Confiança de comércio e serviços: tendência de um semestre “andando de lado”

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Em agosto, Sondagens do IBRE que medem a confiança nos setores de comércio e serviços deram sinais de certa desaceleração, com o comércio ainda um passo atrás. Apesar de ambos estarem mais perto do patamar de neutralidade de 100 pontos do que no início do ano – a confiança dos serviços permaneceu na casa dos 80 pontos até fevereiro (89,1) e o comércio, até maio (87,3 pontos) – agora há sinais de desaceleração dessa recuperação, afirma o economista do FGV IBRE Rodolpho Tobler, responsável pela divulgação das pesquisas.

Índice de Confiança de Serviços (ICS) recuou 0,6 ponto em relação a julho, para 97,4 pontos, após cinco meses seguidos de alta. Em médias móveis trimestrais, o índice registra alta de 1,5 ponto. Já a Confiança do Comércio (ICOM) subiu 2,2 pontos em agosto, para 93,8 pontos (em médias móveis trimestrais, registrou alta de 2,2 pontos). O resultado de agosto alta ainda não foi suficiente para recuperar a queda no mês anterior em relação a maio, de 2,6 pontos. “Além disso, comércio registra o segundo mês seguido com queda da confiança em relação à situação atual. Em julho, essa revisão para baixo tinha sido menor, de 0,9 ponto, indicando certo ’compasso de espera’. Neste mês, a queda foi de 3,4 pontos, reforçando essa avaliação mais negativa”, descreve. A sustentação de uma evolução positiva entre os empresários do setor se deu graças à alta de 7,6 pontos no índice que mede as expectativas sobre os próximos meses. “É um movimento que se justifica, dada a melhora de ambiente que se espera com fatores como o corte de juros e o controle da inflação”, lembra.

Evolução confiança
(índices dessazonalizados, em pontos)


Fonte: FGV IBRE.

Para compreender melhor o comportamento da confiança dos empresários de comércio sobre a situação atual, Tobler desagregou as empresas que indicaram a demanda insuficiente como limitação, separando-as em dois grupos: o comércio de bens considerados essenciais, onde estão os supermercados, o comércio de produtos farmacêuticos e de combustíveis e outro no qual agregou os demais bens, que classificou como não-essenciais. “Quando se analisa a evolução desses dois grupos em médias móveis trimestrais, mais livres de ruídos, percebe-se a abertura de uma ‘boca de jacaré’ entre ambos a partir do quarto trimestre do ano passado que ainda resiste em fechar, com os bens de valor mais alto, que dependem de crédito e cujo consumo pode ser adiado, sofrendo mais”, descreve. Ainda que muitas medidas estejam sendo operadas e avaliadas para reduzir a inadimplência dos consumidores – como o Desenrola e a busca de uma alternativa para o rotativo do cartão de crédito, linha mais cara cujas dívidas são mais difíceis de se quitar –, o grau de endividamento e inadimplência ainda é alto, lembra. “Apesar da Confiança do Consumidor estar se recuperando  – em julho alcançou o melhor nível desde fevereiro de 2014, pré-recessão –, as famílias ainda lidam com um orçamento apertado, e nos próximos meses não teremos um novo aumento de benefícios ou uma melhora significativa do mercado de trabalho. “O resultado do Caged de julho ilustrou essa perspectiva de desaceleração para o semestre, com um saldo positivo um pouco abaixo da expectativa dos analistas, de 142,7 mil vagas – basta lembra que em fevereiro esse saldo foi de 250 mil. Parece que agora o mercado voltou a seu padrão sazonal, que tinha sido quebrado na pandemia”, compara (o IBGE divulgou hoje os resultados da PNAD para o trimestre encerrado em julho: queda da taxa do desemprego para 7,9%, com aumento de 0,2 ponto percentual na informalidade em relação ao trimestre anterior). Com isso, a tendência é de que o consumo ainda se mantenha mais focado em itens básicos, diz. “Uma melhora da confiança no que resta do ano dependerá do comportamento de consumo dos bens não-essenciais.  Ou seja, a tendência é de que a confiança ‘ande de lado’ neste semestre, perto dos 95 pontos – o que não é um patamar tão ruim, mas abaixo do moderado.” Tobler afirma que a atividade do comércio pode sinalizar um viés de alto no final do ano, com a chegada de promoções e o Natal. “Por enquanto, entretanto, não identificamos fatores que possam gerar uma melhora significativa do quadro”, reforça.

Percentual de empresas afirmando demanda insuficiente como limitação, por tipo de bem
(Dados em % e médias móveis trimestrais) 


Fonte: FGV IBRE.

No caso dos serviços, Tobler lembra que o setor conta com a vantagem de ser menos concentrado no consumo direto das famílias e do cenário de crédito. “Basta observar o impulso que segmentos como o de transporte ganharam no primeiro trimestre, graças ao impulso do agronegócio”, lembra. De fato, a Sondagem de agosto aponta que a única queda de confiança, medida em médias móveis trimestrais, se deu exatamente no segmento de serviços prestados às famílias. “No agregado do setor, entretanto, o movimento, entretanto, que mais se assemelha a uma acomodação, depois de cinco meses seguidos de alta”, pondera. Tal como na Sondagem do Comércio, a revisão mais negativa se deu na avaliação sobre a situação atual, com estabilidade no índice que mede as expectativas (IE) – o que reduziu a distância registrada em julho entre o IE de serviços e comércio. “O cenário dos serviços ainda é o de uma atividade na qual a inflação continua sendo a mais difícil de baixar; por outro lado, por não apresentar sinais de desaceleração, é a atividade que ajuda a sustentar o mercado de trabalho no positivo”, diz. Em julho, como mostra o Caged, foi o setor com maior criação de vagas (saldo de 56,3 mil), ainda que em número menor do que julho (75,7 mil). Comércio ficou em segundo lugar, com 26,7 mil, indicando um aumento em relação a junho (20,7 mil).

Indicadores que fazem parte da composição do Índice de Confiança de Serviços
(Dados dessazonalizados, em pontos, e médias móveis trimestrais)


Fonte: FGV IBRE.

 

Leu a matéria da Conjuntura Econômica de agosto sobre crédito e educação financeira? Confira aqui.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

Subir