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Postado por Conjuntura Econômica
Novas revisões puxam para cima o PIB deste ano
Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro
A melhora da economia tem levado a uma série de revisões para o crescimento do PIB este ano. Os bons resultados da indústria extrativa, aliados ao espraiamento do ótimo desempenho da agropecuária, especialmente no primeiro trimestre, para outros setores como transporte, armazenamento, além de revisões em setores como intermediação financeira, entre outros, aumentou a projeção de crescimento do PIB para 2023. Segundo economistas da equipe do Boletim Macro FGV IBRE, a expansão prevista é de 2,5%, com possibilidade de novas revisões.
No entanto, dado o cenário de expressiva desaceleração do investimento e com poucos ganhos de produtividade, os desafios para manter o crescimento robusto das atividades cíclicas são elevados, em que pese a projetada redução da taxa de juros nas próximas reuniões do Copom, sobretudo quando se considera a persistência do aperto monetário que se projeta para os EUA e a Europa.
No caso dos juros, largamente desejável por todos, menos para os que vivem dos resultados de aplicações financeiras, os chamados rentistas, o Banco Central iniciou o processo de redução da taxa Selic, os juros básicos da economia, em suas duas últimas reuniões.
Como menciona o Boletim na sua edição de setembro “sinais de início de ciclo de baixa de juros costumam gerar euforia. Em pouco tempo, os participantes de mercado formam expectativas de ritmo de queda mais acentuada dos juros. Na situação atual, logo se pensa em quedas de 75, ou 100 pontos, mais adiante”.
Mas qual a razão pela qual ainda há muita incerteza quanto ao aumento dos cortes de juros? Pelo simples fato de que expectativas no sentido mencionado prejudicariam, talvez até inviabilizariam, a condução da política monetária. Como a luta contra a inflação está longe de ter sido vencida, o BC não pode perder o controle sobre a sua política de juros. Outro ponto que merece ser mencionado, e pelo qual parece já existir consenso, é a questão fiscal, longe ainda de estar equacionada ou sendo encaminhada para isso, o que afeta as expectativas futuras de inflação e o risco País, variável-chave para determinar a trajetória do câmbio.
Mas, apesar de tudo, mesmo com um quadro desafiador tanto aqui como no exterior, a economia este ano deve crescer mais do que se previa anteriormente.
Veja: Sorte, impulso fiscal ou arrumação macroeconômica?
É com esse pano de fundo que o Boletim Macro traz os seguintes destaques:
Atividade econômica:
• Os dados divulgados pelo IBGE para o segundo trimestre revelam um quadro mais favorável do que o esperado para o setor de serviços, em particular para transportes e outros serviços, e para a indústria extrativa. Os dados do começo do trimestre indicam que a indústria de transformação permanece com dificuldades, com contração na margem. O setor de serviços teve seu quarto crescimento consecutivo e o varejo ampliado apresentou resultado levemente negativo em julho, influenciado pelo fim dos subsídios concedidos para a compra de automóveis. O cenário que se desenha é de contribuição levemente negativa dos setores cíclicos do PIB no terceiro e quarto trimestres, após grande surpresa positiva no segundo trimestre. E, pelo lado dos setores menos sensíveis ao ciclo econômico, a contribuição vindoura também deve ser negativa.
Expectativas de empresários e consumidores:
• Os índices de confiança do FGV IBRE subiram em agosto, tanto para empresários quanto para consumidores. O lado empresarial avança com ritmo mais lento, com a nova queda da confiança industrial chamando a atenção. Pelo lado dos consumidores, a quarta alta consecutiva tem sido mais disseminada entre as faixas de renda, mas ainda com grande distância entre os indicadores de expectativas e de situação presente. A prévia de setembro também deixa um sinal de alerta, com possível queda nos dois índices.
Índices de Confiança Empresarial e dos Consumidores
(Com ajuste sazonal, em pontos – Dados prévios de agosto)
Fonte: FGV IBRE.
Mercado de trabalho:
• A edição de julho de 2023 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua revelou que a taxa de desemprego no trimestre móvel fechou em 7,9%, alinhada às projeções do FGV IBRE. O nível de ocupação aumentou de 56,6% para 56,8% (da população em idade ativa) entre os dois últimos trimestres móveis, ainda abaixo do pico recente de 57,4% registrado em 2022. Paralelamente, o Caged mostrou que, em julho de 2023, foram criadas 142,7 mil vagas de trabalho, pouco acima das 121 mil projetadas pelo FGV IBRE. O saldo com ajuste sazonal caiu de 93,6 mil para 90,7 mil, indicando desaceleração no crescimento do emprego. Para agosto, espera-se a criação de 69,8 mil vagas, em termos ajustados sazonalmente, sinalizando nova desaceleração.
Inflação:
• Os preços dos combustíveis têm impacto direto sobre a renda dos consumidores e os custos de diversas indústrias. Enquanto a gasolina afeta direta e significativamente o IPCA, o diesel exerce influência indireta, afetando os custos da atividade produtiva. Além disso, outros produtos derivados do petróleo podem ter seus preços comprometidos, mesmo que ainda não tenham demonstrado aumentos significativos, de acordo com o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA). Essa estabilidade não deve perdurar diante do aumento dos preços do petróleo. No cenário internacional, o preço do óleo está em ascensão, devido aos cortes na oferta promovidos pela Arábia Saudita e a Rússia, bem como eventos climáticos na Líbia, fatores que podem impulsionar os preços dos derivados e impactar mais a inflação. No Brasil, os preços da gasolina e do diesel estão defasados, o que pode exigir futuros aumentos de preços, fazendo com que o IPCA fique não só acima da meta de inflação, como também fora do intervalo de tolerância.
Política monetária:
• A decisão do Copom do começo de agosto nada teve de “dovish”. Ao iniciar o ciclo de baixa da taxa Selic com queda de 50 pontos, e sinalizar a manutenção desse ritmo para “as próximas reuniões”, o BC foi conservador. Definiu sua estratégia de maneira a ter um mínimo de controle sobre a trajetória futura dos juros. Daqui por diante, muito mais relevante do que discutir se o ritmo de queda dos juros será ou não acelerado (pouquíssimo provável que seja), é procurar entender até que ponto o BC levará o ciclo de baixa. Duas considerações parecem sugerir que o ciclo será interrompido mais cedo do que se imagina: a inflação projetada para o horizonte relevante encontra-se acima da meta de 3,0%, e as incertezas na área fiscal não parecem indicar rápida reversão desse quadro. Difícil dar prosseguimento a um ciclo de baixa de juros quando as inflações projetadas se mostram superiores à meta. São boas as chances de a queda da Selic ser interrompida quando ela chegar em 10,0%, ou mesmo um pouco antes.
Política fiscal:
• A Proposta de Lei Orçamentária Anual de 2024 foi encaminhada com o orçamento equilibrado e previsão de arrecadação e gastos de 19,2% do PIB. Isso significa uma elevação na arrecadação, líquida de transferências para Estados e municípios, de 1,4 p.p. do PIB, um ajuste fiscal significativo. Existem dois tipos de riscos nas medidas do governo. O primeiro risco está relacionado às mudanças do CARF e da transação tributária. Espera-se arrecadar R$ 96,8 bilhões, um montante muito expressivo; o grau de confiança nessas estimativas é muito baixo. O segundo risco está na tramitação das demais medidas para o aumento da arrecadação, que pode ser frustrada. Ainda existem outros riscos fiscais, com despesas estimadas de forma otimista, como a da Previdência Social. Em função dessas incertezas, muito se discute a mudança da meta fiscal. Mas parece cedo para abordar esse assunto, tendo em vista que antecipar a discussão inviabiliza o pacote de Haddad e, portanto, torna-se absolutamente contraproducente.
Setor externo:
• Com uma conjuntura peculiar e positiva na balança comercial brasileira, esperamos déficit em conta corrente de somente 1,7% do PIB em 2023. Estimamos elevação do déficit para 2,3% em 2024, patamar ainda baixo e que não constituirá vetor de pressão sobre a economia.
Internacional:
• Parece cada vez mais provável que, daqui por diante, na condução da política de juros, o Fed procurará evitar ser agressivo. Isso não significa, porém, que o recente movimento de alta quase sistemática dos juros de dez anos nos EUA, observado no decorrer dos últimos meses, será necessariamente interrompido. A razão é que o fato de a luta contra a inflação estar longe de concluída obrigará o Fed a manter apertada a política monetária. E isso poderá acarretar novas revisões das expectativas dos participantes de mercado sobre o momento em que o Fed iniciará o ciclo de queda dos juros. Na medida em que isso aconteça, operações de arbitragem financeira poderão dar continuidade à alta dos juros de dez anos.
Leia a integra do Boletim Macro FGV IBRE.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.