formalidade de trabalhadores, parte dos quais não são objeto inicial do programa. Para Veloso, a reformulação – e não ampliação – proposta teria de buscar, ao mesmo tempo, mitigar a inadimplência no sistema – em 2021, mais de 60% dos inscritos no MEI estavam inadimplentes com as contribuições ao INSS – e buscar um aumento de alíquota. Atualmente, os MEI adimplentes correspondem a 9,3% dos contribuintes do INSS.
Déficit atuarial do MEI, sob 3 cenários de taxas de juros reais
(considera apenas aposentadorias)
Fonte: FGV IBRE.
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