A educação e o mercado de trabalho

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

A taxa de desemprego no trimestre móvel terminado em fevereiro último foi de 11,2%, somando 12 milhões de desempregados. Em fevereiro, a taxa de desemprego foi menor que a do mesmo período do ano passado, de 14,6% e, também, inferior à de fevereiro de 2020, de 11,8%. É importante notar que esses números estão bem distantes da média da taxa de desemprego de 9,8% registrada entre 1995 e 2019.

Mas estamos no caminho de uma recuperação do mercado de trabalho? Embora essa queda seja salutar, se olharmos outros dados, o quadro não é dos mais animadores. Primeiro, o recuo da taxa de desemprego em fevereiro nos levou de volta ao período antes da pandemia, quando o número de desempregados já era elevado. Quando a pandemia começou em 2020, o mercado de trabalho ainda não havia se recuperado da profunda recessão de 2014-2016. Em 2014 o país conseguiu crescer um pouquinho, 0,5%, mas nos dois anos seguintes houve uma queda do PIB próxima dos 3,5%. A última vez que o Brasil teve dois anos seguidos de crescimento real negativo do PIB foi em 1930 e 1931, logo após a crise de 1929.

Outras variáveis devem ser levadas em conta quando se analisa os dados do mercado de trabalho brasileiro. Uma delas, que não entra nas estatísticas das taxas de desemprego, é a quantidade de pessoas que trabalham menos de 40 horas mas estavam dispostas a trabalhar mais, os chamados subocupados por insuficiência de horas trabalhadas.

Segundo levantamento da equipe de Mercado de Trabalho, Produtividade e Renda do FGV IBRE, cerca de 6,6 milhões de pessoas – 7% do total dos ocupados –, ainda estavam nessa situação na média móvel encerrada em fevereiro último.

Desempregados e subocupados por insuficiência de horas trabalhadas fazem parte dos trabalhadores subutilizados, que ainda englobam a força de trabalho potencial, ou seja, aquelas pessoas que estão fora da força de trabalho, mas tem condições de fazer parte dela. No trimestre encerrado em fevereiro deste ano, a legião de pessoas que estavam nessa categoria era de 27,3 milhões. É bom ressaltar que a curva vem apresentando uma trajetória descendente, como mostram os gráficos abaixo.

Mercado de trabalho
Subutilizados

 

Subocupados por Insuficiência de Horas


Fonte: Pnad Contínua – FGV IBRE.

Segundo a Carta do IBRE, publicada na edição deste mês da revista Conjuntura Econômica, “conforme as projeções do IBRE, a queda da taxa de desemprego para níveis próximos dos 9,8% da média entre 1995 e 2019 depende de forte aceleração da economia brasileira. Uma taxa de crescimento de 1,5% ao ano, como a que vigorou em 2015-19, não faria a taxa de desemprego atingir 9,5% nem mesmo em 2026. Para isso, seria necessário um crescimento de 3,5% do PIB entre 2022 e 2026, algo bastante improvável dado o cenário negativo em 2022 e as perspectivas de baixo crescimento nos próximos anos”.

Apesar desse melancólico quadro do mercado de trabalho no campo macroeconômico, há sinais de alento se olharmos a questão microeconômica.

Como diz a Carta, “de início, uma rara boa notícia derivada da grande mudança educacional do mercado de trabalho nacional nas últimas três décadas, período ao longo do qual a escolaridade média deu um enorme salto. Em 1992, cerca de 2/3 dos trabalhadores brasileiros não tinham sequer o ensino fundamental completo. Em 2021, proporção semelhante tem pelo menos o ensino médio completo. Os trabalhadores com ensino superior completo subiram de 5,8% para 21,4% do total no período”.

Os pesquisadores do FGV IBRE, Fernando Veloso, Silvia Matos, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Paulo Peruchetti fizeram um exercício para mostrar o impacto da educação no mercado de trabalho. Partindo de dois cenários – um com a educação congelada aos níveis de 1992, e o outro com os avanços obtidos na educação, como mostrei acima. Na comparação entre os dois cenários de evolução da taxa de informalidade no Brasil com aquele em que se supõe a escolaridade congelada no nível de 1992, “abre-se uma diferença expressiva e crescente – favorável à taxa real – que se estabiliza em meados da década passada. Em 2021, a taxa real de informalidade foi de 48,4% e, no cenário contrafactual, teria sido de 63,8%”.

Outro ponto favorável da melhoria na educação pode ser visto no rendimento real médio do trabalho, utilizando-se esses dois cenários.

“Em 2021, (esse rendimento) foi de R$ 2.569,56, e teria sido, no cenário contrafactual com escolaridade da força de trabalho congelada no nível de 1992, de R$ 1.685,93. Em outras palavras, o crescimento da média de anos de estudo dos trabalhadores proporcionou um aumento de renda de 52,4%. Na verdade, o rendimento do trabalho praticamente não teria crescido desde o início da década de 90 no cenário contrafactual.”

Embora a melhoria da educação ainda não tenha se refletido no mercado de trabalho de forma consistente – a taxa de desemprego continua em patamares acima de dois dígitos –, “é provável que, nos próximos anos, a melhoria da composição da força de trabalho em termos de escolaridade passe a contribuir também para o emprego, além da formalização e da renda, à medida que aumenta a parcela de mão de obra com ensino médio completo”, diz a Carta.

Agradeço a Paulo Peruchetti, pesquisador do FGV IBRE, pelas informações que auxiliaram para esse texto.

Ver a integra da Carta do IBRE

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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