“Aprovação do PLP 101 incentiva estados a um ajuste fiscal mais consolidado”

Vilma Pinto – pesquisadora licenciada do FGV IBRE

Por Solange Monteiro, do Rio de Janeiro

A emergência da reestruturação fiscal dos Estados, tema de destaque na cobertura da revista Conjuntura Econômica em 2020, ganhou um aliado com a aprovação, este mês, do Projeto de Lei Complementar 101, que reúne revisões de leis e novos programas visando ao combate do desequilíbrio das contas de entes subnacionais. Entre os principais, o PLP inclui uma harmonização de regras da Lei de Responsabilidade Fiscal visando derrubar inconsistências contábeis que abriram espaço para o endividamento dos estados acima do estabelecido. A principal é o dever, de poderes e órgãos, de incluir benefícios previdenciários nas despesas com pessoal, cuja verificação de cumprimento deve ser feita de acordo a critérios do Conselho de Gestão Fiscal. 

O PLP também cria o Plano de Equilíbrio Fiscal (PEF), originado do Plano Mansueto, em referência ao ex-secretário do Tesouro. O PEF permitirá que 14 estados que hoje têm Capag C (nota de crédito calculada pelo Tesouro) tome novos empréstimos com garantia da União. Para se candidatar aos R$ 6,6 bilhões que o governo federal destinou para essa aplicação, os estados deverão assumir três de uma série de medidas de ajustes propostas no Plano, como privatização de estatais e redução de ao menos 20% dos benefícios fiscais concedidos. Já os estados com alto nível de endividamento se beneficiarão da revisão do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que hoje contempla apenas o Rio de Janeiro, mas ao qual deverão se somar Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Na nova versão, o RRF ampliou o prazo de pagamento da dívida dos estados, prevendo agora nove anos de suspensão regressiva - suspensão integral nos três primeiros anos, com início de pagamento gradual a partir do quarto ano. Outra mudança é a revisão do cumprimento do acordo, que passa de trienal a anual. 

Espaço Fiscal para estados no PEF

Para Vilma Pinto, pesquisadora licenciada do FGV IBRE especialista em contas públicas, a aprovação do PLP é em geral positiva, com potencial de quebrar o círculo vicioso visto nas últimas décadas, de acordos de dívida mal sucedidos, terminando em novas negociações. “Especialmente no caso do PEF, que inclui estados com grau de endividamento médio, há incentivos para um ajuste fiscal mais consolidado. Como a concessão de garantias será dada após o ajuste pedido, a chance de descumprimento de regras se reduz”, afirma. Vilma dá como exemplo uma das contrapartidas indicadas na PEF, de adoção, pelo estado, das regras previdenciárias aplicáveis aos servidores públicos da União. “Na União, quando servidores se aposentam, não incorporam ao salário de aposentadoria as gratificações recebidas por cargos comissionados - mas isso ainda acontece em muitos estados e municípios, e acaba pesando na folha. Mudando essa regra, os estados já conseguirão garantir um alívio de médio e longo prazo em suas contas”, diz. A pesquisadora ressalta que cada ente terá uma demanda diferenciada, mas é otimista com o resultado do programa para aqueles que se comprometerem em realizar ajustes.  

No caso do RRF, Vilma aponta que ainda há dúvidas quanto ao enforcement trazido pelo novo texto, ainda que ressalte a vantagem de os novos candidatos ao programa já terem avançado em algumas medidas de ajuste. “Casos como o do Rio Grande do Sul e de Goiás, é possível observar alguns avanços, ainda que todos tenham que aprovar outras medidas de ajuste fiscal, como as previstas no projeto aprovado”, diz. O problema, para Vilma, é saber como se darão as correções no caso de os estados não conseguirem dar continuidade a seus programas, lembrando o caso do Rio, que agora espera renegociar os termos do acordo, após concluir os três primeiros anos sob o RRF sem cumprir as metas esperadas.

Regime de Recuperação Fiscal
Suspensão de pagamento de dívida (em R$ bilhões)

Total dos 4 estados: R$ 130 bilhões
Obs: cálculo desconsidera a redução de prazos como penalidade pelo descumprimento do teto de gastos, mas incorpora acréscimos de10% aos saldos devedores da 9.496 como penalidade alternativa.

 


Leia mais sobre o ajuste fiscal dos estados:

- Entrevista com o economista Mauro Osório, sobre a situação fiscal do Rio de Janeiro

- Conjuntura Econômica nov/20 (para assinantes), matéria de capa sobre desafios fiscais e de gestão dos estados

- Conjuntura Econômica ago/20, cobertura de webinar com secretários estaduais de Fazenda

- Conjuntura Econômica abr/20, entrevista com o deputado federal Mauro Benevides (PDT-CE), posteriormente relator do PLP 101

- Conjuntura Econômica jan-20, sobre negociações entre estados e União, e entrevista com secretários de Fazenda de RJ, GO e RS

 


As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente a opinião institucional da FGV.

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