Edição de fevereiro de 2024

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Nota do Editor

Esta edição está de cara nova. Tanto graficamente, como no conteúdo, com novos colunistas que irão agregar enorme valor ao debate econômico, político e social. Se prenuncia um ano difícil, com o governo buscando aumentar as receitas para equilibrar as contas públicas, com eleições municipais, onde, historicamente, há mais gastos. Além das guerras na Europa, no Oriente Médio, aumento da tensão entre China e Taiwan e as eleições norte-americanas.

Ao longo do ano passado – e já no último ano do governo Bolsonaro –, houve a liberação de muito dinheiro para programas sociais e aprovação de projetos considerados importantes para o país. O último deles, depois de mais de três décadas de tentativas, foi a reforma tributária. A captura de recursos do Orçamento pelo Congresso não é coisa nova, mas ganhou maior dimensão nos anos recentes, como já apontávamos em artigo de Paulo Hartung, Marcos Mendes e Fábio Giambiagi, publicado na edição de setembro de 2021 de Conjuntura Econômica. O que torna ainda mais difícil uma sustentabilidade fiscal.

Murillo de Aragão, professor adjunto da Columbia University e CEO da Arko Advice, novo articulista da revista, navega por essas águas ao salientar que “as relações políticas são transações que implicam custos. Governos que não conseguem transacionar apoios políticos enfrentam dificuldades para avançar em suas agendas e correm riscos de sofrer derrotas”, como ocorreu com Collor de Mello e Dilma Rousseff que tiveram seus mandatos cassados. “Um governo impopular, que não cumpre os acordos e que está exposto a problemas, pode inviabilizar sua existência.”

Vilma da Conceição Pinto, diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI), que também passa a fazer parte do grupo de articulistas, enfatiza que 2024 traz desafios adicionais, não apenas na estruturação do Regime Fiscal Sustentável (RFS), mas também na adequação do Orçamento deste ano às regras fiscais já existentes. A combinação desses dois fatores adicionais gera incertezas ao cenário fiscal.

Desde a Constituição de 1988, os municípios brasileiros foram o nível de governo que mais cresceu em termos fiscal mostra Solange Monteiro, editora de Conjuntura Econômica. Mais recentemente, entretanto, especialmente a partir da pandemia de Covid-19, o nível de volatilidade de receitas e transferências aumentou bastante, tornando-se um desafio para a gestão das contas desses entes. Um desafio, aliás, para o qual muitas vezes os prefeitos estão de mãos atadas, posto que é ocasionado por decisões de fora de seu campo de ação. Quando se desonera o ICMS, por exemplo, um quarto da conta é paga pela cota municipal, lembra o economista José Roberto Afonso, na matéria de capa desta edição. “Isso também envolve as famosas emendas parlamentares, que implicam destinação de dotações orçamentárias federais para obras locais sem uma lógica setorial ou nacional, e que mais funcionam como um concorrente da gestão local”, completa. Esse será um dos desafios que os prefeitos que vencerem as eleições deste ano terão que enfrentar, além de preparar suas cidades para lidar com as graduais mudanças provocadas pela reforma tributária em sua dinâmica de arrecadação – parte das quais, inclusive, serão debatidas este ano, nas leis complementares, disputando a atenção com a corrida eleitoral.

Também a Carta do IBRE faz um balanço das contas públicas em 2023 e as perspectivas da agenda fiscal para 2024. Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do FGV IBRE, pontua as dificuldades de se zerar o déficit primário este ano e elenca cinco principais desafios para a política fiscal em 2024. O primeiro é encontrar uma solução para o imbróglio da desoneração da folha de 17 setores produtivos, estendida pelo Congresso na contramão dos planos do Executivo. O segundo é que a eventual alteração da meta fiscal em 2024 (resultado primário zerado) tem que manter um cenário fiscal construtivo. O terceiro é o governo conseguir que o mercado e os agentes econômicos incorporem em suas expectativas os ganhos fiscais já alcançados. O quarto é o de harmonizar a velocidade do ajuste possível com as expectativas políticas do Orçamento. Uma eventual mudança da meta em 2024 deve levar a um realinhamento da programação fiscal dos anos seguintes. O quinto e último desafio fiscal desse ano é o de suavizar a desaceleração cíclica da economia.

Marcos Cintra, professor titular da Fundação Getulio Vargas (FGV), se debruça sobre a aprovação da reforma tributária. Crítico de vários pontos que foram aprovados, ele rebate as afirmações de que o modelo a ser implantando terminará com a “guerra fiscal”; que as alíquotas do novo IBS/CBS serão neutras, e portanto  irrelevantes nas decisões de alocação de fatores e na eficiência dos mercados intermediários; e que seus efeitos serão sentidos apenas no mercado consumidor final, quando então poderão ter efeitos retroativos secundários nos mercados intermediários; e que haverá não cumulatividade plena.

Mas se a questão fiscal é um problemão, o endividamento das famílias é outro foco de atenção do governo, que deve permear duros embates ao longo desse ano para que os juros cobrados no cartão de crédito sejam reduzidos. Como escreve Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt, que é doutora em economia pela FGV EPGE e foi secretária de Economia do estado de Goiás, que também passa a integrar o elenco de novos colunistas da revista, “a briga entre bancos e credenciadoras tem mais de 20 anos e se intensificou no segundo semestre de 2023, quando as taxas de juros do crédito rotativo do cartão de crédito e a inadimplência alcançaram valores astronômicos”. Com famílias endividadas, especialmente com cartão de crédito, o consumo não cresce e, é ele, por sinal, o consumo das famílias, que tem sido um dos principais componentes do crescimento do PIB.

Outro destaque é o artigo da secretária de Planejamento, Leany Ramos, e de sua adjunta, Virgínia de Ângelis, onde o foco central é um tema que vem ganhando cada vez mais importância mundo afora: o do meio ambiente e sustentabilidade, onde o Brasil pode ser um player importante no campo da energia limpa, especialmente hidrogênio verde.

A corrida de obstáculos para se chegar à universalização do saneamento básico no país em 2033 – seriamente ameaçada pela ainda insuficiência de recursos, problemas de licenciamento ambiental, questões jurídicas –, é tratado pelos pesquisadores do FGV CERI, Luiz Firmino Pereira e Rafael Souza. Sem saneamento adequado, as desigualdades irão se acentuar no país, sobrecarregando o sistema de saúde e tornando mais complexo sairmos da armadilha do baixo crescimento.

 

Claudio Conceição

 


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Acesse conteúdo separadamente

Carta do IBRE – Os cinco desafios da política fiscal em 2024

Há cinco desafios principais para a política fiscal este ano. O primeiro e mais imediato desafio é encontrar uma solução para o imbróglio da desoneração da folha de 17 setores produtivos, estendida pelo Congresso na contramão dos planos do Executivo. O segundo é que a eventual alteração da meta fiscal em 2024 (resultado primário zerado) tem que manter um cenário fiscal construtivo. O terceiro é o governo conseguir que o mercado e os agentes econômicos incorporem em suas expectativas os ganhos fiscais já alcançados. O quarto é o de harmonizar a velocidade do ajuste possível com as expectativas políticas do Orçamento. Uma eventual mudança da meta em 2024 deve levar a um realinhamento da programação fiscal dos anos seguintes. O quinto e último desafio fiscal de 2024 é o de suavizar a desaceleração cíclica da economia. 

Ponto de Vista – Os ricos e os pobres

Há algumas décadas persiste um desentendimento surdo entre os economistas e os sociólogos. Estes enxergam as classes sociais como organizadas em torno de valores e hábitos diferentes e não gostam das classificações de renda dos economistas. O pesquisador brasileiro Marcelo Medeiros, formado em economia, com doutorado em sociologia, consegue fazer a ponte entre esses dois mundos no livro Os ricos e os pobres, que acaba de publicar. 

Entrevista –  “O Brasil precisa entender melhor o que significa o fracasso das crianças no início da escolarização”

Izolda Cela, secretária executiva do Ministério da Educação, em conversa com Conjuntura Econômica, elenca os vários desafios que tem pela frente para melhorar os níveis educacionais no país. Um deles é o início da escolarização. “O Brasil ainda precisa entender melhor o que significa o fracasso das crianças no início da escolarização. Inclusive, para a produtividade adiante, para o resultado do Pisa. Não vamos ter bons resultados com uma base desarrumada e ineficiente”.

Capa | Municípios – Cidades brasileiras

As insatisfações dos eleitores alimentam o radar dos candidatos a prefeito, que nem sempre respondem com propostas de fato eficientes para a mobilidade, segurança, saúde e educação, como mostram os especialistas ouvidos pela Conjuntura Econômica. Além de políticas públicas de qualidade, o sucesso das gestões municipais também dependerá de como os prefeitos lidarão com uma conjuntura fiscal altamente volátil. “Em linhas gerais, 2023 marcou uma piora significativa no déficit primário dos governos municipais, e parte desse resultado decorre de questões que não estão à mão dos municípios resolverem”, diz Vilma Pinto, diretora da IFI. 

Artigos 

Teoria do custo político:  uma breve introdução 
Murillo de Aragão

Desafios e perspectivas do Regime Fiscal Sustentável no Orçamento de 2024 
Vilma da Conceição Pinto

Os mitos rondam os IVA’s 
Marcos Cintra

Inadimplência, crédito rotativo e concorrência: desafios e sugestões 
Cristiane Alkmin Junqueira Schmidt

A agenda transversal do meio ambiente 2024-2027 
Leany Lemos e Virgínia de Ângelis

Universalização do saneamento: uma corrida de obstáculos 
Luiz Firmino Pereira e Rafael Souza

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