O novo índice de preços de aluguéis e o impacto nas análises econômicas

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

Acompanhar adequadamente a evolução dos preços dos aluguéis residenciais no Brasil sempre foi um grande desafio, já que os valores anunciados nas ofertas de locação de imóveis, através de anúncios em jornais ou divulgados em sites das imobiliárias, normalmente não refletem os preços praticados. É comum haver negociações que levam a uma queda no preço originalmente pedido, o que não é computado nos valores que vão modelar a inflação de aluguéis.

Com o objetivo de atender às demandas da sociedade para uma mais correta e detalhada mensuração e compreensão da inflação e da variação de preços em geral, em inúmeros setores e aspectos, o FGV IBRE lançou o índice de variação de aluguéis residenciais (IVAR), que se soma a série de indicadores produzidos pelo IBRE.

O novo indicador tem como base os preços dos aluguéis efetivamente praticados, já que são captados diretamente dos contratos de aluguel firmados entre locador e locatário.

Paulo Picchetti, pesquisador do FGV IBRE, que liderou os esforços para a criação do IVAR, comenta na Carta do IBRE que está circulando na revista Conjuntura Econômica, que “não se trata de mais um índice baseado na oferta de preços de aluguel, mas sim efetivamente de um índice dos preços praticados no mercado em contratos de aluguel”.

A Carta ressalta que, “ao lançar um produto como o IVAR, a intenção do FGV IBRE não é a de torná-lo necessariamente o indexador dos contratos de aluguéis residenciais no Brasil, mas sim a de colaborar com a sociedade brasileira ao disponibilizá-lo para que seja utilizado quando e nas circunstâncias que os agentes econômicos julgarem apropriadas. Acreditamos que o IVAR tem potencial de se tornar um importante índice para os contratos de aluguel, mas é a própria sociedade que deve decidir se isso ocorrerá, e sob que condições. Nosso compromisso, como de hábito, é com a excelência técnica e a total transparência da metodologia do novo indicador, dos seus componentes e dos respectivos pesos”.

O novo indicador, no entanto, poderá ter impactos relevantes nas análises macroeconômicas, como chama atenção Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro FGV IBRE, mencionada na Carta: “o fato de que a correta medição da evolução dos preços dos aluguéis, quando o IVAR calculado retroativamente é inserido nos índices de preços ao consumidor, indica que a inflação total efetiva nos últimos anos não foi exatamente a registrada nos índices oficiais”.

É o que indicam cálculos feitos por André Braz, pesquisador do FGV IBRE e responsável pela área de preços do Instituto. Como mencionado na Carta, em 2019, caso computasse o IVAR como a inflação dos aluguéis, teria fechado o ano em 3,9%. No caso, 0,4 ponto percentual (pp) abaixo do resultado oficial de 4,3%. Já o INPC teria ficado em 4%, 0,5pp abaixo do resultado oficial de 4,5%. Em 2020, o IVAR praticamente não alteraria o resultado, e tanto o IPCA quanto o INPC repetiriam o resultado oficial de, respectivamente, 4,5% e 5,5%. Já em 2021, Braz estima que o IPCA e o INPC, com a inclusão do IVAR, ficarão ambos 0,2pp abaixo do resultado oficial, que ainda não havia sido divulgado quando esta Carta foi redigida”.

Apesar das diferenças, Paulo Picchetti, “frisa que o fato de que a inclusão do IVAR no cálculo do IPCA tenha de forma geral mostrado que o índice oficial de inflação superestimou a alta de preços de 2019 a 2021 não significa que uma aferição mais correta da inflação dos aluguéis sempre provocará efeitos nessa mesma direção. É perfeitamente possível que em outras conjunturas o IPCA, ao ser comparado como sua versão em que o IVAR é incluído, subestime a inflação. Não há nada no cálculo do IVAR e na metodologia atual de se computar os aluguéis no IPCA que determine que um resultado será sempre superior ou inferior ao outro”.

Como ressalta a Carta, no entanto, “essas diferenças entre a inflação oficial e aquela calculada com a inclusão do IVAR, mais próxima da realidade por computar de forma mais veraz a variação do preço dos aluguéis, são obviamente relevantes para a política monetária e para as transações do mercado financeiro, pois impactam os juros e outras variáveis em termos reais. Outro aspecto macroeconômico relevante, contudo, que será destacado nesta Carta, é a política fiscal. A razão é que o IPCA corrige o teto constitucional dos gastos públicos e o INPC, além de reajustar o salário-mínimo, indexa ou é parâmetro para diversos benefícios sociais e previdenciários”.

Dois pesquisadores da equipe do Boletim Macro FGV IBRE, Juliana Damasceno e Bernardo Motta, revisaram indicadores fiscais a partir da correção mencionada dos índices de inflação pela inclusão do IVAR. Através de uma série de cálculos e ajustes necessários em função da dinâmica orçamentária ditada pela inflação, os dois pesquisadores chegaram aos seguintes números, como é explicitado na Carta do IBRE:

• A receita líquida de 2019, 2020 e 2021 cai, respectivamente, R$ 5,187 bilhões (-0,39%), R$ 4,637 bilhões (-0,39%) e R$ 8,813 bilhões (-0,57%). Todos os números referentes a 2021 já mencionados são projeções, pois os dados do ano fechado de 2021 ainda não haviam sido disponibilizados quando esta Carta foi produzida.

• Em relação à despesa, é relevante notar que o teto era reajustado, até 2021, pelo IPCA acumulado entre julho de dois anos antes e junho do ano anterior à sua validade (do teto reajustado). Como o recálculo do IPCA levando em consideração o IVAR recuou até 2018, só foi possível reestimar o teto de 2020 (corrigido pelo IPCA de julho/2018 a junho/2019) e o de 2021, corrigido pelo IPCA de julho/2019 a junho/2020. No caso da correção do teto de 2020, a inclusão do IVAR fez com que a inflação de julho/18-junho/19 caísse em 0,1pp, para 3,3%. Já no teto de 2021, o IPCA de julho/19-junho/20, com a inclusão do IVAR, recua 0,35pp, para 1,75%.

Assim, a despesa total cai R$ 1,884 bilhão (-0,1%) e R$ 5,691 bilhões (-0,34%) em 2020 e 2021, respectivamente.

• Em valores, tem-se uma receita líquida ajustada pelo IVAR de R$ 1,342 trilhão, R$ 1,199 trilhão e R$ 1,536 trilhão em, respectivamente, 2019, 2020 e 2021. Já a despesa total ajustada é de R$ 1,945 trilhão e R$ 1,655 trilhão em 2020 e 2021, respectivamente.

• Os impactos no resultado primário são – em 2019, só pelo lado da receita, pelas razões explicadas acima – de quedas de R$ 5,2 bilhões (-0,07pp de PIB), R$ 2,8 bilhões (-0,04pp) e R$ 3,1 bilhões (-0,04pp) em 2019, 2020 e 2021, respectivamente.

Como pode ser observado, o IVAR vai muito além de aprimorar o mercado de aluguéis no país. “ Tem impacto relevante em diversas dimensões da política econômica e do funcionamento dos mercados”, diz a Carta do IBRE.

Ver a integra na Carta do IBRE

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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