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Entrevistas 18 out 2023
“Hoje o Brasil tem uma janela de oportunidade como a que se abriu na metade dos anos 1970”
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Postado por Conjuntura Econômica
Venilton Tadini, presidente-executivo da Abdib
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
A revista Conjuntura Econômica de outubro (acesso gratuito aqui) tratou das perspectivas de ampliação do crescimento potencial do Brasil, para a qual o investimento é chave. Venilton Tadini, presidente-executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), avaliou na matéria as perspectivas no campo da infraestrutura, demonstrando otimismo com a direção que o governo federal tem dado para impulsionar a ampliação de projetos e desembolsos. Aqui, publicamos mais detalhes dessa conversa. Confira:
Um dos pontos de preocupação para impulsionar o PIB potencial brasileiro é a baixa taxa de investimento. No campo da infraestrutura, qual sua perspectiva de médio prazo?
Na Abdib, sempre buscamos incentivar os mecanismos de regulação para a atração do investimento privado. Apoiamos o Marco Legal do Saneamento, o do Gás, estávamos trabalhando na mudança da regulação de PPPs e concessões com o PL 7063 (que prevê tipos simplificados de concessão, para projetos de menor valor e rito mais rápido e a concessão conjunta de serviços conexos). Colaboramos em uma série de iniciativas para impulsionar essa relação entre o investimento público e o privado, mas também nos preocupamos com a queda dos desembolsos públicos. No caso da infraestrutura, a participação do investimento público caiu de 40% do total em 2014 – quando houve um pico de investimentos, marcando R$ 219 bilhões – para 18% em 2022, quando esse investimento somou R$ 172 bilhões, com um ligeiro aumento em relação aos anos anteriores (de 2017 a 2021, a média foi de R$ 150 bilhões – todos valores constantes de 2022). Com o teto de gastos, sabemos que a principal variável de ajuste foi o investimento público, e o resultado foi esse. Se ainda tivéssemos ampliado o montante investido, esses 18% poderiam representar um valor absoluto relativamente interessante. Mas não foi isso que aconteceu.
Hoje estou mais otimista com as perspectivas que temos. Vemos, por exemplo, uma dotação orçamentária para os investimentos públicos do PAC (para 2024, o projeto de lei orçamentária prevê R$ 69,7 bilhões em investimento, dos quais R$ 61,7 bi são para o novo PAC), com o programa dentro das regras do novo arcabouço fiscal. Além disso, temos o Tesouro Nacional preocupado com a garantia de financiamento de projetos de PPP por entes subnacionais, visando a ampliar o limite (de 5% da receita corrente líquida) para operações de crédito com garantia da União quando se tratem de recursos para parcerias público-privadas (PPPs); e o BNDES direcionado não apenas para a estruturação de projetos, mas também no financiamento.
Desde os PACs anteriores, vivemos uma curva de aprendizado importante obtida com o Programa de Parcerias de Investimento (PPI) que tem sido respeitada – há atenção com taxa de retorno dos projetos, sua estruturação, por exemplo. E avanços também na atuação dos órgãos de fiscalização e controle, bem como das agências reguladoras. Temos hoje uma estrutura institucional diferente, mas não podemos esquecer a importância da participação do investimento público.
A preocupação com o equilíbrio fiscal, entretanto, ainda é um tema.
O mercado sempre acha melhor ter superávit primário, mesmo com investimento próximo de zero. Basta ver a queda do orçamento do DNIT para cuidar da malha rodoviária nos últimos anos. Em 2014, os investimentos da autarquia foram de R$ 22,3 bilhões (a preços de 2021); em 2021, somaram R$ 6,9 bi. É uma catástrofe. Avaliação realizada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) mostra que, em 2022, 66% dos 110 mil quilômetros da malha rodoviária brasileira foram classificados como “regular, ruim ou péssimo”. Precisamos reverter esse quadro.
Acho que o efeito dinâmico do investimento faz parte do capital físico, envolve o aumento do potencial de crescimento futuro com mais competividade, o efeito multiplicador de renda, com geração de empregos. Mas os ortodoxos não acreditam nisso. Para eles, investimento e gasto corrente é a mesma coisa.
Quais desafios identifica nesse novo contexto para o investimento em infraestrutura?
Estou otimista do ponto de vista da infraestrutura, mas também quanto ao investimento geral, porque desde o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND, 1975-79), é a primeira vez que vejo um programa de investimento atrelado a uma estratégia de desenvolvimento. De fato, é uma janela de oportunidade como a que se abriu na metade dos anos 1970. Naquele momento, o país investiu na ampliação de projetos siderúrgicos, teve o Programa Nacional do Álcool (Proalcool), no campo dos biocombustíveis. Foi uma concentração de investimentos importantíssima. Tivemos uma crise da dívida, um segundo choque do petróleo quando toda a nossa dívida externa praticamente estava em juros flutuantes. Mas o que ajudou o Brasil a sair dessa foram os superávits gerados pela exportação do setor siderúrgico. Além disos, no campo das contas externas, hoje temos um cenário completamente diferente. E vemos que a estratégia do governo está alinhada com a agenda mundial transição energética, da descarbonização da indústria, da neoindustrialização (leia mais na Conjuntura Econômica de setembro). São prioridades que também estão na agenda dos Estados Unidos, Europa e a Ásia, todos se orientando para essa questão da transição energética, vinculada também ao processo de reestruturação das cadeias globais de valor. E todos os países desenvolvidos têm claro o papel indutor do Estado nesse processo.
Qual a expectativa da Abdib para 2024?
Tínhamos um programa bem estruturado de concessões que continua em andamento, projetos licitados que agora podem operar em velocidade de cruzeiro. A fragilidade que ainda existia era justamente na parte do equacionamento das finanças públicas, em priorizar investimentos, e isso está sendo feito, então o ciclo tende a ser positivo – como disse, incluindo projetos na esfera dos estados. Um exemplo é o recente anúncio do BNDES de R$ 10 bilhões para o Trem Intercidades e investimentos no metrô. Novamente, a volta do BNDES como financiador é importante. Assim como outras iniciativas de financiamento, como o projeto de criação das debêntures de infraestrutura (que, diferentemente das incentivadas, concede benefício fiscal ao emissor do papel), que podem ser de interesse do investidor institucional. Esses investidores representam hoje um patrimônio de US$ 1,5 trilhão, e estima-se que podemos atrair cerca de 20% desse montante para nossos projetos.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.