“A longo prazo, gosto da ideia de um mercado de emissão de dívida pública subnacional”, diz Manoel Pires
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Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
O projeto de lei sobre a renegociação de dívida dos estados apresentado pelo presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) deverá ser votado nos próximos meses. No momento, o governo negocia uma limitação no abatimento dos juros – que hoje podem chegar a 4% ao ano – previsto no projeto, através da federalização de ativos (até 2%), investimentos dos estados em infraestrutura, educação e segurança (1%), e na aplicação em um fundo de equalização que atenderia a todos os estados (1%).
Ao analisar a proposta em artigo para o Boletim Macro do FGV IBRE de julho, Manoel Pires, coordenador do Centro de Política Fiscal e Orçamento (CPFO) do IBRE destacou o desequilíbrio desta em favor dos estados, bem como a dificuldade em se cravar um plano de recuperação que de fato resulte em maior equilíbrio fiscal desses entes, lembrando que a renegociação das dívidas é um tema antigo do federalismo fiscal que por várias vezes demandou rodadas de negociação política. “A questão das dívidas estaduais é um grande problema político. A União possui posição credora com estados que se colocam como oposição e que têm se comportado de forma muito explícita de não querer pagar. Além disso, a participação do STF ao autorizar a suspensão dos pagamentos criou um risco moral muito grande”, afirmou, em breve conversa para o Blog, destacando que é preciso fazer um grande acordo político de se respeitar o que vier a ser pactuado.
Após esse acordo, Pires considera que haverá espaço para uma discussão mais técnica que, em sua opinião, tem de levar em conta dois pontos. “O primeiro é que a dívida ficou muito difícil de ser honrada nos termos atuais em alguns casos particulares porque o acúmulo ficou muito grande. Então, algum perdão parcial poderá ser necessário”, afirma. O segundo ponto destacado por Pires é de que o período em que o último acordo de recuperação dos estados funcionou foi marcado por grande crescimento de receita dos Estados, o que facilitou administrar o conflito político dentro do orçamento. “Então, alguma compatibilização entre receitas e despesas dos Estados para abrir espaço fiscal e encaixar o encargo das dívidas deve ocorrer”, diz. “A longo prazo, gosto de ideia de aumentar autonomia federativa e organizar um mercado de emissão de dívida pública subnacional, reduzindo a participação da União no financiamento dos entes públicos”, afirma Pires, lembrando, entretanto, que essa não é uma ideia amadurecida. “Essa institucionalidade precisa ser desenvolvida, o que leva tempo.”
Sobre a recente contenção de R$ 15 bilhões de despesas anunciadas pelo governo para cumprir a meta fiscal, Pires comenta que ela foi maior na saúde porque foi onde o gasto mais cresceu em função do crescimento da receita, apontando que na educação, que sofreu o segundo maior corte, o impacto deve ser mais significativo. “Na sequência vêm os ministérios que se relacionam um pouco mais com investimento, e isso é ruim porque já se investe muito pouco”, diz, ressaltando que o governo tem tentado algumas medidas em despesas obrigatórias para tentar melhorar a composição de despesa e preservar investimentos. Pires reconhece que uma possível nova rodada de contenções apresentará grande dificuldade, diante do baixo patamar em que já se encontram as despesas discricionárias, além do fato de a execução da despesa no primeiro semestre ter sido bastante acelerada. “A base contingenciável, atualmente, é pequena. O problema é que para cumprir a meta, muito provavelmente, o governo terá que ampliar o contingenciamento”, diz. “Uma medida adotada foi racionar as despesas discricionárias, definindo o que pode ser gasto até setembro, e bloqueando o restante. Isso deve melhorar a controle da despesa do governo, mas abre espaço na margem.”
Sobre a novidade prevista no Orçamento de 2025, de prever os gastos públicos do ano seguinte (2026), Pires considera que é uma medida que colabora para a transparência nos gastos públicos, mas não acha que é o caminho para aprimorar o planejamento orçamentário. “Já existem outros documentos fiscais que fazem isso. O Tesouro produz um documento muito bom com projeções fiscais e a própria LDO também faz isso.”
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