“Viramos zumbis empresariais”

Paulo Solmucci, presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel)

Por Solange Monteiro, do Rio de janeiro

Como a piora da pandemia e o aumento das medidas de isolamento têm impactado o setor de bares e restaurantes?

Hoje em dia viramos zumbis empresariais, pois ninguém tem dinheiro para nada. Pesquisa que realizamos no início de abril aponta que 91% dos empresários do setor tiveram dificuldades para pagar o salário de seus funcionários integralmente, ou seja, não conseguiram pagar. Mais de 75% têm outros tipos de dívida, como aluguel, impostos, IPTU, fornecedores. É um estado grave de insolvência. Só com muita ajuda, e parte dela a fundo perdido, para conseguirmos manter as portas abertas.

Essa pesquisa da Abrasel aponta que 73% dos empresários tiveram que demitir funcionários no primeiro trimestre. Caso o programa de manutenção de emprego e renda (BEm), que terminou em dezembro, tivesse sido prorrogado, esse percentual poderia ter sido menor?

É uma situação difícil para os donos de bares e restaurantes, pois aqueles que já tinham aderido ao BEm precisaram fazer cortes entre os funcionários que não tiveram redução ou suspensão de jornada (o BEm previa, como contrapartida, a manutenção no emprego pelo mesmo período de duração da redução/suspensão de contrato, sob pena de pagamento de todo o valor subsidiado).

Precisamos acelerar a volta do programa. Esta tarde (13/4) estaremos com o presidente da República para tratar desse tema, a convite do senador Jorginho de Mello (PL-SC). Quando estivemos com o presidente e o ministro Paulo Guedes em 27 de janeiro, saímos com a promessa pública de que em 15 dias a volta do BEm estaria equacionada. Achávamos que era viável, pois a primeira edição ficou pronta em período semelhante, e naquele momento ainda foi preciso conceber o modelo. Agora era mais fácil. Mas já temos 80 dias sem essa medida, o agravamento da pandemia, e a piora da situação das empresas do setor. É algo que poderia ter sido evitado, mas infelizmente faltou senso de urgência ao ministro Guedes.

O projeto do ministro agora é viabilizar o BEm por meio de crédito extraordinário a ser aprovado via PEC. Considera que isso poderá atrasar mais a ajuda?

Essa proposta é totalmente desconectada da vida real. Veja, em março já tínhamos 71% das empresas com problema de pagamento de pessoal. Agora, como disse, são 91%. Como esperar uma PEC? Se era para reeditar o BEm via PEC, por que então não se incluiu os R$ 10 bilhões para o programa na emenda que liberou R$ 44 bi para a nova rodada de auxílio emergencial? Vamos agora começar a discutir uma PEC, enquanto um setor que trabalha de portas abertas para a rua e está dilacerado?

Quando falou à Conjuntura Econômica para a matéria de capa de fevereiro, sobre o impacto da pandemia no setor de serviços, o senhor defendia três medidas de apoio ao setor, referentes ao Simples, ao Pronampe e ao BEm. O agravamento da situação mudou essa agenda?

Não, até porque nada dessa agenda foi entregue. O adiamento do pagamento do Simples por três meses (com posterior quitação em parcelas de julho a dezembro) não faz diferença para um empresário que há um ano não está conseguindo pagar seus impostos. Pesquisa que fizemos em janeiro apontou que 66% do setor, ou seja, duas em cada três empresas, registrava atraso no recolhimento do Simples. O que precisamos é negociar o parcelamento da totalidade do atraso para os próximos cinco, seis anos. Três meses de adiamento, neste caso, não fará diferença. Insisto, é preciso que as pessoas entendam a real gravidade da situação.

E quanto ao Pronampe? A estimativa de uma nova rodada de até R$ 7 bilhões em empréstimos, como se estima que será a proposta da PEC, é suficiente?

Veja, primeiro temos a questão da prorrogação do início do pagamento dos empréstimos já contraídos. Pedimos por seis meses, vieram três, e a liberação pela Caixa só saiu mesmo esta semana.

No caso dos recursos novos, é um montante pequeno, mas ajudará se for direcionado aos setores que realmente estão precisando. No ano passado, isso não necessariamente aconteceu.

Mas, além do volume de recursos, será preciso olhar para o problema da negativação. Na atual conjuntura de pandemia, quase não há empresário sem algum tipo de restrição. A grande maioria está lidando com protestos, falta de pagamento de impostos, e a banco. Por isso, uma das questões que hoje buscamos resolver é a da CND (certidão negativa de débitos). Se for para dar empréstimo só para quem tiver ficha cadastral sem nenhuma restrição, será para inglês ver.

Veja, até janeiro, o setor não tinha problemas adicionais aos relacionados à pandemia. De lá para cá, entramos numa inadimplência enorme, e isso significa o pior dos mundos. Se dever para banco é ruim, não pagar funcionário é a coisa pior que existe. Primeiro, porque tem o lado emocional da relação, importante em empresas pequenas onde o convívio é direto. Segundo, porque se esgarça uma relação que é fundamental, de confiança entre as partes. Então, chegamos numa situação de completo desalento. É preciso resgatar o senso de urgência.

 


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