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Entrevistas 11 dez 2024
“É fundamental institucionalizar o processo de revisão de gastos”, afirma Sérgio Firpo
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Postado por Conjuntura Econômica
Sérgio Firpo, Secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento
Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro
Relatório lançado em novembro em seminário no FGV IBRE (leia aqui) destacou o aumento dos gastos tributários no Brasil e a importância de se avaliar melhor políticas que envolvem renúncias fiscais. Em conversa com o secretário Sergio Firpo, eles nos conta sobre os avanços do Ministério nessa tarefa:
O Relatório Nacional sobre Gastos Tributários – projeto conjunto da FGV com o Tax Expenditures Lab – reconhece a relevância do trabalho do Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMAP), mas também o fato de que o impacto desse trabalho no processo decisório ainda não foi sentido. Como ampliar a capacidade de influenciar a reformulação ou descontinuidade de políticas públicas?
O CMAP tem avançado de maneira consistente na avaliação de políticas públicas, sejam elas de gasto direto ou as financiadas por subsídios. Essas últimas têm tido papel relevante nas análises conduzidas nos últimos anos. As avaliações oferecem diagnósticos que são usados pelo CMAP para subsidiar o processo decisório e oferecer recomendações aprovadas internamente.
Houve avanços recentes na incorporação dos resultados das avaliações no processo de redesenho da política. Até o início do ano passado, a formulação e a implementação de planos de ação baseados nas recomendações não faziam parte da atribuição do CMAP, ficando inteiramente com os órgãos gestores, os quais muitas vezes encontravam dificuldades com essas tarefas.
Recentemente, o CMAP passou a adotar a prática de elaborar planos de ação em conjunto com os gestores das políticas avaliadas, buscando alinhar compromissos e ações desde o planejamento até a execução, com o objetivo de aumentar a efetividade das recomendações.
Por outro lado, apesar de esforços internos no MPO para promover maior utilização desses resultados no processo orçamentário, ainda não há uma norma que determine o uso obrigatório das avaliações no processo orçamentário. Dessa forma, a ampliação do “enforcement” depende de maior institucionalização, por meio de normas legais ou infralegais, que fortaleçam o papel das avaliações na tomada de decisões orçamentárias.
No evento de lançamento, destacou-se que a falta de uma metodologia unificada e estudos de impacto ex-ante que justifiquem a aprovação de um gasto tributário comprometem a avaliação posterior, bem como seu peso na reavaliação de uma política. Concorda?
De fato, a ausência de uma metodologia unificada e de estudos ex-ante compromete a robustez das avaliações ex-post. Os gastos tributários geralmente têm origem em alterações legislativas no Congresso Nacional, muitas vezes sem definição clara de governança ou responsabilidades no âmbito governamental. Estudos ex-ante são fundamentais para garantir que os benefícios esperados estejam alinhados aos objetivos das políticas e para estabelecer responsabilidades desde sua formulação.
Além disso, muitas dessas políticas tributárias não poderiam sequer ter sido criadas caso houvesse uma análise ex-ante rigorosa. Uma vez implementado, o subsídio tende a se incorporar à dinâmica do setor beneficiado, tornando difícil sua descontinuidade, mesmo diante de avaliações ex-post que demonstrem ineficácia.
O governo tem desenvolvido guias para padronizar avaliações ex-ante e ex-post, promovendo maior rigor técnico nesses processos. Em particular, a SMA está desenvolvendo uma ferramenta de avaliação padronizada que deverá ser utilizada para dar agilidade no processo avaliativo de todas as políticas públicas, inclusive as que envolvem gastos tributários. No entanto, a implementação de avaliações ex-ante específicas para subsídios tributários ainda requer avanços significativos, pois envolve ação coordenada com o Poder Legislativo.
Haveria espaço para o CMAP ampliar sua área de análise, hoje focada em políticas individuais ex-post, visando a recomendações mais estruturais e sistemáticas sobre gastos tributários?
Essa discussão já foi levantada internamente na SMA e entre membros do CMAS (Comitê de Subsídios) e do CMAP, sendo vista como uma evolução natural após o acúmulo de avaliações ex-post. Contudo, permanece em aberto se o CMAP seria o lócus central dessa análise ou se deveria fornecer insumos para outros atores no âmbito governamental.
Como destacado anteriormente, os gastos tributários geralmente decorrem de medidas aprovadas pelo Congresso Nacional. A realização de avaliações ex-ante poderia ser conduzida por comissões temáticas das casas legislativas, envolvendo, potencialmente, a própria SMA e o Ministério da Fazenda em etapas de discussão técnica.
Atualmente, algumas propostas legislativas em tramitação no Congresso Nacional abordam a institucionalização de avaliações ex-ante. Caso sejam aprovadas, espera-se que o processo de formulação dessas políticas seja significativamente aprimorado.
É fundamental institucionalizar o processo de revisão de gastos, incluindo subsídios tributários. Há duas razões para isso. A primeira visa fortalecer o vínculo entre as avaliações realizadas e as escolhas orçamentárias e alocativas. Esse movimento busca consolidar o uso das avaliações como um pilar central na formulação de políticas públicas mais eficientes e responsáveis.
A segunda razão é garantir que o processo de revisão esteja incorporado formalmente ao ciclo orçamentário anual. A despeito de a LC 200 já prever que a LDO contenha um anexo com as medidas de revisão, ainda não está completa, do ponto de vista normativo, a governança das ações que compõem esse anexo.
Adicionalmente, uma das prioridades estratégicas para fortalecer o impacto das avaliações realizadas pelo CMAP é promover análises cada vez mais inclusivas e abrangentes. Nesse contexto, o CMAP está ampliando sua abordagem para incorporar a avaliação sensível a raça e gênero como elemento essencial de suas análises, inclusive no que se refere aos subsídios tributários.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.