Confiança empresarial: “Não podemos falar de uma virada de chave completa, mas acho que não haverá um retorno aos níveis do final de 2024”, diz Aloisio Campelo

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A confiança empresarial no Brasil caiu 1,8 ponto em janeiro comparado a dezembro, para 94,8 pontos – pior queda desde abril de 2022, e a terceira consecutiva. Foi um movimento disseminado entre os setores analisados – indústria, serviços, comércio e construção –, e atingiu tanto as expectativas quanto a percepção atual, que se mantinha resiliente no terreno positivo. Nesta conversa para o Blog, Aloisio Campelo, superintendente de estatísticas Públicas do FGV IBRE, comenta esse resultado e a Síntese das Sondagens de janeiro: 

O Índice de Confiança Empresarial (ICE) acompanhou o movimento da confiança do consumidor (ICC) registrando queda em janeiro, ainda que menor (o ICC caiu 5,1 na mesma comparação). Como interpretar esse resultado?

O ponto que surpreendeu foi a intensidade de algumas quedas. Chama a atenção a piora mais expressiva do Índice de Situação Atual (ISA). Dada a resiliência que esta vinha mostrando até o final de 2024, a queda de 2,4 pontos do ISA foi relativamente grande, além de relativamente espalhada, considerando os 49 segmentos analisados na somatória dos setores.

Veja, uma parte do crescimento do segundo semestre de 2024, principalmente no terceiro trimestre, foi carregamento estatístico, já parecia estar esboçando uma desaceleração, mas a percepção das empresas ainda era de aceleração no último semestre do ano. De fato, os setores cíclicos – que são esses que monitoramos – estavam indo bem. Não dá para dizer que em janeiro tivemos uma virada totalmente de chave, mas especialmente em comércio e serviços, vemos que há sinais de desaceleração. A indústria ainda registrou uma leve alta do ISA, de 0,1 ponto, mas serviços e comércio, que registraram altas em novembro e dezembro, vieram com forte queda em janeiro, respectivamente, de 2,6 e 5,2 pontos.

No campo das expectativas, já havia uma tendência de queda, natural para os setores cíclicos, de prever uma desaceleração associada ao componente de incerteza, que coloca em dúvida decisões de investimento. O Índice de Expectativas (IE), já mostra um pouco do efeito da alta de juros, um pouco do efeito do susto do câmbio, e incertezas com a política do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Com isso, as expectativas dos empresários, no agregado dos setores, registraram o terceiro mês de queda.

No caso da Indústria, apenas o segmento de bens de consumo não-duráveis registrou variação positiva da confiança. Como foi a evolução dentro do setor de serviços?

Vale lembrar que nossa análise na margem (quando se compara com o mês imediatamente anterior) corrige as influências de cada ciclo – por exemplo, uma maior demanda de serviços de turismo no início do ano, com férias escolares. Mesmo assim, a confiança no segmento de serviços prestados às famílias se mantém em alta. Já informação e comunicação, serviços profissionais (aqueles prestados a empresas) e serviços de transporte registraram quedas importantes. A queda do Índice de Situação Atual de informação e comunicação foi de 8,4, e do Índice de Confiança, 0,7 ponto. No caso de serviços profissionais, as quedas foram de, respectivamente, de 2,8 e 4,3 pontos. Já no segmento de Transportes a confiança sobre a situação atual caiu 1,1 ponto, e na confiança (agregando situação atual e expectativas), a queda foi de 2,7 pontos. É um resultado que chama a atenção, posto que o setor de transportes tende a ser afetado positivamente por boas safras agrícolas, como a que se espera para este ano.

Como esses resultados “conversam” com a queda da confiança do consumidor?

Quanto ao desempenho do Índice de Confiança do Consumidor (ICC) (leia mais aqui), em especial a avaliação da situação atual, uma característica importante de se destacar é que a análise da percepção atual dos empresários costuma ser mais aderente ao momento, apontar a tendência do nível de atividade do mês. No caso dos consumidores, há fatores que às vezes vão além do nível da atividade – como a influência de notícias sobre o câmbio, os juros, incertezas que chegam pelo noticiário –que precisam de mais tempo para serem confirmados. Há outros elementos que ainda precisam ser filtrados, e que também podem influenciar. Por exemplo, a percepção de endividamento, e o efeito das bets (apostas esportivas online) – tanto sua influência psicológica quanto de percepção de que é preciso frear o consumo para compensar o gasto em apostas.

Apesar dessa maior complexidade, já observamos um componente de cautela do consumidor, que deve levar a uma propensão de menor consumo em relação à sua renda. Uma queda de 5 pontos é de certa forma disruptiva do ponto de vista de nossos indicadores. Veja, no campo das expectativas, passou-se de uma situação de otimismo em novembro (101,9 pontos) para outra que já podemos definir como pessimismo (91,6 pontos).

Confiança
Diferença em pontos em relação a janeiro de 2024
(sem ajuste sazonal)

 

Diferença em pontos em relação ao mês anterior
(dezembro de 2024) 


Fonte: FGV IBRE.

Levando em conta possíveis acomodações de eventos que no último mês ampliaram a incerteza – como a posse de Trump nos EUA –, já é possível confirmar um panorama de desaceleração com os resultados de janeiro?

Uma desaceleração nestes primeiros meses do ano tende a ser atenuada pelo desempenho do setor agropecuário, movimentando a economia.  Mas é bom observar os próximos dois meses, até pela evolução das notícias domésticas no campo fiscal. Muita gente hoje compara a situação atual com 2013/14, quando a desaceleração da economia culminou em recessão. Naquele momento, a confiança empresarial também foi razoavelmente bem até o final de 2013, mesmo com os investimentos apontando queda, porque ainda havia medias como desoneração da folha de salário, a expectativa quanto à Copa do Mundo no Brasil, enfim, idiossincrasias de cada período. Mas quando a confiança começou a cair, foi sistematicamente num contínuo, até chegarmos à recessão de 2014. Hoje, entretanto, o que percebemos até aqui é, apesar de se tratar de uma queda forte da confiança, parece algo natural das expectativas relacionadas a ciclos.

No caso do monitoramento de expectativa de contratação, por exemplo, que está relacionado com o mercado de trabalho em geral, e ainda mais fortemente com o emprego formal, observamos uma queda na margem na indústria, comércio e construção, mas ainda em nível muito favorável. Em resumo, ainda não se trata de um sinal tão ruim. Ainda se trata de um quadro favorável de confiança empresarial, com um quadro de mercado de trabalho aquecido. Entretanto, particularmente, não acho que haverá um retorno aos níveis de confiança do final do ano passado.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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