Pressão inflacionária no curto prazo não compromete perspectivas positivas para ciclo da construção

Por Solange Monteiro, do Rio de Jnaeiro

Tal como em outros segmentos da indústria que foram impactados pela disparada do preço de matérias-primas, especialmente aquelas cujos preços são cotados em dólar, a retomada da construção civil tem sido desafiada pela pressão inflacionária. Entre os materiais usados na construção civil que fazem parte do Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), a alta em 12 meses chega a 42%, diz André Braz, coordenador do Índice de Preços as Consumidor do FGV IBRE. Já a divulgação do Índice de Custo da Construção Civil (INCC-M) de junho, esta semana, apontou aumento de 16,88% no acumulado em 12 meses. Mesmo assim, a confiança dos empresários, que desde o início do ano vinha decrescendo nas sondagens, confirmou em junho a reação verificada a partir do mês anterior, tanto sobre a percepção da situação atual quanto sobre as expectativas quanto ao futuro. A que se deve essa resposta? “Nossa avaliação é de que os empresários perceberam que a demanda continua reagindo favoravelmente, colaborando para esse resultado”, diz Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos de Construção do FGV IBRE. A perspectiva de que o ciclo de alta da Selic ainda levará algum tempo para impactar o financiamento imobiliário – cuja oferta a taxas baixas tem sido um grande impulsionador de vendas –, diz Ana, colabora para a retomada desse segmento, que vinha se desenhando desde 2019.

Empresários recuperam confiança
(índices em pontos, dessazonalizados - padronizados)


Fonte: FGV IBRE.

Outro referencial mencionado por Ana da resistência desse movimento é a geração de empregos no setor. “Depois de sofrer forte impacto no momento mais crítico do isolamento em 2020, o setor conseguiu retomar as atividades depois ter sido classificado como atividade essencial em maio, e se tornou destaque na geração de empregos”, afirma Ana, lembrando ainda que o ciclo eleitoral, com eleições municipais, também colaborou para um maior dinamismo em obras. “Mesmo que em 2021 a construção tenha perdido o protagonismo como empregadora para outras atividades, ainda se mantém como gerador líquido de empregos, puxado principalmente pela área de edificações. ”

Evolução saldo vagas formais na construção civil


Fonte: Novo Caged.

Esses sinais positivos não significam, entretanto, que a preocupação com custos tenha saído do radar. Em webinar realizado nesta terça-feira (29/6) pelo FGV IBRE, Ana ressaltou que a trajetória dos preços é especialmente importante ao se estimar a consistência da retomada do setor que, ao trabalhar com ciclos longos, é impactado pela inflação em várias frentes. “Não à toa os custos ganharam uma dimensão inusitada em termos de históricos na Sondagem da Construção, iniciada em 2010, pois afetam tanto as famílias que compram material para pequenas obras quanto aquelas que compram imóveis e, até a entrega das chaves, têm suas parcelas afetadas pelo índice setorial. E, no caso das empresas, sofrem a dificuldade de projetar seus próprios orçamentos”, descreve a economista do IBRE. Ela lembra que a reação da confiança dos empresários, que começou a aparecer em junho e em outubro já tinha superado o nível pré-pandemia, voltou a recuar com os sinais de escassez e aumento de preços de insumos desde o final de 2020. “À medida que o aumento do contágio de Covid-19 voltou em 2021, e com ele a mudança de ritmo nas obras, a confiança recuou ainda mais, recuperando-se apenas a partir de abril”, conta.

Índice Nacional de Custo da Construção – M (INCC-M) 
variação %


Fonte: FGV IBRE.

Ana destaca que, diferentemente de maio, a alta do INCC-M em junho foi mais concentrada na mão de obra do que em matérias-primas, reflexo dos acordos coletivos que aconteceram nos primeiros meses do ano, “todos fechados com INPC no nível máximo, contribuindo para o aumento do INCC no mês e em 12 meses”, diz, indicando que daqui para diante a tendência é de estabilização. “No ano passado, o INCC-M fechou em 8,7%, e acho que este ano fechará no mesmo nível registrado para os 12 meses encerrados em junho, de 17%”, afirma. André Braz lembra que a valorização do real observada recentemente colabora para deter a subida de preços de commodities como minério de fero, cobre e alumínio, e o caminho de normalização da política monetária tende a colaborar para esse movimento da moeda. “Por outro lado, outros desafios entram na pauta, com a crise hídrica e seu impacto no preço da energia elétrica”, aponta, destacando que a fabricação de muitos materiais da construção civil é intensiva no uso desse insumo. “Recentemente a Aneel reajustou em 52% a bandeira tarifária. Para as famílias, isso implica uma conta de energia 8% mais cara em junho; para esses setores eletrointensivos, o impacto é ainda maior”, diz.    

Apesar do acionamento das bandeiras tarifárias ser transitório, Braz aponta que parte de seu efeito nas planilhas de custo da construção é permanente. “No momento em que as empresas enfrentam nova pressão na estrutura de custos e decidam por um repasse, mesmo que essa bandeira saia até o final do ano, dificilmente o preço será revisto para baixo”, diz. “E se a reação do setor se confirmar com mais fôlego, o fato de já trabalharem com margens apertadas contribui para que a haja repasses”, completa. Braz considera, entretanto, que nessa queda de braço inflacionária o efeito da melhora do comportamento do preço dos insumos e de alguma valorização do real sejam predominantes, garantindo uma inflação mais comportada no segundo semestre. Para os especialistas do FGV IBRE, este ano o IGP-M – formado pelos índices de preço ao produtor amplo (IPA), ao consumidor (IPC) e o índice de custos da construção (INCC) – deverá fechar o ano em torno de 18% a 19%, contra uma alta de 23% em 2020.

Arnaldo Brito, coordenador técnico do FGV IBRE, ressaltou no evento online a importância de cada segmento da construção entender a realidade de seu negócio dentro desse panorama de custos ainda turvo, indicando a possibilidade de se desenvolver, a partir da ampla gama de dados com os quais o FGV IBRE desenvolve seus índices gerais e públicos, soluções personalizadas como composição de custos, projeções e preços de referência. “São ferramentas importantes, seja para apoiar uma relação contratual, seja para fortalecer o conhecimento e a operação de uma empresa”, disse.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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