Em Foco
-
Postado por Conjuntura Econômica
A preocupação com o quadro fiscal dos Estados
Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro
Nunca se falou tanto no quadro fiscal brasileiro como nos últimos tempos. Com a pandemia da COVID-19 que, infelizmente, começa a ter, novamente, uma curva ascendente de casos, ainda que bem longe dos dramáticos períodos de 2020 e 2021, se liberou muito dinheiro para amparo a empresas, aos mais vulneráveis, a Estados e municípios, compra de vacinas entre outros.
Embora os resultados da dívida pública tenham melhorado, em grande parte pela contribuição da inflação, há uma enorme preocupação com o que vai ocorrer daqui para a frente, com a necessidade de se adequar políticas públicas ao caixa da União, sem fugir das regras básicas da responsabilidade fiscal. Ou seja: não gastar mais do que se tem.
Apesar dos recentes resultados fiscais positivos para o Governo, as discussões sobre a sustentabilidade desses resultados e a necessidade de uma revisão estrutural do arcabouço fiscal brasileiro vêm dominando o debate público e de especialistas sobre o tema.
Dentro desse complexo quadro, onde as previsões são de uma desaceleração do crescimento mundial, queda nos preços das commodities, inflação em alta e maior aperto monetário, que vão, necessariamente, impactar o Brasil, é importante, também, se debruçar sobre a situação fiscal de atores importantes, como os Estados e municípios.
Renê de Oliveira Garcia Junior, secretário estadual da Fazenda do Paraná e Tomaz Leal, assessor econômico da Secretaria, fazem uma análise minuciosa do que ocorreu com os esses entes federativos recentemente. E não escondem a apreensão quanto ao futuro próximo.
Em artigo publicado na revista Conjuntura Econômica deste mês, em circulação, Renê e Tomaz mostram que nos últimos dois anos esses entes observaram um cenário atípico que contribuiu positivamente para as suas finanças, mas que não devem ser encarados como frutos de alguma mudança estrutural.
Alguns pontos de destaque na análise dos dois economistas:
• Entre 2007 e 2020 é possível ver com clareza a tendência de queda do resultado primário relativo ao PIB, com um período de relativa estabilidade entre 2015 e meados de 2020. A partir do final de 2020, um movimento extraordinário eleva de maneira considerável o balanço entre receitas e despesas primárias desses entes, levando o superávit de uma média de 0,1% do PIB entre 2015 e 2019 para 1,4% em abril de 2022.
Estados e municípios – resultado primário
Em % do PIB, acumulado em 12 meses
Fonte: Banco Central. Elaboração própria.
• Esse movimento acompanha de perto a trajetória do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal fonte de receita dos estados e cuja arrecadação é repartida com municípios. À exceção do período recente, a tendência de perda de participação em relação ao PIB também é clara, como reflexo da perda de participação da Indústria e do Comércio Juntos, Indústria e Comércio compõe a principal base tributária do ICMS.
Arrecadação nominal de ICMS
Em % do PIB, acumulado em 12 meses
Fontes: Confaz, Banco Central e IBGE. Elaboração própria.
Participação de indústria + comércio no PIB
PIB a preços de 1995, acumulado em 12 meses
Fontes: Confaz, Banco Central e IBGE. Elaboração própria.
Para os autores, esse desempenho recente trata-se de um fenômeno exclusivo de preços impactando a arrecadação nominal, considerando que não houve aumento significativo de carga tributária, nem avanços reais nos principais setores que compõe a base tributária do ICMS.
Outros fatores que ajudaram a melhorar o quadro fiscal dos Estados e municípios
• A partir de 2021 houve significativa mudança no comportamento relativo dos preços da Indústria e do Comércio, com impactos positivos sobre as receitas de ICMS
• Aumento das transferências federais que cresceram 24,6% em termos reais em 2021, na comparação com 2019. Considerando apenas os sete primeiros meses do ano, em 2022 o avanço real em relação a 2019 foi de 29,3%. Entre 2015 e 2019, a média de crescimento real foi de apenas 1,9%.
• Diante destes fatores, os entes subnacionais apresentaram uma importante melhora do resultado primário, assim como conseguiram acumular caixa para fazer frente a obrigações futuras ou ampliar investimentos.
Em outro levantamento realizado pelos autores, é mostrado que houve uma significativa perda de arrecadação com a redução das alíquotas do ICMS para a energia e os combustíveis: houve uma perda real de 8,2% em setembro, em relação a agosto, ou R$ 10,3 bilhões nas unidades da Federação. Já os setores de combustíveis, energia elétrica e telecomunicações tiveram quedas reais de arrecadação de, respectivamente, 18,8%, 51,8% e 38,2%.
Arrecadação de ICMS à preços de set/2022 (IPCA)
Todas as unidades da Federação
Fonte: Confaz, Comsefaz e IBGE. Elaboração Própria.
Ver a íntegra do artigo na Conjuntura Econômica deste mês.
Também leia a entrevista de Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, secretária da Economia de Goiás, no Blog da Conjuntura Econômica.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.