Combate ao trabalho informal e a desoneração de folha são agendas essenciais para o setor de TIC, afirma Brasscom
-
Postado por Conjuntura Econômica
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
Na edição de setembro da Conjuntura Econômica, os economistas José Roberto Afonso e Thiago Felipe Abreu destacaram uma tendência crescente entre trabalhadores jovens e qualificados de trocarem empregos tradicionais, de carteira assinada, por outros arranjos de trabalho que lhe pareçam mais vantajosos. No artigo, os economistas alertam que essa disposição deveria ter como contrapartida um aumento da propensão a poupar, ainda não verificado, para garantir a esses profissionais o financiamento de suas necessidades na velhice, sem o apoio de uma aposentadoria pelo sistema de previdência pública.
Na semana passada, empresários da área de tecnologia da informação e comunicação (TIC) expressaram em evento na capital paulista a outra face dessa tendência, presente no setor: o crescimento do trabalho informal. “Muitos trabalhadores de tecnologia estão aceitando modelos de contratação que não garantem nenhum direito trabalhista, com contratações informais tanto no Brasil, como no exterior’’, afirma Sergio Paulo Gallindo, presidente da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e Tecnologias Digitais (Brasscom).
Para compreender melhoro impacto, em outubro de 2021 a Brasscom passou a monitorar esse movimento, a partir de uma sondagem mensal com todos os profissionais que eram contratados ou desligados nas empresas associadas. “Esses profissionais recebem um questionário online sobre as condições de entrada ou saída da empresa, a partir do qual buscamos identificar os modelos que precederam ou sucederão o contrato formal na associada Brasscom”, explica Sergio Sgobbi, diretor da Brasscom. Além de identificar informalidade contratual, dizem os executivos, a Brasscom identificou casos de contratações por empresas legais fora do país mas sem CNPJ no Brasil, e que por isso não respeitam as legislações locais, e outras práticas consideradas precarizantes. “Entre elas estão o que chamamos de CLT flex – profissionais que se tornam pessoas jurídicas para prestar serviço a uma única empresa –, e aquelas que fazem contratações com salários abaixo do mercado, compensados por outros benefícios, como vouchers para compra de vestuário, auxílio moradia, proporcionalmente avantajados em relação à remuneração oficial, e não cabível na CLT”, diz Gallindo. O levantamento, chamado Pesquisa Pulso detectou um nível de 16% tanto entre profissionais que chegavam de um emprego informal ou para trabalharem no regime CLT nas empresas associadas, ou eram desligados dessas migrando a um trabalho informal ou precarizado, na média de outubro de 2021 a julho deste ano.
Os executivos afirmam que, além de alimentar uma relação trabalhista instável, aproveitando-se da visão de curto prazo predominante na nova geração de profissionais, essas práticas têm representado uma concorrência desleal para o setor formal de TIC, que precisa ser combatida. “A digitalização que possibilitou o trabalho remoto na pandemia derrubou definitivamente barreiras físicas”, diz Sgobbi, apontando que é preciso vigilância quanto às consequências negativas desse avanço. A primeira iniciativa do setor foi o lançamento de uma Carta de Princípios do Trabalho em Tecnologia, da qual são signatárias 19 empresas entre as quais Claro, Embratel, Tivit, Capgemini, Hotmart e Mercado Bitcoin. “O primeiro movimento foi colocar o bode na sala e mostrar que não estamos imunes a práticas deletérias. Logo, incentivar a que essas empresas com mais maturidade exerçam seu poder de mercado para constranger outras que operem práticas laborais precarizantes”, afirma Gallindo.
Também da parte da agenda do setor a defesa de uma política permanente de desoneração de folha. Hoje, tanto o setor de tecnologia da informação quanto de tecnologia de comunicação operam sob um regime especial de contribuição previdenciária patronal, a CPRB, que substitui a contribuição sobre a folha de pagamentos pela aplicação de uma alíquota sobre a receita bruta mensal, que varia de 1% a 4,5% de acordo com a atividade, o setor econômico e o produto fabricado. Atualmente, 17 setores podem optar por essa contribuição, selecionados entre os que são entendidos como grandes empregadores – dos quais também fazem parte a construção civil, transporte rodoviário de passageiros e carga, e empresas do setor têxtil e de calçados. Essa medida acabaria no final de 2021, mas foi prorrogada até 2023. “Sem uma regra perenizada, vivemos um estresse permanente, que inclui questionamentos da legalidade da contribuição, interpretada muitas vezes como renúncia”, diz Gallindo.
De acordo ao presidente da Brasscom, o setor defendemos uma reforma tributária ampla que garanta a desoneração da folha de pagamentos a todos os setores da economia, com a busca de outra fonte tributável para garantir a arrecadação do sistema de seguridade social. “Consideramos, inclusive, que uma reforma ampla pode trazer um efeito colateral virtuoso, de equalizar o custo do trabalho entre o empregado formal CLT e os empreendedores, já que hoje temos regimes como MEI e Simples competindo em condições desiguais”, diz. “O fato é que precisamos de uma solução que garanta a pujança de setores altamente empregadores”, conclui.
De acordo à Brasscom, o macrossetor de TIC criou 76 mil novos postos de trabalho no primeiro semestre deste ano, resultando em um crescimento de 4% em relação ao número de pessoas contratadas no fim de 2021, numa tendência de alta que não é interrompida desde junho de 2020. Como apontado ao Blog no final do ano passado, a Brasscom estima que a demanda brasileira por profissionais nas áreas de software, serviços de TIC e TI in-house será francamente maior que a oferta nos próximos anos. O esforço de empresas e instituições de ensino para ampliar a capacitação de funcionários e a adequação de currículos nas carreiras de ensino superior e técnico será fundamental, diz a Brasscom, para atender a essa demanda.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.