“Indicadores econômicos do Brasil deverão acompanhar o choque de realidade observado nos Barômetros Globais”

Paulo Picchetti, pesquisador do FGV IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

Os Barômetros Globais da Economia – sistema de indicadores produzido em colaboração entre o Instituto Econômico Suíço KOF, da ETH Zurique, e a Fundação Getulio Vargas (FGV) –, divulgados pelo FGV IBRE esta semana, sinalizaram que a preocupação com o recrudescimento da pandemia e o ritmo de vacinação mais lento que o esperado tem reacendido dúvidas quanto à velocidade de recuperação da economia mundial. Os resultados divulgados em fevereiro apontam um crescimento menos intenso do Barômetro Coincidente – que mede a situação atual – e um recuo do Barômetro Antecedente –  que sinaliza a expectativa sobre a atividade nos seis meses à frente.

“Em janeiro, tínhamos visto uma subida robusta do Barômetro Antecedente (de 6,5 pontos), refletindo o momento em que a vacina chega. Mas fevereiro já capta dois elementos que fazem com que esse otimismo seja ponderado (registrando queda de 6,9 pontos em relação a janeiro). O primeiro é a logística, pois esse processo mostrou que a dificuldade não se encontra somente na fabricação dos imunizantes, mas em sua distribuição e aplicação. E a segunda dimensão foi a novidade das mutações”, diz Paulo Picchetti, pesquisador do FGV IBRE.  Em termos regionais, a maior retração, de 10,3 pontos em relação a janeiro, foi observada exatamente na Europa, “onde essa realidade ficou clara de forma mais rápida, e mais fortemente, as medidas de isolamento estão sendo tomadas de forma mais assertiva nessa segunda onda, diferentemente de Estados Unidos e mesmo do Brasil, onde não estão encontrando tanto espaço”, ressalta Picchetti. Já no recorte setorial, serviços registrou um recuo significativo, de 8,4 pontos, e continua acumulando a maior perda em relação a março de 2020. Mas, desta vez, foi a indústria quem sofreu maior retração em comparação ao mês anterior, de 10,1 pontos. “Esse setor, que liderou a retomada desde a metade do ano passado, mostra que já não tem o mesmo vigor de antes. Para isso pesam as novas medidas de distanciamento e o efeito cumulativo da disrupção da cadeia toda de bens intermediários, pois há vários setores aqui e lá fora se ressentindo de problemas de entrega de matérias-primas”, diz.

Picchetti afirma que a próxima divulgação do Indicador Coincidente Composto da Economia Brasileira (ICCE) e do Indicador Antecedente Composto da Economia Brasileira (IACE), que acontece na semana que vem, no dia 18, deverá refletir esse mesmo choque de realidade observado nos Barômetros Globais. “No nosso caso, a esses problemas todos se somam a questão do fim dos estímulos e a falta de liberdade de política econômica para se continuar com esses estímulos”, afirma. Ainda que Executivo e Legislativo discutam uma nova rodada de auxílio emergencial, o pesquisador do IBRE ressalta que hoje há consciência dos limites para se avançar em medidas fiscais sem deteriorar as expectativas em relação à trajetória da dívida pública. “Do lado da política fiscal, qualquer estímulo que se pense em repetir, seja de transferência direta como o auxílio, sejam subsídios como postergar impostos, tem custo altíssimo, porque no ano passado elevamos a dívida pública em um patamar que já coloca sua sustentabilidade em questão.”

No campo monetário, Picchetti afirma que tampouco há perspectivas auspiciosas. “As mensagens que o Banco Central enviou nas últimas comunicações foram justamente no sentido de que não há mais muito espaço para se manter a taxa de juros baixa do jeito que está”, diz. Ele ressalta que a desaceleração do IPCA em janeiro não significou um sinal de alívio, devido ao alto peso do preço da energia elétrica nesse resultado, indicando que não se trata de uma tendência disseminada, e pela manutenção das pressões de preços no atacado. “No setor de alimentos os preços também continuam em alta, apesar de menos acentuada que em dezembro, e esse grupo de fatores contamina de forma negativa as perspectivas para o ano”, diz, ressaltando, entretanto, que o país registra um nível de inflação relativamente confortável, que ainda permite acomodar choques de oferta futuros. “De qualquer forma, não sobrou nada em termos de política econômica convencional para se imaginar algum estimulo para fazer a gente crescer mais rápido neste ano”, afirma. Picchetti também lembra que essa piora da economia no início do ano já estava em grande medida precificada, com parte dos analistas prevendo PIB negativo no primeiro trimestre. No FGV IBRE, a estimativa registrada no Boletim Macro de janeiro é de retração no primeiro semestre, com a retomada da economia acontecendo a partir da segunda metade do ano. “Talvez agora tenha aumentado a convicção e o número de pessoas que acreditam nessa hipótese realista”, afirma o pesquisador.

 


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