“As oportunidades para outsiders continuam dadas”

Fernando Limongi, professor da FGV EESP

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A ideia da formação de uma frente multipartidária para concorrer com Bolsonaro em 2022, tão referida até o ano passado, parece ter caído por terra após o posicionamento do DEM nas eleições à presidência da Câmara e do Senado, a disputa interna observada no PSDB, bem como a indicação de Haddad como pré-candidato do PT, feita por Lula. Ainda há chances de se ter uma coalizão coordenada pelo centro?

As brigas no interior do DEM e do PSDB mostraram que não será fácil construir alianças para competir com o presidente em exercício. O quadro político não está mais estruturado como no passado, em que se sabia que PT e PSDB teriam candidaturas fortes, e a questão era saber a identidade e força da terceira via. De qualquer forma, daí a ter como certo que uma aliança antiBolsonaro não se formará vai uma grande distância. O presidente, não é demais lembrar, sequer tem partido no momento, e não se pode garantir que o Centrão vá com ele para a eleição de 2022, unido ou parcialmente.

Tampouco se deve descartar que o presidente Bolsonaro chegue a 2022 tão fraco quanto José Sarney (1985-1990) e Michel Temer (2016-2018). Especialmente depois da intervenção na Petrobras e suas consequências, essa é uma possibilidade cada vez maior. Quando se trata de seus opositores, entretanto, há um aspecto que os analistas têm desconsiderado até aqui que é o regional. Para se viabilizar eleitoralmente, um candidato precisa de bases de apoio tanto no Sudeste quando no Nordeste. João Doria, por exemplo, não tem penetração no Nordeste, enquanto o PT se tornou um partido nordestino.

Como ficam os outsiders que poderiam se acomodar nesse arranjo de centro, como Luciano Huck e Sergio Moro?

Dado o terremoto que destruiu a política partidária brasileira entre 2015 e 2018, e a incapacidade de Bolsonaro para dar nova estrutura ao sistema, as oportunidades para outsiders continuam dadas. Mas eles têm suas próprias dificuldades. No caso de Huck e Moro, diria que, se querem ser candidatos, ambos têm muito chão para correr. E a hora de mostrar que são do ramo e são capazes está passando. Moro perdeu muito do seu apelo. Gastou seu capital e, no ritmo em que a coisa está indo, corre o risco de vê-lo rapidamente dilapidado. Huck é, por enquanto – e sabe-se lá por quê –, o queridinho dos que acreditam em boas intenções. Mas política é uma profissão que, como todas as demais, pede experiência e treino. E de boas intenções o inferno está cheio. 

O que espera da relação Bolsonaro-Centrão, depois dos acordos para a eleição das lideranças da Câmara e do Senado?  

Bolsonaro ainda tem que dizer ao Centrão por que precisa de seus votos. Qual a agenda que ele tem para aprovar? Pelo que se depreende, tudo quanto interessa a Bolsonaro é evitar um processo de impeachment, e para isso ele não precisava do Centrão. E nada é de graça. Sua base, o Bolsonarismo raiz, não gostou da traição. Por que o deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) resolveu provocar o Supremo justo depois da eleição de Arthur Lira (PP-AL)? Como dizem os economistas, não há lanche grátis. Bolsonaro e seu grupo não sabem o básico da política, que para dar dois passos adiante é preciso retroceder um, que ganhos de longo prazo são trocados por perdas no curto. Isto é o que define uma estratégia política. Bolsonaro só quer chegar a 2022 e destruir políticas construídas desde a redemocratização. Quer armar a população – o que não é pouco, muito menos sem consequências. O mundo dele é o das conspirações, dos inimigos que precisam ser destruídos. A investida na Petrobras e as demais ameaças que fez mostram que o presidente sentiu o golpe de Silveira, sentiu não poder defendê-lo, ter que se calar. E temeu perder seus aliados entre os caminhoneiros. Se eles se voltassem contra Bolsonaro agora, estaria frito.

Considera que um avanço da vacinação e o controle da pandemia até o final deste ano poderá levar a opinião pública a relegar as falhas do governo nesse tema a um segundo plano em 2022?  

Pesquisas dizem que eleitores têm memória curta, que o que importa é o desempenho da economia no último ano. Mas isto controlando para tudo o mais, incluindo a identificação partidária. Bolsonaro tem um apoio consistente entre os seus seguidores e, até o momento, este grupo tem se mostrado fiel ao presidente mesmo com todas as bobagens que vem fazendo. A pandemia ainda vai cobrar um preço alto de Bolsonaro. Está bem claro que seu governo agiu de forma irresponsável, e que esta irresponsabilidade foi além do discurso. O que ocorreu em Manaus foi resultado de uma série de decisões do Ministério da Saúde. Insistir no tratamento precoce deu no que deu. A conta vai chegar. Como chegou em razão da intervenção na Petrobras. O mercado reagiu. O presidente mostrou sua verdadeira face. É com isto que temos convivido e vamos conviver por mais dois anos no mínimo. O cenário é desalentador, para não dizer desesperador. Só não vê quem quer acreditar em mitos.

 

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