OCDE reforça efeito da crise energética para desaceleração do PIB mundial, via inflação

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Esta semana a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) divulgou relatório em que reforça as projeções de desaceleração da economia mundial para 2023. O novo Outlook aponta que o PIB global sairá de uma expansão de 3,1% este ano para 2,2% no ano que vem, com leve recuperação em 2024, para 2,7%. Para Estados Unidos e área do euro as estimativas para 2023 são de crescimento de 0,5%. Para o Brasil, a Organização projeta alta de 1,2%, acima da estimada pelo mercado. O FGV IBRE aponta alta de 0,2%, conforme aponta o Boletim Macro de novembro.

A OCDE ressalta a preocupação com as pressões inflacionárias no mundo, especialmente as provocadas pela crise de fornecimento de energia na Europa. Ainda que o aperto da política monetária tenda a contrair a demanda, colaborando para controlar o efeito da crise sobre os preços, a perspectiva é de que a inflação na região feche 2023 em 6,8% ao ano. Em seu relatório, a instituição destaca que a influência de uma carência prolongada de gás na Europa no PIB dos países europeus da OCDE é de perda de até 1,4 ponto porcentual (p.p.) em 2023 e de 0,7 p.p. Em 2024. Para o mundo, o impacto seria, respectivamente, de 0,5 p.p. e 0,2 p.p. O relatório também ressalta a forte correlação que pressões de preço de energia tiveram no ciclo econômico nos países da OCDE desde a década de 1970. Com exceção da recessão provocada pela pandemia, as grandes recessões ocorridas no grupo ocorreram quando os gastos com energéticos chegaram ou superaram 13% do PIB - em 1974, 1981-82 e 2008.

OCDE reforça projeção de desaceleração mundial
(crescimento real do PIB, em %)


Fonte: OCDE.

A atual situação da Europa conta com o agravante de, apesar de necessitar uma política monetária contracionista para frear a inflação, o Banco Central Europeu se vê limitado pelos riscos que essa alta possa trazer para o financiamento da dívida de países com economia mais vulnerável, como a Itália, já que, sem poder fazer seu ajuste via moeda, acaba tendo o ônus nos títulos da dívida. Um desequilíbrio forte nesse campo, como apontado na Conjuntura Econômica de setembro (leia a matéria de capa) por José Julio Senna, chefe do Centro de Política Monetária do FGV IBRE, poderia colocar a zona do euro em risco de dissolução.

Pressão inflacionária nos países desenvolvidos 
(%)


Fonte: OCDE.

No documento, a instituição ressalta o aumento da difusão da inflação mundial em relação ao ano passado. Característica que, no Brasil, também foi destacada no Boletim Macro. Em outubro, essa disseminação era de 68% no Brasil, 6 pontos percentuais acima do verificado em setembro. O economista do IBRE André Braz também destaca no Boletim que a inflação de preços livres em 12 meses até outubro é de 8,1%, acima do IPCA. Com a perspectiva de novas altas do IPC em novembro e dezembro - depois da quebra, em outubro, do ciclo de três meses com resultado negativo puxado especialmente pela mudança de alíquota do ICMS de combustíveis e energia - o IPCA deverá fechar o ano com alta entre 5,5% e 5,7%, diz Braz.

No capítulo sobre o Brasil, um dos destaques do documento da OCDE é a necessidade de revisão do arcabouço fiscal, apontando a perda de eficiência do atual teto para ancorar as expectativas quanto à evolução do gasto público - especialmente diante de uma rigidez orçamentária que afeta 92% do orçamento federal. Tal reordenamento ainda se espera ver sinalizado junto à  busca do waiver fiscal pelo governo de transição. Como apontou o Boletim Macro, item também importante para combater a inflação em 2023, ao reduzir a incerteza do mercado e mitigar o aumento do risco país, que acarreta depreciação cambial e contamina o cenário de preços. Com isso, a perspectiva da OCDE de corte na taxa de juros (Selic) a partir do segundo semestre de 2023 - que já é questionada por parte dos analistas - também se veria ainda mais difícil de concretizar.

Inflação se torna mais disseminada
(%) de produtos da cesta que registram uma inflação anualizada superior a 6%


Fonte: OECD Economic Outlook, Volume 2022 Issue 2 - © OECD 2022.

O crescimento econômico global em 2023, indica a Organização, dependerá do desempenho das principais economias emergentes da Ásia, o que de certa maneira reforça a tendência de desaceleração. Tal como apontado na Conjuntura Econômica de junho (leia Sem fiel da balança), e reforçado no último Boletim Macro, em análise do pesquisador associado do FGV IBRE Livio Ribeiro, diferentemente de outras acelerações mundiais observadas nas últimas décadas, desta vez a China não demonstra vigor econômico para resgatar o PIB global. Além de ter uma estratégia de contenção de focos de Covid-19 mais impactante para a economia - estima-se que a política de Covid zero prevaleça até que o país consiga diversificar a tecnologia da vacina usada na imunização da população, o que não deve se completar até ao menos meados do ano que vem - as medidas de estímulo operadas pelo governo se concentram nas empresas, o que não tem ajudado a dinamizar o consumo das famílias, onde está o problema da economia chinesa hoje.

Em países da OCDE, períodos de alto preço de energia costumam estar associados a recessões 
%do PIB

Fonte: OECD Economic Outlook, Volume 2022 Issue 2 - © OECD 2022.

 


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