“O teto de gastos precisará mudar em 2023, mas não para ser abandonado”

Fabio Giambiagi, pesquisador associado do FGV IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Amanhã, 28/9, às 10h, o ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung, o pesquisador associado do FGV IBRE Fabio Giambiagi e o pesquisador do Insper Marcos Mendes debaterão em webinar sobre artigo de sua autoria, publicado na Conjuntura Econômica de setembro, que tem gerado ampla repercussão: As Emendas Parlamentares e a Captura do Orçamento. Para esquentar os motores para o evento, promovido pelo FGV IBRE em parceria com a Folha de S. Paulo, Giambiagi conversou com o Blog sobre alguns tópicos relacionados à questão orçamentária:

Analistas apontam de que a diretriz orçamentária de 2022 será fundamental não somente para ancorar o fiscal como para ajudar o BC a combater a inflação e não comprometer o crescimento. Nesse sentido, o que um arranjo dependente de acordos envolvendo a reforma do IR (conforme o texto atual) e PEC dos precatórios (para abrir espaço ao Auxílio Brasil) sinalizaria?

Acho que o crescimento do ano que vem dependerá mais da percepção sobre a forma como o país chegará às eleições. Se isso ocorrer dentro de um marco de certa normalidade, podemos estar numa faixa de crescimento entre 1,5 % e 2%. Se, por outro lado, continuarmos a viver em estado de permanente convulsão como nos últimos meses, e/ou se tivermos sérios problemas de abastecimento energético, será de 1,5 % para baixo.

A tensão sobre as contas públicas e a importância do teto de gastos como disciplinador destas deve ampliar os holofotes sobre os planos dos candidatos à presidência para essa regra fiscal. Nesse sentido, pelo que vemos hoje entre os dois candidatos com maior índice de intenção de voto – Lula e Jair Bolsonaro –, tal debate poderá sinalizar expectativas negativas para 2023 em diante?

Sem dúvida. Há uma completa incompreensão por parte das principais forças políticas do país acerca da natureza da questão. Temos de um lado a equipe econômica fazendo juras de amor cegas ao teto de gastos, sem reconhecer que ele não sobreviverá incólume ao próximo governo. No outro extremo, o PT sinalizando claramente que abandonará essa regra se vencer, mas sinalizando também que não tem a menor ideia do que colocar no lugar. E no meio temos os setores ligados à área política do governo, que começam a flertar com a perspectiva de um abandono do teto visando a ter mais recursos para gastar na eleição. O que não se percebe é o essencial, que são dois pontos: 1. O teto precisa ser mantido, porque muda-lo em ano eleitoral é certeza de aprovação de um arranjo entre o ruim e o desastroso; 2. O teto precisará mudar em 2023, mas não para ser abandonado, e sim para ser substituído por outro teto, definido por um governo politicamente forte e com uma regra de crescimento tênue do mesmo.

Recente artigo publicado na Conjuntura Econômica, do qual é coautor, aponta a crescente captura do Orçamento através de emendas parlamentares – que já representam 15% de toda despesa de livre alocação. Uma das características apontadas para justificar a crescente autorização legislativa para esse uso são problemas do Executivo em operar o presidencialismo de coalizão, fazendo com que os partidos busquem outros meios de exercer sua influência política. Podemos imaginar, então, que o aperfeiçoamento do arcabouço de regras fiscais não garantirá um processo orçamentário virtuoso sem um presidente apto a lidar com essa costura?

O que estamos vendo é um somatório de anomalias. A primeira anomalia é quantitativa: todo governo democrático tem uma certa cota do que nos EUA se chama de pork barrel, ou seja, de recursos para pequenos agrados às bases eleitorais, mas a proporção que isso assumiu no Brasil é uma aberração. A segunda anomalia é política: hoje quem comanda o processo decisório do que o Congresso fará ou deixará de fazer é a cúpula parlamentar, representativa do chamado "baixo clero". Ocorre que este conjunto de forças políticas é peça essencial de qualquer arranjo de governabilidade do país, com qualquer presidente, mas não pode dar as diretrizes, porque simplesmente não tem projeto algum para o país. Acreditar que o baixo clero sabe para onde levar o país é a mesma coisa que supor que o time do Madureira saberia o que fazer se um dia acordasse no Santiago Bernabéu vestindo a camisa do Real Madri. Quem tinha projeto era o PSDB, depois o PT, talvez agora a Terceira Via. Já o baixo clero não tem nada a propor. Pergunte a um membro da cúpula dessa "sopa de letras" de nossos partidos aglutinados no chamado "Centrão" o que ele propõe sobre abertura comercial, privatização da Petrobras, legislação trabalhista, políticas de desenvolvimento, etc. e ouvirá apenas um silêncio ensurdecedor como resposta. O resultado disso é um país sem rumo.

 

Webinar | As emendas parlamentares e a captura do orçamento
Increva-se

 


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