Comércio exterior em 2023: saldos menores e uma agenda a reforçar
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Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
No ano passado, a balança comercial brasileira fechou com superávit US$ 360 milhões acima ao de 2021, em US$ 61,76 bilhões. Colaborou para esse resultado um aumento das vendas à China nos dois últimos meses do ano e, principalmente, o aumento de preços dos produtos exportados (13,7%), proporção três vezes superior à variação do índice de volume embarcado em 2022 (4,4%). O aumento do preço dos produtos importados, entretanto, superou o das exportações, com os termos de troca recuando 6,2% em relação a 2021.
O Indicador de Comércio Exterior (Icomex) do FGV IBRE divulgado nesta segunda-feira (16/1) mostra que, do ponto de vista setorial, foi a agropecuária quem segurou as pontas para o saldo positivo em 2022. O saldo comercial do setor somou US$ 65,8 bilhões no ano passado, US$ 19,3 bilhões acima do registrado em 2021. A indústria extrativa teve queda de US$ 17,5 bi no superávit em relação a 2021, puxada principalmente pela retração de 35,5% nas vendas de minério de ferro em relação ao ano anterior. A indústria da transformação, por sua vez, piorou seu déficit em US$ 3,2 bilhões na mesma comparação, para US$ 48,5 bilhões.
Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE, coordenadora do Icomex, afirma que para 2023 a tendência é de saldos comerciais menores. Além de uma condição climática melhor para a produção agrícola, e a expectativa de não haver impacto adicional do conflito da Ucrânia, com a perspectiva de menor crescimento mundial reforçada recentemente pelos Barômetros Globais do FGV IBRE e pelas projeções do Banco Mundial espera-se um cenário mais acomodado para preços desses produtos. “Para o Brasil, a grande questão é como a economia chinesa evoluirá este ano”, diz, lembrando da pouca clareza sobre a evolução do quadro sanitário depois do fim da política de Covid-zero, somada aos já importantes desafios estruturais que o país vem sinalizando para recompor sua capacidade de crescimento. “A principal incógnita é o minério de ferro (cujas exportações para a China caíram 37% em 2022 em relação a 2021), se os planos de investimento no pacote de estímulos à economia do governo chinês contarão com obras que reaqueçam a demanda por esse produto”, afirma. Como Lia ressaltou em conversa anterior para o Blog, sequer o salto nas exportações de carne bovina à China registrado no final do ano - que levou o produto ao quarto lugar no ranking dos mais vendidos ao país - podem ser considerados um farol de aumento de demanda, já que o resultado também foi influenciado pelo mau desempenho em 2021, devido ao embargo imposto pelo governo chinês à carne bovina brasileira de setembro a dezembro desse ano.
Variação (%) das exportações em 2022 sobre 2021, por tipo de indústria
Fonte: FGV IBRE. Base Icomex. Dados Min. Economia.
Variação (%) das importações em 2022 sobre 2021, por tipo de indústria
Fonte: FGV IBRE. Base Icomex. Dados Min. Economia.
Em 2022, o superávit comercial brasileiro com a China recuou US$ 11,3 bilhões, e o país perdeu 2 pontos percentuais de participação nas exportações brasileiras, ainda que continue em liderança folgada. Parte dessa queda, lembra Lia, foi compensada pelo crescimento em outros mercados, como de exportações de petróleo e milho para a União Europeia - cuja evolução da crise energética e seu efeito sobre a economia deverá influenciar nesse dinamismo. No caso dos Estados Unidos, segundo maior parceiro comercial do Brasil, 2022 foi de aumento de déficit comercial. Na América Latina, apesar de a Argentina, principal destino brasileiro, ter ampliado em 29% suas importações do Brasil - onde se destacam as operações intrafirma do setor automobilístico - , fechou o ano com recuo nas compras, e em 2023 não deverá repetir o mesmo desempenho, diz Lia, lembrando que, além de crise econômica, o país terá eleições presidenciais.
Saldos comerciais, em R$ bilhões
Elaboração FGV IBRE. Base Icomes. Fonte Min Economia.
Em um contexto no qual o aumento das exportações terão que se dar muito mais por volume que por preço, mesmo com um mundo em desaceleração, a pesquisadora reforça que será difícil contar com saldos comerciais maiores que em 2022. Ainda assim, Lia ressalta a importância de o governo se empenhar na agenda de política comercial que amplie a competitividade dos produtos brasileiros. Para isso, recomenda que se persevere em medidas de desburocratização, e se invista no Mercosul, especialmente em uma agenda que elimine entraves que foram criados ao longo do tempo no âmbito do bloco. “Se fecharmos o acordo Mercosul-União Europeia, certamente haverá maior pressão para se definir melhor essas exceções que existem dentro do Mercosul, seja em relação à tarifa externa comum, seja em relação ao comércio interno, para que o bloco se apresente como uma união aduaneira de fato”, diz. Lia reafirma a importância do avanço da integração sul-americana - que já foi apontada pelo presidente Lula como uma das prioridades do governo -, olhando também do ponto de vista do comércio. “Os acordos comerciais já existem. Mas é preciso olhar quais obstáculos ainda existem e avançar na liberalização na área de serviços”, cita.
Em seus atos públicos, Geraldo Alckmin, vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, tem reiterado o interesse em impulsionar as exportações industriais. Ontem (16/1), defendeu um programa de exportações, citando a necessidade de recuperar participações no mercado internacional perdidas para a China. Com a reestruturação de ministérios do novo governo, o MDIC volta a abrigar a Câmara de Comércio Exterior (Camex) e a Agência de Promoção às Exportações (Apex), e agora tem sob seu guarda-chuva o BNDES.
Principais produtos exportados em 2022, por principais destinos
(em R$ milhões)
Fonte: Secex/ Min da Economia.
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