A notícia boa, e a preocupante, que os números da balança comercial brasileira mostram

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

As projeções para o superávit de balança comercial brasileira em 2023 são excelentes. O Boletim Macro do FGV IBRE de outubro projeta um saldo entre US$ 90 bilhões e US$ 92,5 bilhões, número próximo ao da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Fazenda, que na revisão mais recente elevou seu número de US$ 84,7 bilhões para US$ 93 bilhões.

Em linhas gerais, essa melhora vai ao encontro de uma perspectiva mais positiva para o volume do comércio mundial como um todo. A Organização Mundial de Comércio também reviu suas estimativas, que em abril eram de uma desaceleração de 1,7% no volume dessas transações, para alta de 0,8% em 2023.

Em artigo que sairá na Conjuntura Econômica de novembro, Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE, destaca que há mais de 20 anos, com raras exceções, o setor externo tem contribuído para a estabilidade macroeconômica do país, colaborando para o país engordar o estoque de reservas internacionais. Tal como apontou Manoel Pires, pesquisador do FGV IBRE, ao Blog (leia aqui), isso tem colaborado para sanar o trauma de crises externas do passado.

Em seu texto, Lia não esconde, entretanto, que esse é um cenário de luzes e sombras. Esses bons resultados do país não elevam a posição do país como exportador mundial. A pesquisadora mostra que desde 1980 a participação do Brasil no comércio global gira em torno de 1,5%, enquanto China ampliou sua fatia de 1,2% para 14,2% entre 1983 e 2022. México e Índia, exemplos menos extremos e talvez mais comparáveis com o Brasil, ampliaram sua participação, respectivamente, de 1,4% para 2,4% e de 0,5% para 1,9%.

Participação (%) nas exportações mundiais


Fonte: WTO Stats.

Além disso, mostra Lia, os ganhos do Brasil no comércio mundial têm ficado cada vez mais concentrados no setor agrícola, de alimentos e no de combustíveis e minerais. Ela diz:

“A participação das exportações de produtos agrícolas brasileiros nas exportações mundiais aumentou de 2,8% em 2000 para 6,4%, em 2022. O país é o 3º maior exportador de produtos agrícolas depois da União Europeia e os Estados Unidos. O mesmo resultado se repete nas exportações de alimentos, a participação brasileira passou de 3,0% para 6,6% entre 2000 e 2022 e o país é o terceiro maior exportador. No caso dos combustíveis e minerais, o país não está na lista dos 10 principais exportadores, pois a OMC agrega todos os produtos desse setor. Destaca-se que segundo o Instituto Brasileiro de Petróleo o Brasil foi o 9º maior exportador de petróleo e derivados do mundo em 2022. No caso do minério de ferro, o Brasil é o segundo depois da Austrália.”

Em contrapartida, nas exportações de manufaturas, a participação do Brasil, que nunca superou 1% do total mundial, caiu de 0,8% para 0,5% entre 2008 e 2019 na série histórica da OMC. Em praticamente todos os setores o Brasil perdeu participação. Só se encontra entre os dez maiores exportadores em produtos siderúrgicos, na nona posição, graças a uma extrema concentração da produção, já que tampouco sua parcela alcança 1% do total.

Lia destaca que não só a participação média das exportações de commodities cresceu – de 44% no período de 2002 a 2008, subiu para 58% entre 2009/2019 e foi de 68% entre 2020/ janeiro a setembro de 2023 – como se concentrou em menos produtos. “Em 2002, soja em grão, minério de ferro e petróleo bruto explicavam 31% das exportações, em 2012, 49% e 2023 (janeiro a setembro), 54%.”

Em resumo, enquanto a média da participação das exportações da agropecuária no total exportada pelo Brasil subiu de 8,5% no período de 2002 a 2008 para 21,1% de 2020 ao acumulado no ano até setembro de 2023, a participação da extrativa passou de 11,4%, para 24,2%, e a da transformação caiu de 80% para 55% nesses mesmos períodos.

Lia mostra que, no comércio mundial, a participação das manufaturas fica ao redor de 65% a 68%. “Em 2022 foi de 63% devido ao aumento em valor dos preços de energia”, destaca. “Em termos de volume, a média anual de crescimento das exportações agrícolas foi de 2,2%, dos combustíveis e minerais de 1,2% e das manufaturas de 2,8%.”

Isso ilustra por que, apesar de ser um exportador relevante, o Brasil não consegue melhorar sua posição entre os principais exportadores.

Mas essa questão é relevante?

Lia destaca que a agenda de segurança alimentar e energética garante ao Brasil um lugar de destaque no comércio global, mesmo não estando entre os principais do ranking. “No entanto, ao não ter uma participação maior nas exportações de manufaturas isso leva a uma maior pressão sobre o setor agropecuário e da indústria extrativa. Portanto, sobre os principais mercados compradores, que no caso é a China”, alerta. “Além disso, seriam setores que geram menos empregos diretos que indústria de transformação e os serviços.”

A íntegra do artigo você lerá, nos próximos dias, na Conjuntura Econômica de novembro.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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