Em Foco

Domando a pandemia

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

Pouco mais de 46% da população mundial recebeu pelo menos uma dose da vacina contra a Covid-19, o que representa 6,41 bilhões de doses aplicadas. Pelos dados do Our World In Data, 22,78 milhões de vacinas estão sendo aplicadas diariamente no planeta, com uma maciça concentração nos países de renda alta e média-alta que respondem por mais de 70% de todas as vacinas aplicadas no planeta. Menos de 2,5% dos habitantes de países de baixa renda receberam pelo menos uma dose do imunizante. Embora haja vacinas suficientes, com estoques em muitos países ricos, nenhuma política global foi adotada para atender milhões de pessoas que estão sem proteção. Por razões desconhecidas, a pandemia não explodiu nos países africanos, podendo ter levado a um certo acomodamento dos países mais poderosos com relação ao alastramento da pandemia, um risco para o mundo, além, é claro, de questões geopolíticas. O que aumentará ainda mais a desigualdade entre ricos e pobres.

Mesmo com o surgimento de variantes, como a Delta, o vírus não se propagou, pelo menos até agora, pela região africana da forma que se esperava, inicialmente. Com uma estrutura médica precária – há países onde não há respiradores ou a quantidade é ínfima –, pobreza, questões sanitárias graves, a ameaça de uma contaminação em massa era latente.  Até na Índia, onde a variante surgiu depois de uma explosão de casos e mortes com seu ápice em maio último, é como se o vírus perdesse força, mesmo com a vacinação ainda lenta por lá, onde apenas 18,27% da população estava totalmente imunizada até o último dia 6 deste mês.

Mas, se por um lado, boa parcela das regiões mais pobres está sendo poupada de violentas ondas de contaminação e mortes, por outro, nos Estados Unidos, maior potência do planeta, os números começaram a engatar, de novo, uma alta: a média móvel de novos casos, que havia desabado em junho, continua superior a 100 mil por dia, enquanto as mortes oscilam acima da casa de mil por dia.

O novo surto, ainda que em menor voracidade que os anteriores, deve-se a uma ferrenha disposição de parcela considerável dos norte-americanos em não se vacinar. Embora o país tenha em mãos as vacinas mais eficazes – Pfizer, Moderna e Johnson –, e em quantidades suficientes para imunizar todo o país e ainda exportar ou doar a países mais pobres, pouco mais de 55% da população foi totalmente imunizada.

Em regiões dominadas pelos republicados, a rejeição à vacina é maior. O próprio ex-presidente Donald Trump, que mantinha um discurso antivacina enquanto financiava o desenvolvimento do imunizante, foi vaiado recentemente ao defender a vacinação. A administração Biden está fazendo das tripas coração para que as pessoas se vacinem, mas os números continuam meio estagnados. Parcela de negros, latino-americanos e moradores de regiões rurais são os mais reticentes com a imunização.

Na Rússia, quinto país mais atingido pela pandemia, desde setembro as curvas começaram a embicar para cima. A média móvel dos últimos 7 dias de novos casos até o último dia 6 estava acima de 25 mil, a mais alta desde dezembro de 2020. E as mortes disparam, com a média móvel mais alta desde que a pandemia começou. É bom lembrar que os números russos devem ser olhados com cautela, pois podem ser bem superiores aos relatados. Por lá, há poucas medidas de combate ao vírus. Só no ano passado foi decretado um lockdown de seis semanas. A variante Delta está sendo apontada como a responsável pela disseminação rápida do vírus.

Se temos casos, por enquanto, pontuais de aumentos de contágios e mortes em alguns países, o Brasil, depois de muita confusão, parece ter entrado nos trilhos da vacinação. Já imunizamos mais que os Estados Unidos e a Alemanha, caminhando para ter toda a população totalmente vacinada até meados de novembro, provavelmente. E já estamos aplicando a dose de reforço na população mais idosa, em profissionais de saúde e pessoas com comorbidade, além dos adolescentes, depois de outra confusão gerada pelo Ministério da Saúde que recomendou não vacinar adolescentes. Recomendação que, felizmente, foi suspensa.

Vacinação no mundo
(em porcentagem da população)


Fonte: Our World In Data. Dados até 6/10, salvo quando indicado.

Com a capacidade do Sistema Único de Saúde (SUS) em vacinar em larga escala, e com a chegada de imunizantes, a angústia por que passamos durante meses começa a arrefecer. Estamos vendo uma contínua queda de novos contágios e mortes, com forte redução na ocupação de leitos e Unidades de Terapia Intensiva para tratamento da Covid-19. O que alivia o sistema de saúde, possibilitando o tratamento de outras doenças que foram relegadas a segundo plano, devido à pandemia.

Além da vacina, um feito extraordinário da ciência no desenvolvimento de imunizantes em tão curto espaço de tempo, já se testa medicamentos que podem reduzir os efeitos da Covid-19, agindo como um bloqueador para sua propagação.

Nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), órgão que aprova o uso de medicamentos, aprovou o uso do bamlanivimab, produzido pela farmacêutica Eli Lilly, como tratamento experimental em pacientes com sintomas leves ou moderados da doença, evitando, dessa forma, internação em pessoas que apresentem alto risco de evolução do coronavírus.

Mas se estamos um pouco mais seguros, é bom lembrar que a pandemia não terminou. E os Estados Unidos e a Rússia, mencionados acima, são exemplos disso.

Mas, sem dúvida, são novos dias. Com esperança.  

Covid-19
Novos casos Brasil


Fonte: Consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de saúde.

 

Mortes Brasil


Fonte: Consórcio de veículos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de saúde.

 

Novos casos Estados Unidos


Fonte: The New York Times e Worldometer.

 

Mortes Estados Unidos


Fonte: The New York Times e Worldometer.

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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