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Postado por Conjuntura Econômica
“É mais difícil montar um ministério do que ganhar as eleições”
Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro
O presidente Lula começou a montar seu ministério. Não está sendo fácil acomodar tanta gente no amplo leque de apoio feito com partidos políticos como forma de vencer as eleições. Há pressões por todos os lados, da base de apoio e do partido do presidente, o PT, para abocanhar os ministérios ou secretarias com maior visibilidade e recursos.
Nomes já foram escolhidos para alguns ministérios e secretarias, alguns bem recebidos pelo mercado, outros não tanto, especialmente os que estão sendo anunciados para a área econômica, considerados heterodoxos.
Ontem, (22), Lula disse que “é mais difícil montar um ministério do que ganhar as eleições”, numa mostra das dificuldades que vem encontrando para acomodar todos os interesses envolvidos. Segundo o presidente, até dia 27 próximo todo o ministério deverá estar formado, com 37 pastas. Ontem, foram anunciados mais 16 nomes, seis dos quais mulheres.
Essas dificuldades já ficaram patentes quando se formou a equipe de transição na área de defesa nacional, que foi a única em que não se conseguiu um diálogo, como começou a ocorrer nas outras áreas.
Rápido no gatilho, Lula indiciou como ministro da Defesa José Múcio, um político de direita que tem diálogo nas hostes bolsonaristas.
Octavio Amorim Neto, cientista político e professor da FGV EBAPE, em sua coluna no Boletim Macro FGV IBRE de dezembro, que já pode ser acessado gratuitamente, salienta que “a opção de Lula surpreendeu muita gente, mas faz sentido. Afinal, as Forças Armadas estão entre as organizações nacionais mais imbricadas com o bolsonarismo. Não à toa, ao longo de 2022, o atual ministro da Defesa, o General Paulo Sérgio de Oliveira, notabilizou-se não como especialista em defesa, mas como comentarista crítico do excelente sistema de votação eletrônica de que dispõe o Brasil, tornando-se, portanto, a ponta de lança da principal linha de ataque do inquilino do Palácio do Planalto às instituições do país, mormente ao Supremo Tribunal Federal e ao Tribunal Superior Eleitoral”.
Para Amorim, “desde a criação do Ministério da Defesa (MD) em 1999, os militares sempre se queixaram de os titulares civis da pasta não terem conhecimento em questões atinentes à defesa nacional. O fato de Paulo Sérgio de Oliveira, um militar que supostamente tem tal conhecimento, não ter jamais se destacado durante seu período à frente do MD como especialista em defesa solapa completamente a credibilidade da crítica que os militares costumavam fazer aos civis”.
Ele também ressalta que, “os atuais comandantes da Marinha, do Exército e da Força Aérea têm sido tolerantes com os extremistas de direita que continuam se manifestando diante de quartéis em prol de um golpe militar contra a vitória de Lula. Os referidos comandantes também ameaçaram passar seus respectivos cargos antes da posse de Lula, numa mensagem clara de que não aceitariam se subordinar a ele”.
Trocando em miúdos. Há muitos ruídos ainda sendo ouvidos, em uma parte do setor militar que Lula e sua equipe têm procurado resolver. Para o cientista político da FGV, há três prioridades máximas para o primeiro ano de mandato de Lula, que vão exigir muita energia, tempo e capital político, num cenário de um Congresso mais conservador. Seriam as seguintes:
• Alterar o Artigo 142 da Carta de 1988, de modo que as Forças Armadas não tenham mais como uma de suas destinações a garantia dos poderes constitucionais, destinação que tem alimentado a demanda de intervenção militar contra o Poder Judiciário por parte dos bolsonaristas
• A proibição constitucional de ocupação de cargos não atinentes à defesa nacional por oficiais da ativa, com o fito de evitar a repetição do que se tem visto sob Bolsonaro, isto é, a presença de milhares de militares das três Forças em cargos do Executivo Federal de natureza eminentemente civil.
• A criação da carreira de analista civil dentro do MD, com o propósito de quebrar o quase monopólio dos militares em matéria de defesa.
Segundo Amorim, “as duas primeiras reformas exigem emenda à Constituição. A terceira requer um projeto de lei enviado ao Congresso pelo Executivo. Como a legislatura eleita em outubro será dominada por uma direita que se tem mostrado ou simpática ou indiferente à presença dos militares na política, entende-se a cautela de Lula. Entretanto, essa abordagem tem prazo de validade. Ou Lula mete a mão no vespeiro no momento adequado ou o vespeiro poderá engoli-lo”.
Veja a íntegra no Boletim Macro FGV IBRE.
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