Preocupação com escassez de mão de obra qualificada não é exclusiva do setor da construção, apontam Sondagens do IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Nesta segunda-feira (2/12), matéria do Jornal Nacional mostrou que o número de trabalhadores com diploma de curso superior praticamente dobrou no mercado de trabalho em 12 anos, para mais de 24 milhões, de acordo ao IBGE. A taxa de desemprego desse grupo é a mais baixa já registrada, pouco acima dos 3%, mas um em cada três trabalhadores tem formação acima da exigida na função que ocupa.

Pesquisa divulgada no mesmo dia pelo FGV IBRE mostra outro lado dessa moeda: a preocupação com escassez de mão de obra qualificada, fator que há pelo menos um ano vem crescendo em assinalações como fator limitativo para os negócios da construção, tem se estendido a outras atividades. Mais de 57% das empresas dos setores de comércio, serviços, indústria e construção consultadas pela equipe de Sondagens do FGV IBRE indicaram dificuldade em contratar ou reter colaboradores. Construção segue na frente, com 82,4%, seguida pelo varejo ampliado (77,3%), indústria (76,8%) e serviços (76,5%).

Qual a principal dificuldade enfrentada por sua empresa?


Fonte: FGV IBRE.

Dessas empresas que relataram dificuldades, 64,9% afirmaram ter problemas em encontrar mão de obra qualificada; 18,5% citaram mão de obra não qualificada, e 9,4% afirmaram que o problema é bancar os salários demandados pelo mercado. Esse último fato é citado principalmente por empresários do setor de serviços, com 10,9% de respostas.

“Ficamos surpresos com o grau de disseminação dessa preocupação entre os setores”, afirma Rodolpho Tobler, coordenador das Sondagens Empresariais e de Indicadores de Mercado de Trabalho da Superintendência Adjunta para Ciclos Econômicos (FGV IBRE). Ele conta que é a primeira vez que esse quesito especial foi aplicado para todos setores analisados nas Sondagens. “Vínhamos observando o aumento das menções à mão de obra como fator limitativo no caso da construção e em serviços, e vendo a taxa de desemprego alcançar mínimos históricos, identificamos que valeria a pena ampliar essa sondagem.”

Qual estratégia sua empresa vem adotando para superar as dificuldades de contratação/manutenção da mão de obra?


Fonte: FGV IBRE.

Tobler afirma que o resultado observado – com alta participação do comércio, por exemplo – sugere que o perfil buscado pelas empresas não necessariamente se refere a uma superqualificação. “Muitas vezes, a necessidade daquele negócio está mais relacionada a algum tipo de treinamento específico”, diz. Tobler comenta que construção e comércio, que lideram as assinalações de mão de obra como fator limitativo, são atividades que em geral registram maior nível de rotatividade de mão de obra, o que torna a aquisição desse capital humano ainda mais complexa.

Nessa sondagem especial, também se buscou identificar quais os principais impactos e soluções que as empresas têm buscado para mitigar a falta de trabalhadores. “O que percebemos é que as empresas tendem primeiramente a buscar uma solução interna”, diz Tobler. No agregado das respostas, a alternativa mais citada é a de investir em capacitação interna, com 44,6%. Na indústria, esse tipo de iniciativa alcança 56,2% de assinalações. Realocar trabalhadores e mudar processos para reduzir a dependência de mão de obra vêm na sequência também estão entre as estratégias mais citadas, respectivamente, com 20,4% e 18,8% o agregado dos setores.  

Como os problemas de contratação e/ou manutenção de mão de obra enfrentados pela empresa vêm impactando a entrega de seus produtos/serviços?


Fonte: FGV IBRE.

Quanto a como os problemas com contratação e/ou manutenção de mão de obra tem impactado a entrega de produtos e serviços, menos da metade do agregado das empresas (47,7%) dizem ainda não terem sido afetadas. As exceções são a indústria, segmento em que 60,3% dizem já terem sido afetados, e o varejo ampliado, com 52,4%. Do total dos setores, 17,5% afirmam estar atrasando entregas, e 21,5% dizem que estão aumentando o número de horas trabalhadas para atender à demanda. Novamente, o setor de serviços aponta a necessidade de revisão de preços, com o maior percentual de assinalações (22,7%). “Vale lembrar que o setor de serviços costuma registrar uma inflação mais resiliente, e aqui observamos a tendência de que a dificuldade com a contratação/manutenção de trabalhadores seja repassada ao preço final”, diz Tobler, reforçando o efeito do mercado aquecido nos preços.

O economista do FGV IBRE também destaca o descolamento da construção nas assinalações sobre a necessidade de rejeitar novos clientes/ contratos em função dos problemas de contratação de trabalhadores: 18,8%, contra 8,4% no agregado das empresas consultadas, reiterando a pressão da escassez de mão de obra como limitativo dessa atividade, que desde o ano passado vem sendo apontada por Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção do FGV IBRE (leia mais).

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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