Carta do IBRE – Há risco inflacionário no pacote de Biden?

Por Claudio Conceição, do Rio de Janeiro

O aquecimento da economia americana este ano, com o pacote de estímulos fiscais e monetários do governo Joe Biden, que pode chegar a US$ 1,9 trilhão, aliado a um processo acelerado de vacinação da população, com cerca de 1,5 milhão de pessoas por dia, o que tem levado a média móvel de infectados iniciar uma trajetória descendente – está por volta de 64 mil novos casos, ante os 120 mil de um mês atrás, segundo dados do Worldometers –, tende a alavancar a atividade econômica, podendo gerar pressões inflacionárias nos Estados Unidos e, com isso, iniciar um processo de alta nas taxas de juros, o que poderia ter reflexos em economias mais fragilizadas, como a brasileira.

Essa questão tem levado a um intenso debate entre os economistas da Economia Aplicada do FGV IBRE, já que é certo, desde que nenhum imprevisto ocorra, que a economia dos Estados Unidos deve ter uma robusta recuperação este ano, depois da queda de 3,5% no ano passado. A média das estimativas de crescimento é de uma expansão de 4,5%, segundo a revisão recente do Survey of Professional Forecasters, uma espécie de Focus dos EUA, embora existam projeções mais otimistas, como da Goldman Sachs que prevê uma expansão de 6,8% em 2021 (ver gráfico).

PIB dos EUA

Fonte: U.S. Bureau of Economics Analysis (BEA)

Mas de qualquer forma, será uma recuperação vigorosa com reflexos mundo afora.

Na Carta do IBRE deste mês, que pode ser lida na íntegra na edição da Conjuntura Econômica – nesse texto foi acrescentado um gráfico e elaborado um resumo sintético –, os pesquisadores do FGV IBRE, Samuel Pessoa e José Júlio Senna, têm visões distintas sobre o tema. Embora não prevejam inflação iminente nos Estados Unidos, Pessoa enxerga no pacote de Biden um risco inflacionário maior do que Senna.

Para Pessoa, como observa na Carta do IBRE, após fazer uma profunda análise da economia norte-americana, o potencial inflacionário dos muitos estímulos que se acumulam na economia norte-americana é bastante exequível. “Um pacote fiscal de cerca de 10% do PIB, como o de Biden na mais modesta hipótese, mesmo se considerando multiplicadores pequenos, representa, na visão do pesquisador, um impulso bem maior que a atual ociosidade de fatores nos Estados Unidos. Segundo suas estimativas, o mercado de trabalho no quarto trimestre de 2021 estará um ponto percentual mais apertado do que o vigente no mesmo período de 2019. Como o economista escreveu em recente coluna da Folha de São Paulo, “o equilíbrio estrutural com carência de demanda agregada e estagnação secular não significa que a economia suporta sem inflação qualquer impulso de demanda. Em 2021 os limites da economia americana serão testados”.

Já para Senna, “a pandemia deve reforçar alguns fatores da estagnação secular, enquanto outros permanecerão inalterados. Em balanço, portanto, as forças desinflacionarias permanecerão, e os efeitos dos pacotes fiscais sobre a demanda e, possivelmente, a inflação serão temporários. Ele prevê continuidade do crescimento modesto e da inflação e dos juros baixos nos países ricos nos próximos anos”.

Após reforçar sua hipótese embasada em uma série de avaliações e reflexões sobre a evolução da economia norte-americana, Senna acredita “que as características da pandemia acentuam forças que já estavam em curso antes do coronavírus nas economias avançadas, e que se traduzem por grande desejo de poupar e pequeno de investir, jogando para baixo crescimento, inflação e juros”. Para ele, pode até haver susto inflacionário, mas que não se perpetuará

Agradeço ao Samuel Pessoa, pesquisador-associado do FGV IBRE, pela valiosa contribuição na elaboração da série histórica do PIB norte-americano. Eventuais erros de compreensão são de inteira responsabilidade do autor.

Ver a integra da Carta do IBRE

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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